Fui impedida de entrar nos EUA, Lilliana Matte, de 17 anos, ficou duas semanas em um abrigo

Eu estava passeando em Miami com a minha mãe e decidimos passar um fim de semana com uns amigos nas Bahamas. Fomos em um avião da família de um deles e voltamos em voo de carreira. Desembarquei no aeroporto de Miami e foi lá que tudo começou.

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Eu estava na fila da alfândega. Sabe aquele negócio de mulher, que abre a câmera frontal do celular para dar uma checada no rosto? Eu fiz isso, uma amiga apareceu atrás de mim e resolvemos fazer uma selfie [o que é proibido no local]. Não deu nem tempo de apertar o botão. Um policial pediu documentos, pegou o celular de todo mundo e nos tirou da fila. Depois de um tempo, fui chamada e um oficial da imigração me perguntou se eu tinha autorização dos meus pais para viajar sozinha – eu era a única menor de idade do nosso grupo. Mostrei a autorização no passaporte e ele disse: “Isso está em português, não é válido nos Estados Unidos”. Então, me avisaram que eu seria escoltada para um aeroporto maior, também em Miami, para resolver o problema.

Quando cheguei lá, fiquei em uma sala sozinha, só com um vaso sanitário e uma câmera. Se precisasse ir ao banheiro, tinha que ser com a câmera me filmando. Estava indignada: por que fui barrada se eu tinha visto, carimbos de entrada e saída dos Estados Unidos e ainda uma autorização para viajar sozinha? Passei o dia todo lá, sem poder trocar de roupa, com frio e com fome, respondendo a um monte de perguntas. Até que um oficial da imigração disse que eu precisaria ver um juiz, mas que ele estava em Chicago e eu teria que ir até lá. Não entendi o que estava acontecendo, em Miami também há juízes e eu não queria ir para Chicago. Fiquei horas esperando o transporte, chorando sozinha, desesperada. Acabei não viajando naquele dia. Fui encaminhada para um hotel com dois oficiais que me vigiaram a noite inteira. Tive de dormir com a porta aberta, com eles postados na entrada do quarto. No outro dia, fui levada ao aeroporto em um camburão, daqueles de ferro, para bandidos, e algemada como se fosse uma terrorista. Mas até essa hora, achava que iria ver o juiz e que voltaria para Miami, talvez no mesmo dia. Na pior das hipóteses, pensei, vão me colocar em um hotel para esperar um voo de volta.

Que nada. Não fui levada a nenhum juiz, mas a um abrigo para menores. Lá, recebi um uniforme e uma lista de regras. Perguntei a uma assistente social quando eu iria embora. Ela respondeu: “Pode demorar dias, semanas ou até um tempo mais”. Comecei a entrar em choque. Não era um abrigo, eu estava presa. Só podia falar com a minha mãe duas vezes por semana, por dez minutos, e as chamadas eram monitoradas por alguém que falava português.

Acordávamos às seis da manhã, o café era uma miséria e a comida era pouquíssima, no almoço e no jantar. Durante o dia, tínhamos de fazer aulas de inglês e ginástica no pátio, debaixo de um calor infernal. No início eu estava bem revoltada, mas me acalmei e tentei me acostumar. Lá, todas as tentativas de desobediência ou questionamentos resultavam na mesma ameaça: poderiam atrasar a nossa saída.

Depois de duas semanas no abrigo, marcaram um encontro com a minha mãe e disseram que eu talvez já fosse com embora ela. Mal tive tempo de arrumar as malas. Em nenhum momento eu ou a minha família soubemos porque fui detida. Ninguém nos explicou nada ou deu qualquer justificativa para o que aconteceu. Nos Estados Unidos, cabe ao oficial de imigração aceitar ou não um documento, liberar ou barrar alguém. E eu fui barrada.

Sobrou um pouco de rancor, claro. Mas eu entendo o lado deles também, fazem isso pela segurança do país. Continuo querendo conhecer outros lugares, mas não penso em voltar para os Estados Unidos tão cedo.

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