“Novo marco do saneamento não resolve a falta de acesso à água e esgotamento sanitário”, por Ermes Costa

Representante da Frente Nacional de Saneamento Ambiental explica que marco do saneamento sancionado pelo Presidente da República conduz e incentiva a privatização e não apresenta solução para a universalização do acesso à água e esgotamento sanitário.

*Por Ermes Costa

Foram quase dois anos de discussão para o Congresso Nacional aprovar um novo marco regulatório para o saneamento básico no Brasil. A proposta mudou algumas regras para a prestação do serviço de saneamento básico, e dentre as alterações a principal delas é a facilitação da entrada de empresas privadas nesse mercado. Na última quarta-feira, o ex-deputado federal Mendonça Filho (DEM), comemorou a sanção e criticou quem votou contra o projeto. “Votar contra investimentos na ordem de R$ 700 bilhões para o abastecimento de água e para o tratamento de esgoto, na prática, é votar pela perpetuação da miséria de milhões de brasileiros, que pisam diariamente na lama e sofrem com doenças provocadas pela falta de água tratada e de esgoto”, declarou.

Ermes Costa, representante de Pernambuco na Frente Nacional pelo Saneamento Ambiental respondeu, hoje (16), o ex-deputado federal Mendonça Filho (DEM), restabelecendo a verdade sobre o real objetivo do marco do saneamento sancionado pelo Presidente Bolsonaro. “É importante esclarecer à população recifense e pernambucana que o novo marco do saneamento não apresenta uma única solução para aumento de recursos que garantam a tão sonhada universalização do acesso à água e esgotamento sanitário, pelo contrário, conduz e incentiva a privatização. No processo perverso, entregando o “filé” ao setor privado e deixando os municípios deficitários para o governo estadual”, afirmou.

“Mendonça fala da necessidade de investimentos na ordem de R$ 700 bilhões para o abastecimento de água e para o tratamento de esgoto. Grande mentira, há dois anos que repetem esse montante e até o momento, não apresentaram como calcularam desse valor”, disse. Ermes destaca que no ano 2019, o governo federal revisou o Plano Nacional de Saneamento e foi constatado que para alcançar a universalização em abastecimento de água e esgotamento sanitário em 2033, seriam necessários R$ 357,15 bilhões para as áreas urbana e rural, sendo R$ 142,15 bilhões para o abastecimento de água e R$ 215 bilhões para esgotamento sanitário, considerando recursos para implantação, ampliação e reposição (valores atualizados pelo IGP-DI da FGV para dezembro de 2017). Valor bem diferente do informado pelo Mendonça Filho.

Ex-deputado federal Mendonça Filho (DEM), comemorou a sanção do novo marco do saneamento e criticou quem votou contra o projeto.

Segundo Ermes, Mendonça imputa uma responsabilidade pela não universalização do setor do saneamento às gestões do PT e PSB, porém ele esquece de mencionar que o saneamento básico teve avanços positivos e expressivos em vários de seus indicadores desde 2007, graças ao marco legal do saneamento estabelecido pela Lei no 11.445/2007. Ermes complementa que “essa lei, sancionada em 2007 e regulamentada em 2010, nos governos PT e PSB foi inovadora e criou o marco para o saneamento básico depois de vinte anos de ausência de qualquer orientação para o setor, após a falência do Planasa.

A partir do ano de 2007 duplicou os recursos federais para o setor, saindo de valor médio de 6 bilhões para 12 bilhões anuais. Pernambuco, neste período de PT e PSB, de 2007 até 2019, 12 anos, foram investidos no setor no valor próximo de 8 bilhões, sendo em média 630 milhões anuais, já Mendonça, quando era vice-governador, durante 1999 até 2006 investiu o valor próximo de 1,7 bilhão em 7 anos, sendo 246 milhões anuais. Então, Mendonça mais uma vez manipula as palavras, colocando a culpa no PT e PSB, mas a verdade é que a gestão que ele foi vice-governador no estado de Pernambucano, investiu menos de 38% do que a gestão PT e PSB”. “Mendonça afirma que o novo marco do saneamento, com a entrada do setor privado na prestação de serviços de saneamento básico, irá melhorar a qualidade de vida de milhões de brasileiros, uma afirmação sem qualquer referência” disse Ermes, complementando que “os dados e estudos, demonstram o contrário, segundo o Instituto Transnacional (TNI), sediado na Holanda, 1.408 municípios de 58 países dos 5 continentes reestatizaram seus serviços, sendo que 312 municípios na área de água e/ou esgoto, entre os anos de 2000 e 2019”.

“Novo marco não resolverá o déficit de saneamento e vão intensificar a exclusão social”, diz Ermes Costa.

Ermes falou que “na quase totalidade dos casos, a reestatização foi uma resposta: às falsas promessas dos operadores privados; à colocação do interesse do lucro por sobre o interesse das comunidades; ao não cumprimento dos contratos, das metas de investimentos e expansão e universalização, principalmente das áreas periféricas e mais carentes; e aos aumentos abusivos de tarifas e deficiência dos órgãos reguladores, resultando na ausência de controle e fiscalização por parte do poder público para garantir regras contratuais, impedir aumento abusivo das tarifas e punir as empresas. Entre os casos emblemáticos estão 152 municípios da França, inclusive Paris, sede das duas maiores empresas multinacionais que atuam setor”.

“No Brasil, Manaus, após 20 anos de gestão privada, tem uma cobertura de coleta de esgoto de apenas 12,5% (destes, apenas 30% são tratados) e mais de 600 mil pessoas não têm acesso à água. O ranking de 2020 do Instituto Trata Brasil coloca o município de Manaus – 6° maior município brasileiro – em 96o lugar entre os 100 maiores municípios acima de 500 mil habitantes e, portanto, figurando entre os 5 piores do Brasil”, afirmou Ermes.

“Essas alterações não resolverão os problemas do déficit de saneamento no Brasil. Pelo contrário, deverão intensificar a exclusão social. O setor privado, no seu papel econômico, buscará o lucro e priorizará as localidades que exigem menores investimentos e permita uma operação superavitária”. Ele ainda informa que em Pernambuco poucos municípios são superavitários, do total de 182. “A COMPESA privatizada, o instrumento do subsídio cruzado, em que as cidades superavitárias subsidiam as deficitárias, estará ameaçado, com isso as tarifas deverão subir para a sustentabilidade da operação, ou simples os serviços serão abandonados. Como dizemos: o remédio matará o doente! Defender a COMPESA pública e de qualidade, é defender as pessoas que mais precisam, as periferias dos centros urbanos, as comunidades rurais, os municípios menores, pobres e/ou longes de uma fonte de água. É defender a classe média do aumento da conta de água. É defender a tarifa social.”

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  • *Ermes Costa é Representante de Pernambuco na Frente Nacional no Saneamento Ambiental, Representante do Sindicato dos Urbanitários de Pernambuco – SINDURB-PE e Engenheiro da Companhia Pernambucana de Saneamento – COMPESA Professor da Universidade de Pernambuco – UPE.

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