Fim de subsídio do Governo de Pernambuco ao transporte público pode sobrar para o passageiro

O vencimento da Lei 17.988, de 13/12/22, criada ainda no início da pandemia de covid-19 para subsidiar com um valor médio atual de R$ 20 milhões por mês a operação dos ônibus, poderá sobrar, mais uma vez, para o passageiro do transporte público da Região Metropolitana do Recife. A legislação, inclusive, chegou a ser investigada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE) no ano passado.

Se o Estado decidir suspender o repasse – que integra o pacote de subsídio anual ao setor de transporte no valor de R$ 300 milhões -, a expectativa é de que seja dado um aumento das passagens em 2024 ou promovida mais uma redução do serviço, além dos quase 200 coletivos que foram retirados da operação em agosto deste ano. Ou seja, menos ônibus nas ruas, intervalos maiores e, consequentemente, lotação, calor e desconforto. As informações são da colunista de Mobilidade do JC, Roberta Soares.

Isso porque a Lei 17.988 vence no dia 30 de dezembro e, por enquanto, o governo de Pernambuco ainda não teria decidido qual estratégia vai adotar para garantir a operação do sistema de ônibus sem uma ou outra solução, cada uma com impactos graves e peculiares.

SITUAÇÃO POLITICAMENTE DELICADA

“Se aumentar a tarifa, o passageiro deixa o transporte, como já vem acontecendo com o crescimento de serviços como o Uber e 99 Moto, por exemplo, que vem levando o cliente até do próprio Uber carro. Sem falar do custo político. E se reduzir o serviço, o risco é semelhante”, analisa uma fonte do setor em reserva.

A opção do Estado seria prorrogar ou reformular a legislação, assumindo o subsídio direto e oficialmente. Nos bastidores, sabe-se que há um movimento dentro do governo totalmente contrário ao modelo de antecipação de receita criado para a situação da pandemia e já prorrogado uma vez.

Pela legislação, a antecipação é repassada ao setor sem qualquer contrapartida, apenas pelo custo de operação. O Artigo 17-A da lei diz: “O Consórcio de Transporte Metropolitano – CTM poderá estabelecer, por tempo determinado, modelo de remuneração por oferta de serviços, caracterizado pelo pagamento de subsídio ou antecipação de créditos necessários à cobertura da diferença entre a receita auferida pelas tarifas cobradas dos usuários, e os custos associados à efetiva prestação dos serviços necessários ao cumprimento da programação fixada pelo CTM.

“Esse modelo de antecipação de VT é esdrúxulo porque você está gerando um crédito do governo que nunca vai ser pago. É um faz de faz de conta. É um subsídio camuflado, que não se sustenta. Vai virar um crédito podre, que mais cedo ou mais tarde o TCE vai dar em cima. Vai cobrar das empresas e dos ordenadores de despesas”, alega outra fonte ouvida pelo JC, também em reserva.

“Ou o governo equilibra a receita e a despesa, prejudicando o passageiro, ou encontra uma forma legal de repasse, assumindo o subsídio direto como é com os concessionários. Mas é fundamental saber qual a receita e o custo da operação e apertar a evasão para dar um subsídio com mais eficiência, enquanto se prepara para a licitação das linhas”, recomenda.

O QUE O GOVERNO DE PERNAMBUCO PRETENDE FAZER

O governo de Pernambuco não quis falar com a reportagem sobre quais providências pretende adotar. Sabe-se que a medida está sob avaliação da Procuradoria Geral do Estado (PGE) e que reuniões entre secretários, operadores e até mesmo o Ministério Público já aconteceram.

O quadro técnico do Estado tenta encontrar um modelo de fundamentação para a remuneração diferente do adotado para a pandemia, sob a alegação de que ele não se sustenta mais legalmente. Além de que não exige nenhuma contrapartida dos operadores.

A aposta do Estado estaria no lançamento, provavelmente em março de 2024, do edital de licitação das linhas que operam sem contrato de concessão – a grande maioria, vale destacar. O modelo, criado ainda na gestão do ex-governador Paulo Câmara, foi validado pelo TCE-PE e revisado pelo novo governo, estando para sair em breve.

A expectativa é de que a solução sobre a lei, que poderá impactar no preço da passagem e na oferta do transporte no Grande Recife, seja tomada na semana que vem. Pessoas do setor alegam que, sem a receita para cobrir a perda de demanda que ainda segue na casa do 30% – não só em Pernambuco, mas em muitos sistemas do País -, seria necessária a redução de uma média de 300 coletivos na operação.

TRANSFERÊNCIAS DO ESTADO JÁ FORAM ALVO DE INVESTIGAÇÃO DO TCE-PE

Em junho do ano passado, após dois meses de investigação, o TCE-PE determinou que o governo de Pernambuco suspendesse a transferência de antecipações da compra de créditos eletrônicos para as empresas de ônibus do Grande Recife, que na época estava em R$ 8 milhões mensais.

A antecipação vinha sendo feita desde o início da pandemia de covid-19, ainda em 2020, como forma de equilibrar a receita e a despesa do sistema, que viu a demanda de passageiros ter uma redução superior a 80%.

Em junho, o conselheiro Marcos Loreto expediu Medida Cautelar determinando a suspensão das transferências, que vinham sendo realizadas pelo Grande Recife Consórcio de Transportes Metropolitano (CTM) para o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Pernambuco (Urbana-PE).

A Medida Cautelar (n° 22100239-0) teve como base um pedido realizado pela equipe técnica do TCE para que as transferências fossem suspensas até que sejam comprovadas a correspondência entre os déficits apurados pelo CTM, mês a mês, e as respectivas transferências realizadas.

O relatório da auditoria realizada pelo Tribunal revelou que estão sendo realizados pagamentos mensais de R$ 8 milhões, em média, na aquisição de créditos eletrônicos para garantir o cumprimento da frota. Mas que não há comprovação do repasse integral da Urbana às operadoras deficitárias. São quase R$ 200 milhões transferidos até agora.

Posteriormente, a continuidade das transferências foi autorizada, mas até o vencimento da lei, neste mês.

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