Onze visitantes ilustres que passaram por Salvador nos últimos 40 anos

Doris Miranda
Papa João Paulo II, Elthon John, Nelson Mandela, Fidel Castro, Michael Jackson e Paul McCartney (Fotos de Arquivo/CORREIO)
João Paulo II, Nelson Mandela, Michael Jackson e mais: personalidades deixaram mensagens de amor, igualdade e muita alegria

Conhecido como um dos estados mais receptivos ao turismo, a Bahia acolhe viajantes aos milhões por ano. Os anônimos, que descobrem e relatam a recepção calorosa, são maioria, claro. Especialmente, quando se tem o maior Carnaval de rua do mundo. Mas há aqueles visitantes que entraram para a história local e vão deixar muita saudade, sobretudo, na população de Salvador.

Como não lembrar do tumulto bom que Michael Jackson causou entre o Hotel da Bahia e o Pelourinho? E o papa João Paulo II, que reuniu quase um milhão de pessoas na missa que rezou no CAB? Nelson Mandela, fazendo um relevante discurso na Praça Castro Alves? O visitante mais recente, Sir Paul McCartney, incluiu Salvador na turnê One on One e deixou a galera na ansiedade por meses antes da apresentação icônica na Arena Fonte Nova. Relembramos, abaixo, alguns dos personagens que mudaram nossa história nestes últimos 40 anos e vote na enquete sobre qual visitante ilustre mais marcou na cena local.

1 ● Papa João Paulo II

João de Deus nos braços dos baianos

O papa João Paulo II (1920-2005) desembarcou na Base Aérea de Salvador, às 15h10, numa tarde de céu escuro e nuvens carregadas. Beijou o chão, no gesto de humildade com que saudou todos os países em que esteve, e se dirigiu ao ‘papamóvel’. Dali, saiu às ruas em direção à Catedral Basílica, no Terreiro de Jesus, onde rezaria a missa. Era a primeira vez que a autoridade máxima da Igreja Católica vinha a Salvador. Nas ruas, milhares de fiéis, vestidos de amarelo e branco, cores do Vaticano, cantavam a música João de Deus (“A bênção, João de Deus, nosso povo te abraça”), composta para o papa por Nelson Biasoli.

João Paulo II em Salvador
(Foto: Arquivo/CORREIO)

A segunda aparição num altar aconteceu no dia seguinte, dia 8 de julho de 1980, na missa campal realizada no Centro Administrativo da Bahia para mais de 800 mil pessoas, que, mesmo debaixo de chuva, não se deixaram abalar. Recebido com berimbaus, atabaques e agogôs, em sua homilia, o Santo Pontífice destacou que os “países sul-americanos já nasceram cristãos”. Num certo momento, chamou Irmã Dulce, a quem tinha encontrado no dia anterior, numa visita ao bairro de Alagados, para uma bênção especial. Na Bahia, a fala do papa sobre religiosidade ganhou um sentido imenso, quando disse ser preciso respeitar as diversas manifestações de fé: “Aqui se constrói, com inspiração cristã, uma comunidade multirracial, um tapete de raças”.

Irmã Dulce e Papa João Paulo II na Base Aérea de Salvador
(Foto: Arquivo/CORREIO)

“O catolicismo brasileiro é resultado de um dos caldeamentos mais importantes da história humana: aqui se mesclaram o índio, o europeu e o africano”, disse o Papa João Paulo II

2 ● Nelson Mandela

Passagem rápida, mas marcante

Figura emblemática da luta contra o brutal regime do apartheid na África do Sul, Nelson Mandela (1918-2013) tinha reencontrado a liberdade um ano e meio antes de pisar em Salvador. Preso político, ficou encarcerado por 27 anos e foi libertado em fevereiro de 1990, aos 72.  Não era ainda o primeiro presidente negro da África do Sul, país que governou de 1994 a 1999, quando, em 5 de agosto de 1991, chegou à capital baiana, recebido pelo então governador Antonio Carlos Magalhães (1927-2007), com quem almoçou refeição farta de dendê no Palácio de Ondina. Tinha vindo ao Brasil para “agradecer o apoio na luta contra o racismo na África do Sul”, embora seu povo, por conta do regime, não sabia muita coisa sobre o Brasil, a não ser que tínhamos um enorme futebol e um ‘rei’ chamado Pelé.

