“Muito Além do Cidadão Kane”: As relações entre a mídia e o poder no Brasil (veja o vídeo)

É um fato. Nenhum cineasta brasileiro fez qualquer filme criticando o império da Rede Globo até os anos 90. Nenhum músico, nenhum pintor, nenhuma peça de teatro, jamais fez referência ao poderio da Globo.

É um fato desolador, pois mostra a alienação de nossos “intelectuais” e “artistas”.

Foi preciso um inglês vir ao Brasil, filmar, há 27 anos, e nos mostrar aquilo que não víamos: a manipulação midiática dos poderosos do país, o apagamento da diversidade cultural brasileira, a morte dos regionalismos e o fim das tradições das diferentes regiões de nossa nação.

Quer queiramos ou não, somos vários países diferentes dentro de um só, falando a mesma língua.

Simon Hartag, cineasta inglês, mais precisamente em 1993, em maio, fez o trabalho que os cineastas e intelectuais brasileiros não fizeram: filmou e exibiu, no “Channel 4” da Inglaterra, um documentário sobre a TV Globo chamado “Beyond Citizen Kane”.

Alguns meses depois, com o nome de “Muito Além do Cidadão Kane”, o documentário começou a circular em nosso país através de fitas de vídeo caseiro e foi exibido em sindicatos, igrejas e faculdades, pois trazia depoimentos de figuras da esquerda brasileira que em entrevistas, denunciavam a Rede Globo.

Circulando de forma clandestina, o documentário fez a festa dos intelectuais comunistas/socialistas que rapidamente criaram o mito da censura sobre o filme.

“Muito Além do Cidadão Kane”, até hoje, é o único documentário crítico sobre a emissora dos Marinho, o que demonstra o quanto foi bem aplicada em nosso país a “Estratégia da Tesoura” de Lênin, onde dois partidos (as duas laminas da tesoura) se acusam mutualmente, mas professam a mesma ideologia, um (Partido) encharcado de artistas, cineastas, cantores, escritores e o outro mais tradicional, com políticos que parecem divergir do partido rival, mas os dois apenas se revezam no poder e se ajudam reciprocamente monopolizando o debate político e social do país.

Comprovando a tese da “Estratégia da Tesoura”, vemos no início do documentário Chico Buarque, outro “muso” das esquerdas, afirmando:

“Marinho é mais poderoso de que o Cidadão Kane. Ele é a maior força política de um país de 150 milhões de habitantes. Nada se faz sem consultá-lo. É assustador.”

Cinicamente vemos o mesmo Chico, junto com Caetano, em 1986, apresentando um programa na Globo, intitulado “Chico & Caetano”, os criadores do programa foram Daniel Filho e Nelson Motta. Exibido uma vez por mês, com grande propaganda da mídia, mostrava encontros entre músicos brasileiros e estrangeiros, mais os dois cantando.

Tim Maia foi anunciado como uma das atrações…de forma irreverente não apareceu. Os dois, para não perder o rebolado, mostraram tão somente os bastidores do ensaio do Tim. Ao todo foram exibidos nove programas.

Aqui você observa o mau-caratismo e a covardia “dessa gente que possui um coração de ouro” e quer salvar o mundo, pois o passado dos dois foi esquecido rapidamente por eles, só não contavam que tudo foi gravado.

O filme mostra o período da criação da Rede Globo, a trajetória de Roberto Marinho, como a TV se desenvolveu no período, mostra o acordo com a Time-Life, nos anos 60, o amparo ao regime da época, o problema ocorrido na campanha das Diretas, a venda da NEC, e como o debate entre Lula e Collor nas eleições de 1989, foi editado pela emissora. Roberto Marinho é o “Cidadão Kane” tupiniquim que Orson Welles não filmou.

A obra-prima Cidadão Kane, foi lançada em 1941, é um filme de ficção que conta a história de Charles Foster Kane e sua ascensão no mundo dos negócios das comunicações.

Nos Estados Unidos, o personagem do filme foi imediatamente associado à vida e a trajetória de William Randolph Hearst, milionário que controlava a mídia americana na época. No Brasil, a comparação se deu com o império de Roberto Marinho, que controlava a mídia brasileira e vários outros negócios.

O filme contém entrevistas de dezenas de personalidades brasileiras, tais como: Chico Buarque, Lula, Washington Olivetto, o ex-ministro da Justiça Armando Falcão, Leonel Brizola, Walter Clark e Armando Nogueira. Apresenta, em outra parte uma família de Salvador, moradora de um barraco que está no escuro, mas há uma única luz de uma tela pequena de tv ligada na Globo.

Alguns destaques: Brizola compara Roberto Marinho a Stalin, Chico Buarque, lembrando do poder “assustador” da emissora e Lula, em sua algaravia dizendo que a Globo não faz a cobertura das greves do ABC e manda em tudo. Em 1990, diz o cineasta que a Globo detinha 75% do total do bolo da verba publicitária do país.

Em 20/08/2009, A Folha de São Paulo, publicou um artigo de Diógenes Muniz, cujo título era: “Após 16 anos, Record compra o documentário “Muito Além do Cidadão Kane”. O texto dizia:

“Como parte dos esforços para atacar a Globo, a Record fez uma aquisição poderosa: comprou o documentário ‘Muito Além do Cidadão Kane’ (‘Beyond Citizen Kane’). A emissora fechou o negócio nesta semana, mas já havia tentado adquirir os direitos de exibição para TV brasileira nos anos 90.”

Estranhamente a emissora nunca mostrou o filme. A Record prestaria um grande favor à nação brasileira se exibisse o documentário. Fica a sugestão, como comemoração aos 70 anos da TV brasileira.

Para os que ficaram curiosos sobre o assunto e desejam ver a película, como programa desse domingo, deixo os vídeo do Youtube. Basta clicar, assistir e tirar suas conclusões:

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Por: Carlos Sampaio

Professor. Pós-graduação em “Língua Portuguesa com Ênfase em Produção Textual”. Universidade Federal do Amazonas (UFAM)

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