Carne de bode e leite de cabra estão cada vez mais chiques

Georgina Maynart
((Foto: Jhoni Pinho / Divulgação Kadosh))
Para acompanhar demanda, produção de caprinos cresce quase 8% na Bahia; conheça os benefícios dos produtos

A etiqueta na embalagem confirma o preço: R$ 180. É quanto custa um quilo do queijo de cabra produzido na Bahia e vendido em uma das mais famosas padarias de Salvador. Mas não é só lá, os caprinos também estão valorizados em muitas lojas de produtos especiais e gourmet. Em alguns boxes da ceasinha do Rio Vermelho eles já ocupam muitos espaços. “A procura aumentou 50% nos últimos dois anos.

O queijo de cabra tem menos lactose que o queijo de vaca, então muita gente compra”, diz Zuita Souza, administradora do Armazém Mandacaru. O box comercializa mais de cinco tipos de queijos de cabra fabricados no município de Castro Alves, no Recôncavo. Do queijo minas frescal ao chèvre, aquele com formato de pequenos rolinhos macios. Os preços variam de R$ 26 a R$ 95.

É incontestável: os caprinos estão cada vez mais fortes, e em expansão. Eles já formam um rebanho de quase 3 milhões de cabeças só na Bahia. Compõem um segmento da pecuária que cresceu 7,9% no último ano, segundo o IBGE. Ao contrário do rebanho bovino, que caiu mais de 3% e do suíno que ficou quase 9% menor. As cabras e bodes subvertem a ordem ao se multiplicar em pleno tempo de seca e de crise econômica. Só em 2017, o estado passou a ter 218 mil caprinos a mais, de várias raças.

O rebanho volumoso reafirma a resistência do animal considerado um dos símbolos do Nordeste. Ele se adapta facilmente ao clima difícil da região e é capaz de sobreviver enfrentando longos períodos com pouca água. Uma das razões para a bemsucedida adaptação é simples e envolve botânica. Das quase 600 espécies vegetais da caatinga, cerca de 70% podem ser usadas na dieta dos ruminantes. Eles comem de tudo: das plantas de porte alto, como a algaroba e o sabiá, até os espinhosos carrapicho e mandacaru.

Queijo feito com leite de cabra tem menos lactose; procura pelo produto tem aumentado (Foto: divulgação)

Bahia

Atualmente existem produtores de derivados de cabra em várias partes da Bahia. A maioria se concentra nas regiões de Juazeiro, Irecê, Valente, e nas áreas ao redor da Região Metropolitana de Salvador. A exemplo da Fazenda Kadosh, em Vila de Abrantes, na zona rural de Camaçari, que sempre foi especializada na criação de coelhinhos e porquinhos da índia e tinha uma criação de caprinos improvisada. Há quatro anos os donos decidiram investir na produção de queijos especiais de cabra. O capril profissional começou com 23 animais e já conta com 100 cabras das raças Saanen e Toggenburg.

“Nós produzimos atualmente mil litros de leite de cabra por mês. Compramos ainda outros mil litros de parceiros da cidade de Várzea Nova. Mas queremos produzir mais 600 litros por dia”, diz a laticinista Kátia Santa Rosa, que administra o negócio junto com os pais.

Este ano, o laticínio conquistou o selo de inspeção estadual e a licença para produzir queijos e iogurtes com leite 100% de cabra. Por mês já são produzidos 150 quilos de queijos boursin, coalho e do reino. E a produção não para de avançar.

“Nós acreditamos muito neste setor. Temos todas as ferramentas para evoluir. O mercado está aberto a novidades. Fornecemos para restaurantes e hotéis, e agora estamos também com serviço de entrega a domicílio”, afirma Kátia Santa Rosa.

O quilo do queijo custa R$ 85 reais. Mas a peça com 290 gramas, sai por R$ 25.

A raça saanen é a preferida dos produtores baianos por causa da produtividade e adaptação ao clima do estado (Foto: Divulgação)

Outros saborres 
Em Palmas de Monte Alto, no Sudoeste da Bahia, é a versão provolone do queijo de cabra que tem feito sucesso. Considerado o rei dos petiscos, o queijo filado e semiduro passou a fazer parte do catálogo de produtos do Laticínio Campanella há apenas 3 anos. A agroindústria já era conhecida no mercado como produtora de derivados de leite de vaca há mais de duas décadas.

“Nós entendemos que o consumo de queijo de cabra tem potencial para crescer. A Bahia compra queijo de Minas e até queijo vindo de Portugal, que chega a ser quatro vezes mais caro. Nós acreditamos neste setor e vamos investir cada vez mais nos caprinos”, diz Santino Campanella, dono do laticínio.

Nas prateleiras, o queijo de cabra importado atinge até R$ 490 o quilo. Já o queijo Made in Bahia, em geral, varia de R$ 42 a R$ 95. O rebanho da Campanella é formado por cabras Saanen, uma raça de origem suíça, considerada altamente produtiva e que permitiu um aumento de 480% na produção nos últimos dois anos.