Visita de Nelson Mandela em Salvador
(Foto: Luiz Hermano/Arquivo Correio)

Para o público, Madiba fez uma aparição memorável:  um discurso sobre liberdade e igualdade ao ar livre, na Praça Castro Alves. E, na cidade em que o movimento negro se construiu na resistência dos terreiros, rodas de capoeira e blocos afros, Mandela recebeu a acolhida de chefe de Estado, ainda que estivesse só no caminho, conduzindo uma transição pacífica do apartheid para uma sociedade democrática supostamente não racista, da qual seria presidente eleito pelo voto direto.  “Pela nossa experiência amarga, sabemos que o racismo não morre voluntariamente”.

(Foto: Luiz Hermano/Arquivo Correio)

“O racismo não pode passar por uma plástica para ser mais aceitável. Racismo é racismo, qualquer que seja o nome ou máscara que vestir”, disse Nelson Mandela

3 ● Paul Simon

Do Pelourinho para o mundo

Os moradores do Centro Histórico nunca tinham ouvido falar nesse tal de Paul Simon, famoso intérprete de Mrs. Robinson, hit da dupla Simon & Garfunkel. Mas todo mundo queria ver de pertinho aquele ilustre desconhecido, nem que para isso precisasse se espremer na contenção que limitava o povão do artista, que gravava  no Pelô o clipe de The Obvious Child com a percussão de Neguinho do Samba e seu Olodum.

(Foto: Shirley Stolze/Arquivo Correio)

4 ● Fidel Castro

Se esbaldou no azeite de dendê na casa de ACM

O comandante Fidel Castro (1926-2016), símbolo da revolução em Cuba, esteve duas vezes em Salvador. Em ambas não demorou muito, mas disse ter levado consigo para casa boas impressões e amizades da Bahia. A primeira, em agosto de 1993, veio a convite do governador Antonio Carlos Magalhães, a quem o cubano devotava carinho e creditava “o impulsionamento das relações entre Brasil e Cuba”.

(Foto: Agnaldo Novais/Agecom)

Na segunda visita do estadista cubano, que esteve no poder por quase meio século, a Salvador, em setembro de 1998, ACM já não estava mais no Palácio de Ondina, pois era senador e presidente do Congresso Nacional. Mas o laço de amizade ainda era estreito e Fidel foi até a residência do político baiano, no bairro da Graça, para almoçar um vasto cardápio de comidas típicas. Quem esteve no local garante que Fidel comeu de tudo um pouquinho. De moqueca a frigideira, de efó a filé mal-assado acebolado. Bom de papo, passou quase três horas na casa do senador, entre garfadas e gaitadas. Não dispensou nem o cafezinho.

Fidel Castro, ACM, Felix Mendonça
(Foto: Arquivo/Correio)

Não nos enganemos, nunca houve tantos pobres e marginalizados em nosso continente, nunca os países latino-americanos foram submetidos a saque tão grande”. disse Fidel Castro

5 ● Michael Jackson

O rei do pop dançou na batida do Olodum e encantou geral

Até aquele fevereiro de 1996, Salvador nunca tinha visto um popstar de tamanha grandeza. Mas, sim, Michael Jackson (1958-2009) esteve entre nós. Cantou, dançou, foi carinhoso com os fãs e gravou no Largo do Pelourinho o clipe da percussiva They Don’t Care About Us com o Olodum. Dirigido por um tenso e arredio Spike Lee, regido pelo mestre de bateria Neguinho do Samba (1955-2009), Michael cantou sobre a miséria e o abandono dos miseráveis – em outras tomadas, o clipe seria complementado numa favela do Rio de Janeiro.

