Por Larissa Rodrigues
Está cada vez mais difícil para o bolsonarismo conciliar o discurso “Deus, pátria, família e liberdade” com as práticas do grupo liderado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Nos bastidores da política, ali onde a grande massa não tem acesso, a postura não encaixa na narrativa jogada para a plateia, sobretudo nas redes sociais.
Qual é o ser humano temente a Deus que planeja tirar a vida de outro ser humano? A conta não fecha. Difícil acreditar que alguém realmente adepto da ideia “Deus acima de todos” possa planejar a morte de pessoas, seja por qual motivo for. Mas foi o que revelou a investigação de dois anos da Polícia Federal (PF).
O trabalho dos policiais, que resultou na prisão de quatro militares do Exército e um agente da PF, todos ligados a Jair Bolsonaro, chegou na alta cúpula do bolsonarismo, com o indiciamento do próprio ex-presidente, de seu ex-chefe da Casa Civil e ex-ministro da Defesa, general Braga Netto, e outros 35 “homens de bem”. Todos por abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa.
O plano, segundo a PF, era manter o ex-presidente no cargo, mesmo depois de ser derrotado nas urnas, em 2022. Como ser defensor da pátria e querer executar os dois homens (Lula e Alckmin) que receberam de forma legítima os votos de mais de 60 milhões de brasileiros e brasileiras, a maior votação obtida para à Presidência desde a redemocratização? Qual pátria estava sendo defendida, se o objetivo era silenciar as vozes de 60 milhões de pessoas dessa mesma pátria?
De que família o bolsonarismo fala, quando diz que a defende? Antes da função pública, Lula, Geraldo Alckmin e Alexandre de Moraes são pais, esposos, filhos, familiares, enfim, que deixariam parentes destroçados se o plano golpista obtivesse êxito, sem falar nas famílias das 60 milhões de pessoas que nas urnas depositaram suas escolhas e veriam seus líderes serem executados. Que consequências uma delinquência dessa magnitude traria ao Brasil? Já pararam para pensar?
Liberdade 1 – Qual é a liberdade que está faltando à extrema direita no Brasil? Se todos os dias estão a falar todo tipo de delírio nas redes sociais? Quando foram impedidos de opinar, de fazer política? Quando não foram livres para defender, inclusive, o indefensável, a exemplo da fala de Flávio Bolsonaro (PL): “pensar em matar alguém não é crime”. Pode não ser crime literalmente na lei, mas você dizer isso abertamente, ainda mais sendo uma figura pública, é quase uma legitimação da selvageria. Mas, sim, Flávio Bolsonaro disse isso livremente.
Liberdade 2 – O grupo de Bolsonaro ficou meses protestando na frente dos quartéis (de novo, livremente) sem nenhum obstáculo, depois de perderem as eleições e dizem que no Brasil está faltando liberdade, que há uma ditadura, que não podem falar mais nada. Falam tudo que querem, contra quem escolhem, todos os dias, em todo tipo de plataforma, mas se queixam da falta de liberdade de expressão. Vão precisar ajustar esse discurso sob pena de perderem espaço em 2026 para a chamada “direita lúcida” do País.
Sempre vítima – Até quando Jair Bolsonaro vai conseguir manter esse discurso de vítima perseguida pelo sistema, como também defendeu Flávio Bolsonaro, afirmando que a operação da Polícia Federal é “uma cortina de fumaça para desgastar a imagem política do pai”. Que imagem, se ele já perdeu as eleições e já está inelegível? Por qual motivo sempre tem alguém querendo derrubar Bolsonaro, como se houvesse uma conspiração infinita para caçá-lo? Quantos anos mais de investigação da Polícia Federal, uma instituição séria, serão necessários para que parte da população acorde desse delírio coletivo?
Narrativa – