Presos na Uerj: falta de verba atrasa formatura de alunos em um ano

Matheus teme perder o emprego
Matheus teme perder o emprego Foto: Fábio Guimarães / Agência O Globo
Bruno Alfano

Foi uma alegria só quando Ana Cláudia Silva recebeu a notícia, em 2014, de que entraria na faculdade de Jornalismo da Uerj. A menina, então com 21 anos, abandonou o emprego como garçonete em Valença, no interior do estado, para ser a primeira da família a cursar o ensino superior. A festa de formatura já estava programada para o fim de 2017. Mas não foi o que ocorreu: sucessivas greves atrasaram a formatura para dezembro de 2018 — isso se as aulas forem regularizadas no ano que vem. Ela é mais uma aluna que está presa na universidade — em 2016, o número de formandos caiu pela metade em relação à média dos últimos cinco anos.

— A gente fica sem perspectiva, traça uma vida a partir da formação acadêmica e isso é tirado da gente — diz a menina, que ainda precisa se manter no Rio pagando aluguel.

Os professores da Uerj estão desde setembro sem receber os salários e, por isso, estão em greve desde 3 de outubro. As bolsas dos estudantes cotistas também não estão sendo pagas. Esse é o caso de Matheus Souza, de 22 anos. Morador de Nova Iguaçu, o rapaz também se formaria no fim deste ano — e tem que esperar por mais um, caso tudo melhore.

— A gente pode ficar dois anos numa empresa como estagiário. Já estou um e, se não me formar no fim do ano, posso perder a oportunidade de ser efetivado — afirmou.

A falta de perspectiva para a universidade vem afetando até a saúde dos estudantes. Ariane Gonçalves, de 22 anos, apresentou um quadro de depressão depois de tanto esperar pela formatura, que deveria acontecer no fim de 2017:

— Não conseguia visualizar meu futuro, eu perdia vida enquanto esperava a UERJ voltar. Eu sempre fui muito regrada com estudos, e por um momento me vi sem norte! Minha doença apareceu no meio da primeira greve, que aconteceu em 2016. Eu ainda morava no Rio e fazia estágio. Mas comecei a ter as crises de pânico, parei de comer, perdi 5kg em uma semana, fui diagnosticada com anorexia nervosa. Aí tudo desandou. Procurei auxílio psiquiátrico. Agora, voltei para Macaé, onde eu moro, para esperar a greve acabar a a volta às aulas.

A situação precária da Uerj vem diminuindo o interesse dos jovens no vestibular. O número de estudantes que ingressaram na universidade, em 2016, foi 41% menor do que no ano anterior. Houve queda no número dos ingressos em 37 cursos.

Medicina foi um dos poucos cursos que não diminuiu o número de alunos que entraram, em comparação entre 2015 e 2016. Nos dois anos, ingressaram 104 alunos. Somente os cursos de Geografia, Matemática, Geologia e Ciência da Computação tiveram mais alunos ingressando em 2016 do que no ano anterior.

O baixo interesse também ficou evidente no último vestibular da unidade. O concurso para escolha dos novos alunos teve apenas 35,6 mil alunos inscritos, o menor da história. No ano anterior, havia sido 80 mil inscritos.

A baixa procura fez com que a universidade fizesse um calendário especial para 2017. Nele, dois semestres seriam comprimidos em seis meses, o que colocaria o calendário em ordem. A nova greve, no entanto, fez plano não funcionou.

A Uerj informou que, para o ano de 2017, a universidade ainda não tem os dados fechados. “Ainda seguimos processando as reclassificações do Vestibular de 2017”, informou a universidade.

Em nota, a reitoria informou que ainda não sabe como será o ano de 2018. “O Calendário Acadêmico sempre é redimensionado pelo Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão (CSEPE) logo após o retorno da greve”, informou.

Confira a nota completa da universidade

O DATAUERJ, publicado em 2017, compila os dados referentes ao ano civil de 2016 e não do ano calendário que está atrasado, desde 2016. De todo o modo, os demais dados referentes a 2016 permitem inferir o grave quadro de desfinanciamento público da UERJ, o que acabou por provocar, na Universidade, paralisações, desde o final de 2015 e greves deflagradas em 2016 e 2017.

Para o ano de 2017 a UERJ somente dispõe dos dados parciais. Ainda seguimos processando as reclassificações do Vestibular de 2017.

O Calendário Acadêmico sempre é redimensionado pelo Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão (CSEPE) logo após o retorno da greve. A UERJ retornará à sua normalidade, que é o que mais desejamos que aconteça, quando do pagamento de todos os salários em atraso, do 13º salário de 2016, bolsas e da regularização de verbas para a sua manutenção e garantia de infraestrutura.

A explicação principal em relação aos números apurados pela reportagem é que o DataUerj trata de dados anualizados e a Universidade está sofrendo com o descompasso entre o ano civil e o calendário letivo. Ainda não é possível falar em decréscimo de números.

A UERJ está viva e, por isso, envidando todos os esforços, a um preço muito alto, para os seus servidores (técnicos e docentes) e seus estudantes, a fim de retomar, por completo, todas as suas atividades, reafirmando o seu compromisso e missão com a população do Estado do Rio de Janeiro.

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