Acompanhado de duas crianças (um menino e uma menina) e de uma imensa entourage, que envolvia um médico e um chef de cozinha particular, Jackson movimentou Salvador inteira, da rotina prática do trânsito do centro da cidade à emoção dos seu milhares de fãs. No aeroporto, a histeria foi coletiva, dos passageiros aos fucionários dos balcões das companhias aéreas. Os fãs, então, nem se  fala. Foram em peso com gritaria, choro, cartazes e viram de longe um Michael coberto da cabeça aos pés: chapéu, mangas compridas e até uma máscara cirúrgica. De fora, só os olhos e as mãos.

(Foto: Arquivo/CORREIO)

Dali para o Hotel da Bahia: gente que não acabava mais, chorando no saguão, tentando invadir o estabelecimento e até, quem sabe, vislumbrar o ídolo maior na janela… Mas, que nada, a suíte que hospedou o astro americano dava para a Av. Sete de Setembro e não para o Campo Grande, onde a multidão teve pouca chance de vê-lo.

Melhor visão do astro teve quem bateu ponto no  Pelourinho no outro dia. Ele chegou por volta do meio-dia, vestido com jeans, camiseta do Olodum e nada da máscara com que saiu do avião. Surpreendentemente simpático, Michael atendeu pedidos de autógrafo, abraços, toques em sua pele cor de rosa e até beijos – ainda que o número de policiais disponíveis para fazer a segurança estivesse marcando o jogo (e tietando).

Michael almoçou no Senac e às 14h começou a filmar, com sol quentíssimo do Verão baiano. Não se fez de rogado. Dançou em todos os takes que Spike Lee pediu, prestou atenção na bateria do Olodum, ‘roubou’ o cassetete de um militar, fez dele seu instrumento e ainda arrumou um jeito de deixar os jornalistas presentes na cobertura mais à vontade. Uma estrela, sem dúvida.

Michael no Pelourinho
(Foto: Edson Ruiz/Arquivo Correio)

6 ● Paul McCartney

O dia em que um beatle fez uma noite histórica em Salvador

Por essa, ninguém esperava. Afinal, eu, você e todo mundo pensava: muita areia pro nosso caminhãozinho. Mas, não é que ele veio mesmo? Um Beatle em Salvador, minha gente! Paul McCartney incluiu a capital baiana na turnê One on One, que passou também por São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. E fez uma noite histórica na Arena Fonte Nova em 20 de outubro de 2017 para fãs de várias gerações, todos com expectativa no nível máximo para ouvir clássicos, como A Hard Day’s Night (que abriu o repertório do show e que ele nunca tocou ao vivo em carreira solo) da própria boca do mito de Liverpool.

Na plateia, o clima era de puro êxtase. Até para quem não é tão fã, como a dentista Lívia Silveira, que veio de Itapetinga acompanhar o marido, o também dentista Leandro Silveira. “Não conheço muito bem as músicas dele, mas eu olho para as pessoas e elas estão tão hipnotizadas. É tão bonito ver isso”, destacou ela.

A ansiedade dos baianos ganhou força mesmo em novembro de 2017, quando o CORREIO publicou uma entrevista exclusiva que o repórter Roberto Midlej fez com Macca. “Convidado para a missão, aceitei. Segundos depois, caí na real, e pensei em desistir, mas não tive coragem de refugar. Passaram-se dez, vinte, trinta dias, dois meses… E nada de confirmarem a entrevista. Finalmente, o telefone toca. ‘Hi, Roberto! How are you doing?’. Sim, era ele. Depois dessa, é como dizem os mais jovens: ‘Zerei a vida’”, relatou Midlej, em crônica também publicada.

Conversa fluindo, Paul encerrou a entrevista com sua já conhecida gentileza: “Mande meu amor para a plateia de Salvador e diga que vamos ter uma grande noite”. E ‘ameaçou’: “Acho que a plateia se cansa mais do que eu no show”.

