Violência doméstica: papel do homem na sociedade precisa ser repensado

 

Um debate envolvendo homens e mulheres acerca da construção de uma história de igualdade evidenciou que, além de todo empenho no sentido de proteger as mulheres vítimas de violência, também deve ser feito um trabalho com os homens agressores no sentido preventivo, estabelecendo-se uma estratégia em defesa das mulheres. Este assunto esteve em pauta ontem, dia 17, durante a mesa-redonda realizada no Ministério Público estadual. O evento encerrou as atividades do ano do projeto “Diálogo dos Saberes”, que já formata a realização do terceiro ano da iniciativa em 2014, que deverá abordar temas como a perspectiva do gênero das mulheres no futebol, pertinente em ano da realização da Copa do Mundo no Brasil. Inclusive já existe um procedimento em curso sobre a questão da atuação das árbitras no Grupo de Atuação Especial em Defesa da Mulher do MP (Gedem), responsável pelo projeto.

Presidida pela coordenadora do Gedem, promotora de Justiça Márcia Teixeira, a mesa-redonda teve a participação do advogado Carlos Magno Vieira, professor de Processo Penal, pesquisador e mestrando da área de família na sociedade contemporânea; Carol Barreto, professora do bacharelado da UFBA de gênero e diversidade, design de moda e pesquisadora do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (Neim); e o psicólogo do Gedem, Rafael de Cerqueira, que também faz parte do mestrado relacionado à violência doméstica. Presidente da Comissão Permanente de Combate à Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher (Copevid), Márcia Teixeira faz um balanço positivo dos dois anos do projeto que, em busca de articulação entre a comunidade acadêmica e a sociedade civil já tem obtido respostas positivas.

“Os trabalhos acadêmicos têm conseguido uma maior visibilidade, estamos tendo uma boa circulação de mulheres durante as reuniões mensais, bem como a participação dos homens já se evidencia”, afirmou. Em 2014, Márcia pretende incentivar o crescimento da participação masculina nos debates, além de ampliar as discussões trazendo novos grupos de mulheres como as índias e ciganas. Ela complementou que antes tinha dificuldade em conseguir estagiários de Serviço Social para o Gedem, “mas no último pleito, disputando três vagas, inscreveram-se 80 estudantes. Por isso é importante tentarmos a aproximação de homens e mulheres para debatermos juntos as estratégias de defesa das mulheres”.

Antes de o debate ser iniciado, a cidadã Sílvia fez um relato sobre a violência que sofreu do marido a ponto de desestabilizar sua vida com muitas perdas materiais, sociais e até morais, que a levaram a prestar queixa contra ele. Além disso, passou a estudar e participar de grupos e decidiu ajudar outras mulheres que, ao contrário dela, não contam com o devido apoio, inclusive da família para encarar o problema. “Precisamos acabar com o dito popular de que “em briga de marido e mulher não se mete a colher”, pois a omissão pode originar uma morte”, destacou. Foi graças à intervenção de terceiros que buscaram ajuda que ela escapou da morte, pois estava sendo asfixiada pelo então marido, e não tinha forças para pedir ajuda no momento em que foi socorrida. Também passando mensagem de força para as mulheres, a poetisa Nádia Cerqueira foi aplaudida ao declamar um poema.

Primeiro a se pronunciar, Carlos Magno falou do projeto que mantém há oito anos ministrando palestras em universidades, escolas e outros espaços, nas quais demonstra a a necessidade de se trabalhar o homem agressor. Intitulado “Conversa de Homem para Homem”, ele começa indagando se a Lei Maria da Penha está sendo realmente efetivada, exibe notícias de jornais e provoca os participantes que, segundo ele, muitas vezes adotam posturas que são configuradas como violência, mas nem sabem e creditam à rotina da convivência. A partir daí, Carlos trata de vários tipos de violência doméstica, familiar, moral, sexual e fala, inclusive, como deve ser tratada a criança que presencia atos de violência envolvendo os pais. Pesquisador, diz que acaba de conseguir implantar na faculdade onde dá aulas, um núcleo de combate à violência que, a partir do próximo ano, vai cuidar dos homens agressores, o que para ele “ajudará a integrar a bandeira de luta pela prevenção”.

Em sua fala, Carol Barreto se reporta às construções culturais antigas relacionadas à identidade de gênero, orientação sexual e sexo biológico e mostra a necessidade de entender os aspectos que antecipam a violência. Sobre o racismo, entende que a arte deve funcionar como um agente político de enfrentamento a essa questão. “Mesmo vivendo em uma cidade que é a mais negra fora da África, os negros ainda não ocupam espaços que deveriam ocupar seja na TV ou em cima dos trios elétricos”, enfatizou. Lembra ainda a questão das indígenas, de fato brasileiras, que sofrem violência histórica. E faz eco com a promotora de Justiça Márcia Teixeira quando esta convoca a todos para a construção de uma nova sociedade.

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