De novo, Dallagnol?

(Foto: Esq.: Deltan Dallagnol (Foto.ABR))

Por Paulo Moreira Leite, do Jornalistas pela Democracia – Além de conter elementos que justificam uma investigação séria, os diálogos de Deltan Dallagnol publicados na reportagem da Folha de hoje, com base nos arquivos do Intercept-Brasil, permitem sustentar um ponto claro desde já.

As conversas,  que deixam claro um esforço permanente para ganhar montanhas de dinheiro, mostram um comportamento incompatível com a condição de procurador do Ministério Público, muito menos para quem é chefe da força-tarefa da Lava Jato, essa operação que, em nome da luta contra a corrupção, produziu um ataque frontal à democracia e as regras elementares do Direito.

Trazendo conversas que cobrem os últimos meses de 2018 e início de 2019, os registros exibem uma postura   gananciosa, de quem não se cansa de testar limites no esforço para enriquecer, embora tenha um cargo  que lhe garante uma remuneração mensal entre R$ 28 000 e R$ 32 000, sem falar eventuais vantagens e benefícios que tem o céu como limite.

Após constatar que o sucesso da Lava Jato lhe permitia   faturar alto em palestras e cursos ( “media 10 mil limpos”, por “aula/palestra”, explica à mulher), Dallagnol empenhou-se na formação de uma empresa para explorar o mercado recém-aberto. Como parceiro, convidou outro procurador, Robinson Humberto Pozzobon, celebrizado pela frase inesquecível “não tenho prova, tenho convicção” na entrevista em que foi exibida a sentença power-point contra Lula.

Num diálogo registrado, partilhado pelas respectivas esposas, que seriam chamadas a assumir um papel delicado na formação da empresa,  Dallagnol e Pozzobon concordam num ponto importante: não deveriam  aparecer como sócios, função que precisaria ser entregue às mulheres. O chefe da força da tarefa explica:

“vamos ter que separar as tratativas de coordenação pedagógica do curso que podem ser minhas e do Robito e as tratativas gerenciais que precisam ser de Vcs duas, por questão legal”.

Um minuto depois, ele é ainda mais explícito sobre a “questão legal”, e faz um raciocínio de quem já está pensando no risco de a empresa vir ser investigada:

— É bem possível que um dia ela seja ouvida sobre isso pra nos pegarem por gerenciarmos empresa.

Robito fica empolgado e, segundos depois, faz três comentários em tom de aplauso. Com muita convicção, diz:

— Assim vai funcionar, Delta. Ótima ideia.

— Se chegaram nesse grau de sofistificação, é pq o negócio ficou lucrativo mesmo.

— Que veeeenham.

Como empreendedor educacional, Dallagnol planeja atividades num tom de oportunismo comercial escancarado.  Fala de um curso de quatro aulas com slogan mais apropriado para uma oficina mecânica (“Turbine sua vida profissional com ferramentas indispensáveis”). Promete ensinar a liderança “que leva seu time ao topo” e técnicas de negociação (“domine essa habilidade ou ela vai dominar você). Na mesma conversa, o chefe da força-tarefa explica que cada palestra deveria ter uma “pegada de pirotecnia” e, como se fosse propaganda de sorvete, “um gostinho de quero mais”.

Na verdade, a proximidade de Dallagnol em iniciativas rumorosas já teve um ponto alto em março, quando se revelou que o chefe da força tarefa pretendia colocar de pé uma fundação de direito privado, com uma verba de R$ 2,5 bilhões, extraída de multas pagas pela Petrobras às autoridades norte-americanas. Dallagnol anunciou o cancelamento do projeto, apenas duas horas antes da PGR Raquel Dodge entrar no Supremo, com uma ação de assinou uma ação de descumprimento de preceitos fundamentais.

Em junho, o Conselho Nacional do Ministério Público mandou arquivar uma denuncia contra Dallagnol em função dos diálogos comprometores com Sérgio Moro, nas primeiras revelações do Intercept-Brasil. É possível que tenha mesma atitude agora. Quem sabe.

Mas é certo que o esforço para esclarecer fartos indispensáveis para se compreender a Lava Jato  só enfraquece instituições e compromete a democracia.

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