Em 2016, o plantel Campanella produzia 700 litros de leite por semana. Hoje são 3.360 litros. A tendência é aumentar ainda mais, já que o laticinista vem expandindo o número de animais. “Esta raça se adaptou muito bem a região, que é muito seca, mas propícia para a criação de cabra”, completa Campanella, que recentemente passou a produzir também queijo de cabra boursin – uma pasta cremosa, e a ricota, com baixo teor de gordura.

Conquista do pódio
As cabras e bodes da Bahia, juntos com os carneiros e ovelhas, formam o maior rebanho de caprinos e ovinos do Brasil: nada mais, nada menos que 6 milhões 239 mil 923 animais, aproximadamente 30% do rebanho nacional. Este ano, dados do Censo Agro do IBGE mostraram que a Bahia subiu do segundo para o primeiro lugar no ranking nacional de caprinos. Posição que já ocupava com o rebanho de ovinos.

Não há números exatos sobre o volume total de carne de caprino comercializado na Bahia. O que se sabe é que a quantidade ainda é pequena frente aos outros tipos, porém, dentro da média nacional.

Segundo dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, em média, cada brasileiro consome 400 gramas de carne de cabra por ano. Bem abaixo da carne bovina, cerca de 35 kg, e da carne de frango, que chega a 44 kg por ano. Mas os comerciantes garantem que o consumo vem se elevando. A procura pela carne tem crescido tanto que o município de Remanso, a 720 km de Salvador, passou a contar este ano com um frigorífico especializado na produção de carne de caprinos e ovinos.

“A expectativa é abater 1.200 cabeças por mês. Nós já estamos produzindo mais de 10 cortes deste tipo de carne. Além dos cortes tradicionais, como pernil, costela e o carré francês, um dos mais procurados tem sido o stinco, que é a junção da canela com a cocha”, afirma José Porphirio, diretor do frigorífico Cabrabom. Os cortes estão sendo vendidos por preços que variam de R$ 18 a R$ 55.

“Os moradores desta região comem bode de tudo que é jeito. A caprinocultura é o que move a economia daqui o ano todo. Juntando os municípios, são cerca de cinco mil cabeças de caprinos e ovinos comercializadas por mês,”, diz Adriano Paes Landin, presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Remanso.

Fomento
Uma câmara setorial está sendo montada para estimular a criação de caprinos e a produção de derivados no estado. A Câmara será formada por produtores rurais, técnicos de secretarias estaduais, Sebrae, representantes do Sistema FAEB/SENAR, além de proprietários de laticínios, cooperativas e frigoríficos.

“Esta cadeia produtiva pode se expandir muito mais. Mas ainda é necessário aumentar a reserva alimentar no campo, o melhoramento genético e assistência técnica. Já a indústria precisa melhorar a qualidade e inovar”, diz Maria Laura Freitas Silva, Diretora de Pecuária da Secretaria de Agricultura do Estado. A certificação e as dificuldades de logística que envolve o transporte dos animais até os laticínios, ainda são entraves. Fazer o queijo de cabra ser mais conhecido dos consumidores também é outro desafio.

“Temos que fazer campanhas de marketing, para que os benefícios destes produtos sejam mais conhecidos. Há público para isso. Tem pessoas que não dispensam, por exemplo, um bom iogurte de leite de cabra, ou um queijo condimentado acompanhando por uma taça de vinho”, finaliza Maria Laura. Para vencer as barreiras do consumo, os produtores de Juazeiro, no norte da Bahia, passaram a fabricar queijos finos de alta qualidade. Atualmente saem dos laticínios da região queijos de cabra maturados na cachaça, no vinho, com ervas finas e o coalho comum.

Bode x Carneiro – entenda a diferença
Apesar das diferenças marcantes de sabor, em muitos restaurantes as carnes de bode e de carneiro são anunciadas sem distinção para atrair os consumidores. O cardápio pode até indicar a presença da tão pitoresca “carne de bode assada”. Mas quando o pedido chega à mesa, não precisa ter um paladar apurado para saber que a carne, na prática, é de carneiro.

O motivo é simples: os mais desavisados podem confundir a carne de carneiro com a de cabrito, o bode mais jovem. Com o abate precoce, ele não tem cheiro. Bem diferente do bode velho, que tem odor mais marcante, relacionado à presença do ácido hircinoico, e muitas vezes é usado para se referir a algo que cheira mal.

A carne caprina é considerada mais magra, rica em minerais e vitaminas, e possui quantidades de gordura e colesterol mais baixas se comparada à de carneiro. A carne de bode é consumida preferencialmente assada. Já a de carneiro geralmente é cozida.

Dica: Para escolher uma boa carne de bode ou cabra, preste atenção na cor. O gosto e a maciez variam com a idade do animal. Os caprinos mais jovens têm carne de cor rosada. A partir de um ano de idade ela se torna avermelhada. Já na fase adulta, passa a ter coloração escura.

