Saga de glória e decadência da família Guinle vira livro

Luis Fernando Lisboa

  • Família Guinle sempre foi relacionada ao glamour de uma época - Foto: Divulgação

    Família Guinle sempre foi relacionada ao glamour de uma época

Luxo, intrigas políticas, segredos amorosos, ascensão e queda são ingredientes perfeitos para uma narrativa novelesca. Só que esses elementos também acompanharam as histórias reais da família  Guinle.

A trajetória desse clã nacional é revista no livro Os Guinle – A História de Uma Dinastia, escrito pelo historiador carioca Clóvis Bulcão. Lançada pela editora Intrínseca, a publicação refaz a árvore genealógica de uma das principais famílias brasileiras do século 20.

Eles foram os responsáveis pela construção de importantes símbolos nacionais, como o Hotel Copacabana Palace, no Rio de Janeiro, e o Porto de Santos, em São Paulo.

“A história dos Guinle, que todo mundo atribui apenas ao  mundo carioca, é, na verdade, uma saga brasileira. São gaúchos que foram viver no Rio de Janeiro durante o Império e seu espírito empreendedor impactou o Brasil”, diz o autor.

Clóvis apresenta uma pesquisa desenvolvida ao longo de cinco anos. Foram cerca de 50 entrevistas com familiares, amigos  e parceiros comerciais, além de  um robusto levantamento na imprensa da virada do século 19 para o 20.

Faro empreendedor

Filho de imigrantes franceses, Eduardo Palassim Guinle deu o pontapé nos negócios. O seu casamento com Guilhermina e a parceria com o comerciante Cândido Gaffrée  tornou o sobrenome  Guinle rapidamente conhecido na sociedade.

A construção do Porto de Santos foi o primeiro grande empreendimento do clã. A partir de estratégias, eles venceram a licitação modificada de última hora pelo Império. “Ter construído o porto foi uma proeza porque quem tentou antes não conseguiu. Foi um desafio financeiro e tecnológico”, esclarece.

Do ponto de vista da cultura, o País  também foi muito beneficiado. Antes de 1922 e da Semana de Arte Moderna, eles patrocinaram uma viagem de nomes da música popular, como Donga e João da Baiana, para um mapeamento musical no Nordeste,  Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro.

“Depois eles mandaram Pixinguinha e a banda Os Batutas para uma turnê pela Europa. Ao mesmo tempo,  deram dinheiro para o maestro Heitor  Villa-Lobos se instalar temporariamente em Paris”.

Segundo Clóvis, outra aspecto que ninguém associa aos Guinle é o futebol. Ele afirma que o esporte só vai se cristalizar como  gosto popular do brasileiro com o dinheiro fornecido por Arnaldo Guinle para a realização do Campeonato Sul-Americano de 1919.

“É um torneio que vai mexer com os apaixonados pelo futebol em várias regiões do Brasil”, detalha o historiador.

Presença na Bahia

De acordo com Clóvis, Salvador foi uma verdadeira escola para o trato político de Guilherme Guinle, segundo filho de Eduardo Palassim. Ele chega na cidade em 1907, depois de uma temporada de estudos nos Estados Unidos.

Aos 25 anos, Guilherme assumiu, na Bahia, comando da empresa Guingle & Cia, responsável pelos contratos de eletrificação dos bondes da Cidade Alta, que servia ao Centro e proximidades da região.

“Além disso, é a Guinle & Cia que vai eletrificar e modernizar um dos ícones de Salvador: o Elevador Lacerda, que se chamava na época Elevador Hidráulico da Conceição”.

Clóvis também conta que a geração anterior dos Guinle encabeçou a construção de estradas de ferro e represas em cidades do Recôncavo Baiano, como São Félix e Cachoeira. “Eles ficam na Bahia até meados da década de 1920. Depois, vendem  os negócios de energia e vão se dedicar ao porto e às atividades bancárias no Rio de Janeiro”, pontua.

Luxo e decadência

Os Guinle souberam muito bem como lidar com o poder político no Brasil. Foi a relação com o presidente Getúlio Vargas, por exemplo, que permitiu o tranquilo funcionamento do Copacabana Palace.

Inaugurado em 1923 por Octávio Guinle, o hotel deveria ter um cassino nas suas dependências. No entanto, o então governo brasileiro, comandado por Epitácio Pessoa, rói a corda e  não permite a instalação do espaço no  hotel.

“Getúlio vai ser uma mãe para os Guinle. Quem vai abrir legislação de cassino no país? Getúlio Vargas. Quando acaba o período getulista, o cassino acaba junto”, relata Clóvis.

Jorginho Guinle, neto de Eduardo Palassim, foi um dos mais assíduos frequentadores do Copacabana Palace. Nome mais do que conhecido no jet set internacional, o jovem desfilava com naturalidade pela cena  hollywoodiana.

“Os problemas começam a acontecer quando o governo do País  vai para Brasília. Então, eles perdem contato com o poder, perdem a capacidade de antever o futuro  e entram em decadência”, afirma Clóvis.

A vida do playboy Jorginho resume muito bem a trajetória da família. Se nos tempos áureos do clã ele recebia uma mesada de 45 mil dólares, no final da sua vida andava com roupas velhas e esfarrapadas. “Ele não tinha dinheiro para comprar um presente para o filho”, finaliza o historiador.

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