Tribunal eleitoral na Bolívia barra a candidatura de Evo Morales ao Senado

Para a corte, ex-presidente, que está asilado na Argentina, não cumpre requisito de ter residência permanente na região que pretende representar

À direita, o ex-presidente Evo Morales conversa com Luis Arce, candidato de seu partido ao Governo da Bolívia.
À direita, o ex-presidente Evo Morales conversa com Luis Arce, candidato de seu partido ao Governo da Bolívia.AGUSTÍN MARCARIÁN (REUTERS)

O Tribunal Supremo Eleitoral da Bolívia decidiu não autorizar a candidatura de Evo Morales ao Senado nas eleições de 3 de maio. O argumento principal é que o ex-presidente não cumpre o requisito de ter uma residência permanente em Cochabamba, a região da Bolívia que pretendia representar. Morales se encontra exilado na Argentina, enquanto em território boliviano seus rivais políticos o perseguem com múltiplos processos por diversas acusações. O Movimento ao Socialismo (MAS), partido do ex-presidente, já tinha antecipado que os juízes eleitorais inabilitariam seu líder, e também havia anunciado que recorreria da sentença perante tribunais internacionais.

A autoridade eleitoral boliviana, entretanto, permitirá a candidatura de Luis Arce à presidência pelo MAS. De acordo com Salvador Romero, presidente do Tribunal Eleitoral, Arce, ex-ministro de Economia no governo de Morales, “cumpre todos os requisitos” para disputar o pleito. O TSE comunicou sua decisão na noite desta quinta-feira, em meio ao clima de Carnaval, que é uma festa muito importante na Bolívia. Se o MAS se declarou “em emergência” antecipando que a resolução lhe seria adversa, o Comitê Cívico Pró-Santa Cruz, contrário ao dirigente socialista, havia ameaçado declarar greve por tempo indeterminado se os juízes eleitorais o autorizassem a disputar uma vaga no Senado.

O temor dos setores contrários ao MAS se devia à força que esse partido mostrava nas pesquisas pré-eleitorais, que apontam a possibilidade de esse partido de esquerda formar maioria no Senado e presidi-lo. A possibilidade de que o próprio Morales —que renunciou em novembro sob pressão dos militares— acabasse como presidente do Senado parecia intolerável para os grupos oposicionistas que participaram da sua derrubada.

As normas eleitorais na Bolívia exigem que os candidatos ao Congresso comprovem que na data da eleição vivem há pelo menos dois anos na circunscrição eleitoral por onde concorrem. Isso inabilita políticos que, apesar de trabalharem na sede administrativa do país, La Paz, procuram representar a população de outros departamentos.

Essa restrição causou vários conflitos políticos no passado. Em 2015, uma deputada foi impedida por essa razão de disputar a prefeitura da sua cidade natal; posteriormente, ela interpôs um recurso no Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas e ganhou o direito a um ressarcimento do Estado boliviano.

Segundo a resolução do TSE em referência a Morales, os juízes se preocuparam em “definir o conceito de ‘residência permanente’ em matéria eleitoral (…). A residência permanente se entende como a soma de três fatores principais. Primeiro, considera o domicílio ou residência habitual registrada e declarada pelo cidadão no cadastro eleitoral; depois, esse lugar deve ser onde o candidato desenvolve seu ‘projeto de vida’. Por último, em sua aplicação de princípio de ‘verdade material’, exige-se uma residência efetiva nesse distrito”.

O presidente do Tribunal Eleitoral da Bolívia, Salvador Romero, não quis especificar que parte dessa definição se aplicava especificamente ao ex-presidente e aos outros candidatos em situação similar, entre eles Diego Pary, ex-chanceler de Morales, que pretendia ser senador por Potosí, e Mario Cossío, um político de direita que esteve exilado no Paraguai e, portanto, não passou os últimos anos vivendo em Tarija, sua região natal.

Morales havia dito que pretendia ser senador para se proteger dos ataques que sofre e que, segundo ele, são instigados pelos Estados Unidos. Entretanto, a Constituição boliviana de 2009 eliminou a imunidade parlamentar. Morales está sendo processado por “rebelião e terrorismo” por sua suposta participação nos bloqueios rodoviários que se seguiram à sua renúncia. Por causa de uma denúncia do candidato Carlos Mesa, o Ministério Público também o investiga por suposta fraude eleitoral no pleito presidencial de 20 de outubro passado, que foi anulado. Em ambos os casos, os procedimentos transcorrem nos tribunais ordinários, sem considerar o direito dos ex-presidentes bolivianos a um julgamento especial. Mesa e outros candidatos contrários a Morales comemoraram o veto à candidatura do ex-presidente.

A primeira pesquisa de intenção de voto depois da inscrição oficial de candidatos mostrava o MAS como primeira força política do país, com 31%, seguido por Mesa, com 17 %, e pela presidente interina Jeanine Áñez, com 16%. O ex-dirigente cívico Luis Fernando Camacho aparecia em quarto lugar, com 9%. Esses resultados despertaram preocupações em setores direitistas da política boliviana. Camacho disse que, nestas circunstâncias, existia o risco de que “o MAS volte”, por isso seria preciso organizar uma frente única de todos os grupos que se opõem a ele. Sugeriu que poderia abrir mão da sua candidatura, com a condição de que outros também fizessem isso. Até agora, nenhum dos outros partidos respondeu formalmente a Camacho e todos ratificaram que continuarão na corrida.

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