Família
As cabras e ovelhas são da mesma família dos ruminantes, possuem quatro estômagos, mas são bem diferentes no visual.

O bode geralmente tem pelo com aspecto mais liso, cornos ou chifres para fora, alguns bem proeminentes. Costumam ter uma barbela. A cauda é curta e levantada.

Já os carneiros têm pelo mais ondulado, as vezes em formato de lã, e cornos geralmente enrolados. Não tem barbela. A cauda é comprida e caída.

A cabra é a fêmea do bode. O filhote é o cabrito. Já a ovelha é a fêmea do carneiro. O filhote é o cordeiro.

Por onde começar
Se empolgou com o desempenho da caprinocultura e pensou em colocar em prática aquele antigo projeto de criação de animais? Veja as dicas para começar a tornar seu negócio uma realidade.

* Cada atividade agropecuária segue uma norma própria e sujeita à fiscalização sanitária e ambiental. Por isso busque informações sobre a formalização do negócio nos órgãos municipais.

*Faça um planejamento de médio a longo prazo. “Na atividade agropecuária, ao contrário de muitas outras, não é recomendado fazer planejamentos de curto prazo. No agro é preciso pensar em investimentos com retornos menos imediatos”, alerta Adriana Moura, Coordenadora de Agronegócios do Sebrae Bahia.

* Se associe com produtores que tenham os mesmos objetivos que você. “O produtor rural precisa se associar. Olhar para a cadeia produtiva como um elo que pode auxiliar no alcance de soluções. No caso da produção de leite, por exemplo, ele vai vender para um laticínio, ou para merenda escolar. Se ele se unir com outros produtores, pode viabilizar a logística”, acrescenta Adriana.

Projeções
O Sebrae tem estudos que indicam a viabilidade de vários negócios agrícolas. São módulos que trazem análises sobre a chance de sucesso de cada atividade. Para iniciar a criação de ovinos, por exemplo, as projeções apontam que o investimento inicial ideal é de R$ 30 mil, valor usado para comprar 50 matrizes. De acordo com os especialistas, se oferecer alimentação adequada e seguir o manejo correto, o produtor rural pode aumentar o plantel para 90 animais no período de um ano. São necessários pelos menos 2 anos para obter o retorno do investimento inicial.

Atento a este filão, o corretor de seguros Anselmo Natalino Oliveira decidiu investir na criação de ovelhas. Junto com o pai, há dois anos instalou o negócio na antiga fazenda da família no município de Santa Luz, a 280 km de Salvador.

“Nós tínhamos um espaço que estava parado. Passamos dois anos preparando a propriedade. Plantamos muita palma forrageira e capim para alimentar os animais. O negócio está avançando”, diz. Ele começou com 120 animais.

A produção é voltada para o fornecimento de carne e o sistema de criação é o semi confinado, quando as cabras ficam parte do tempo soltas no pasto e outra parte em piquetes com espaço limitado.

“Apesar da seca, com este sistema a gente tem a possibilidade de criar ao longo de todo o ano. As ovelhas da raça Santa Inês com Dorper são resistentes e conseguem pegar peso fácil. Vale a pena. A carne tem alto valor agregado e está conquistando o segmento de alta gastronomia. Tem ampla perspectiva, os produtores baianos ainda não conseguem atender o mercado”, finaliza Anselmo.

O município de Santa Luz tem tradição neste tipo de negócio. Segundo dados do censo do IBGE, a região possui 1.800 estabelecimentos agropecuários, com um rebanho de 50 mil ovinos e 30 mil caprinos.

As 10 cidades com maiores rebanhos de caprinos na Bahia
Casa Nova: 269.845 caprinos
Curaçá: 198.566
Juazeiro: 163.823
Uauá: 113.487
Campo Formoso: 82.078
Remanso: 81.422
Monte Santo: 79.263
Pilão Arcado: 77.183
Campo Alegre de Lourdes: 72.554
Sento Sé: 71.675

Cinco benefícios do Leite de cabra

NUTRIÇÃO: O leite de cabra é rico em carboidratos, proteínas vitamina A, vitamina B3, vitaminas C e D, cálcio, magnésio, fósforo, ferro, potássio, selênio, zinco e cobra

MAIS DIGESTIVO: é considerado mais fácil de ser digerido graças ao fato da bebida possuir glóbulos de gorduras menores do que o leite de vaca.

SAUDÁVEL PARA A PELE: os ácidos graxos e os triglicerídeos encontrados no leite de cabra contribuem para a hidratação da pele, maciez e combate a acne.

PARA OS OSSOS: rico em cálcio é geralmente recomendado para saúde dos ossos e combate a osteoporose.

SISTEMA IMUNOLÓGICO: fonte de selênio, o leite de cabra ajuda no funcionamento do sistema imunológico e na proteção de infecções.

Fonte: Correio

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *