De repente, o mundo acordou em choque: caíram mísseis em TEl-AvIv. Feridos, pânico, alarme global. Políticos indignados, manchetes a negro, analistas em alerta vermelho. E, entre tudo isto, um coro escandalizado: “Isto é desumano! Isto é terror! Isto é intolerável!”
Pois bem, vamos respirar fundo e olhar para o quadro completo. Os mísseis vindos do Irã atingiram o centro de Tel-Aviv depois de meses — sim, meses — de bombardeamentos do governo de Netanyahu sobre Gaza, o Líbano e até o Iêmen. Em Gaza, mais de 36 mil mortos. Entre eles, mais de 20 mil crianças. Mas durante todo esse tempo, o mundo democrático, civilizado e ocidental limitou-se a dizer: “O país de Netanyahu tem o direito de se defender.” E quando ele “se defende”, aparentemente pode arrasar hospitais, escolas, campos de refugiados e bairros inteiros. Tudo normal, tudo parte do jogo.
Mas agora, que os alvos mudaram de geografia, a narrativa também mudou de tom.
De repente, a guerra tem regras. De repente, há vítimas são inocentes. De repente, o mundo descobre que mísseis fazem mal.
O governo Netanyahu queixa-se de ter sido atacado. Mas o Irã não estava, até há pouco tempo, quieto no seu canto? Quem é que começou esta espiral de violência? Quem é que decidiu que “ataques preventivos” são válidos, mesmo contra países que não dispararam um único tiro? No direito internacional, não há lugar para guerras preventivas. Isso chama-se agressão. Mas parece que, quando é o país com capital em Tel-Aviv a fazê-lo, as regras são outras. Regras especiais, para democracias muito especiais.
E agora, as tais “abelhas da colmeia” saíram. Picaram. Não mataram milhares. Não arrasaram bairros. Mas assustaram. E isso, ao que parece, já é motivo suficiente para se gritar ao terror e pedir novas sanções — claro, contra o Irã. Porque a moral internacional é clara:
Quando o país de Netanyahu ataca, é defesa.
Quando o Irã responde, é provocação.
Quando as crianças morrem em Gaza, são estatística.
Quando há feridos em Tel-Aviv, é barbárie.
Nada justifica ataques a civis, seja onde for. Mas também nada justifica esta dupla moral cínica que desvaloriza a vida palestiniana e transforma qualquer reação dos oprimidos em crime. O governo Netanyahu tornou-se um regime à margem da ética internacional — um Estado que age com total impunidade, protegido por alianças e silêncios convenientes.
A tragédia de Tel-Aviv é real. Mas é apenas uma amostra mínima da tragédia provocada sobre milhões noutros pontos da região. E se há responsáveis por este ciclo de violência, não estão em Teerã apenas. Estão também em Jerusalém, em Washington, em Bruxellas — e em todos os microfones onde se diz que “há vidas que valem mais do que outras”.