Paul McCartney na Arena Fonte Nova
(Foto: Arisson Marinho/ CORREIO)

Quem esteve na Fonte Nova pôde constatar que a brincadeira era mesmo verdade. Em duas horas e tanto de show, aos 75 anos na época, McCartney não demonstra cansaço – não para nem para beber água. Cantou um clássico atrás do outro, sem perder o fôlego.

O único momento de descanso que teve foi para convidar uma fã baiana para dançar com ele. E o que se descobriu poucos meses depois era que se tratava da filmagem de um videoclipe para seu álbum recente.

Paul na Arena Fonte Nova
(Foto: Breno Galtier/Divulgação)

“E aí, Salvador, beleza? Finalmente, eu vim para a Bahia! Vocês são massa! O principal é aquilo que você recebe da plateia. Temos uma resposta ótima e é isso que me motiva a fazer mais. Então, em vez de me sentir cansado,  eu me sinto ainda mais energizado por causa do público”, disse Paul McCartney

7 ● Elton John

Glamour e talento na Fonte Nova

Primeira atração internacional da Arena Fonte Nova, em fevereiro de 2014, bem pertinho do Carnaval, o astro inglês Elton John emocionou os baianos com alguns dos seus maiores sucessos, todos devidamente costurados na turnê comemorativa de seus 40 anos de carreira.

Elton John emocionou público na Arena Fonte Nova
(Foto: Divulgação)

Estrela de primeira grandeza do glam rock arena dos anos 70, Sir Elton John cantou clássicos como Goodbye Yellow Brick Road, Tiny Dancer, Rocket Man, Nikita e Skyline Pigeon.

(Foto: Mauro Akin Nassor/CORREIO)

8 ● Desmond Tutu

Ele adorou o camarote

O arcebisbispo emérito da Igreja Anglicana e Prêmio Nobel da Paz, 86 anos, veio algumas vezes à Bahia. A última vez em Salvador, em 2007, foi ao Camarote 2222, de Gilberto Gil, em plena folia do circuito Barra-Ondina.

(Foto: Luiz Fernando/Divulgação)

“O Carnaval da Bahia é maravilhoso! É bonito ver pessoas de raças diferentes unidas pela música e pela dança. Todos viram um só!”, disse o Bispo Desmond Tutu

9 ● Fatboy Slim

Folia eletrônica

Um dos maiores DJs/produtores da música eletrônica, o inglês Fatboy Slim já tocou para muita gente, mas não esperava a multidão que o seguiu no Carnaval de Salvador, em 2007, quando comandou suas pick-ups de um trio elétrico.

(Foto: Max Haack/Divulgação)

10 ● Bono

O líder do U2: “E, aí, chupa toda?”

A música nem era nova. Na real, no Carnaval de 2006, o hit Chupa Toda só era lembrado mesmo no repertório de Ivete Sangalo. Mas a lambadinha que deu fama à banda Frutos Tropicais, nos anos 80, ganhou um admirador especial: o irlandês Bono, que naquele ano veio experimentar a folia no Camarote Expresso 2222, de Gilberto Gil. Gravada por Ivete em 2004, com vocais de Gil, a música foi repetida à exaustão pelo cantor do U2.

(Foto: Arquivo/CORREIO)

11 ● Madre Teresa de Calcutá 

Serva da caridade

Em julho de 1979, Madre Teresa de Calcutá (1910-1997) recebeu convite de dom Avelar Brandão Vilela  (1912-1986) para vir a Salvador e Irmã Dulce quis conhecer a famosa religiosa, Prêmio Nobel da Paz daquele ano. Uma saia justa se estabeleceu, pois, aos jornais, dom Avelar disse que “não conhecia testemunho maior de amor aos humildes”, referindo-se a Madre Teresa. Os baianos responderam: “E o Anjo Bom da Bahia?”

(Foto: Osid)

“Vivo para os pobres e para Cristo. A maior injustiça que se pode fazer é olhar os pobres de cima para baixo, perdendo o respeito”, disse Madre Tereza de Calcutá

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *