Escritório do Crime é alvo de operação da Polícia Civil e MPRJ

Polícia Civil do RJ e MPRJ umprem mandados contra grupo de matadores criado pelo ex-capitão Adriano. Equipes saíram da sede do Ministério Público no fim da madrugada.

Do Globo — A Polícia Civil e o Ministério Público do Rio (MPRJ) deflagraram, na manhã desta terça-feira, uma operação contra o principal grupo de matadores de aluguel do Rio: o Escritório do Crime. Agentes cumprem dois mandados de prisão contra os chefes do bando, além de 20 de busca e apreensão em vários pontos da cidade. Alguns  locais são residências de três  ex-PMs e de um policial inativo. O principal alvo é  Leonardo Gouvea da Silva, o Mad, substituto do ex-capitão do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope), Adriano Magalhães da Nóbrega, à frente da organização criminosa.

Mad foi preso na casa dele, de dois andares, na Vila Valqueire, na Zona Norte do Rio. A prisão dele foi anunciada pelo titular da Delegacia de Homicídios, Daniel Rosa, que leu os direitos do preso. Ele estava dormindo no andar superior com a mulher. Ao ser abordado, Mad perguntou se havia um mandado de busca e apreensão.

– Tudo aqui é dentro da lei – disse Rosa, mostrando os mandados de busca e apreensão e de prisão contra Mad.

A casa onde Mad foi preso Foto: Vera Araújo / Agência O Globo

O preso foi logo se justificando, sem que fosse perguntado:

– Não tenho nada com a morte da Marielle – respondeu para o delegado e para a coordenadora do Gaeco, Simone Sibilio.

Meses antes de ser morto em 9 de fevereiro deste ano, em Esplanada, no interior da Bahia, Adriano, criador do Escritório do Crime, resolveu se dedicar mais à exploração da milícia de Rio das Pedras e da Muzema, no Itanhangá, Zona Oeste do Rio. Ele passou a chefia da organização criminosa para as mãos de Mad, seu amigo de infância, portanto, de total confiança do ex-PM. Mad ficou encarregado de arregimentar mais ex-policiais para o grupo e a negociar as “encomendas” com chefes da contravenção. O ex-capitão do Bope virou, então, conselheiro da facção de pistoleiros de aluguel, embora suas decisões ainda fossem seguidas à risca.

De acordo com as investigações, Mad e seu grupo são acusados do assassinato do empresário Marcelo Diotti da Mata, no estacionamento do restaurante Outback, na Avenida das Américas, Barra da Tijuca, no dia 14 de março de 2018. Diotti foi alvejado ao lado de seu carro, um Mercedes SUV branco. No local, foram encontradas cerca de 20 cápsulas de calibres 7.62 e 5.56. A data do homicídio de Diotti coincide com a dos assassinatos da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes, no Estácio, na Zona Norte do Rio.. Os dois crimes ocorreram à noite.

A data do homicídio de Diotti coincide com a dos assassinatos da vereadora Marielle Franco (PSOL).

Com a quebra do sigilo telefônico, autorizado pela Justiça, de alguns dos integrantes do Escritório do Crime, o Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) – que coordenou a ação com a DH Capital- fez o rastreamento dos aparelhos. Os investigadores descobriram que um dos celulares usados por Mad se encontrava justamente na área onde Diotti fora assassinado.

O empresário era casado com Samantha Miranda, ex-mulher do ex-vereador Cristiano Girão, que fora condenado por formação de quadrilha e crime eleitoral. O ex-parlamentar também foi acusado de comandar uma milícia na Gardênia Azul, em Jacarepaguá. Ele chegou a ser investigado pela morte de Diotti, mas dissera, à época, que passou a noite numa churrascaria, também na Zona Oeste.

Para os investigadores, o ex-capitão do Bope, Adriano, ainda à frente do Escritório do Crime, em 2018, estaria por trás do assassinato do empresário. O motivo seria a disputa do legado deixado pelo bicheiro Waldomiro Garcia, o Miro, ex-patrono do Salgueiro, que morreu de complicações decorrentes de um enfisema pulmonar, em outubro 2004.

Adriano teria descoberto um plano de Diotti para matá-lo. Segundo os investigadores, o ex-capitão do Bope soube a ordem teria partido do pecuarista Alcebíades Paes Garcia, o Bid, filho de Miro e irmão do Waldemir Paes Garcia, o Maninho. Este último fora assassinado no dia 28 de setembro de 2004, portanto, um mês antes de o patriarca da família morrer de causas naturais.

Mad foi preso em casa Foto: Hermes de Paula / Agência O Globo

O objetivo de Bid, de acordo com as investigações da polícia, seria dar um fim ao maior rival na disputa do legado: Bernardo Bello Barboza, ex-marido de sua sobrinha Tamara Garcia (filha de Maninho). Ele acreditava que, para chegar a Bernardo, teria antes de matar Adriano, na época pago para proteger o rival. Por esse motivo, procurou Diotti. Mas o ex-capitão ao tomar conhecimento da trama, resolveu se antecipar, ordenando que o Escritório do Crime executasse Diotti.

No dia 25 de fevereiro deste ano, outro homicídio ocorreu no clã Garcia. Desta vez, a vítima foi Alcebíades. Ele foi atacado por homens armados, que o esperavam dentro de um carro, quando Bid voltava da última noite de desfiles das escolas de samba do Grupo Especial, na Marquês de Sapucaí. O crime ocorreu quando ele saía da van, que o buscou do Sambódromo, em frente a um condomínio de luxo na Barra da Tijuca, na Zona Oeste. Os investigadores da DH e do Gaeco atribuem mais este assassinato ao Escritório do Crime.

Antes da morte de Bid, em outubro do ano passado, Shanna Harouche, filha de Maninho e sobrinha da vítima, também sofrera um ataque a tiros, em frente a um shopping no Recreio dos Bandeirantes. Mesmo baleada, ela conseguiu escapar e sobreviver. Em depoimento à DH, a vítima acusou o ex-cunhado Bernardo como mandante do ataque. O motivo: a disputa no espólio de Maninho. Após a morte de Bid, Shanna ratificou a suspeita, em sua segunda ida à delegacia.

O rastro de mortes envolvendo integrantes da família Garcia é longa. A Polícia Civil não chegou nem aos executores do assassinato de Maninho, há 16 anos. Ainda há o assassinato do filho de Maninho, Myro Garcia, em 2017, cujas investigações, até o ano passado, tratavam o caso como uma execução após um sequestro. Na verdade, o crime estaria relacionado também à disputa pela herança.

Os inquéritos de homicídios ligados aos Garcia permaneciam parados até a chegada do Gaeco, que entrou para investigar as mortes de Marielle e Anderson. Antes de a promotoria chegar ao sargento reformado Ronnie Lessa e o ex-PM Élcio de Queiroz, apontados como executores da parlamentar e de seu motorista, foi possível descobrir o Escritório do Crime. Os investigadores apuram ainda outros casos, ainda sob sigilo, que podem ter a impressão digital dos pistoleiros da organização criminosa.

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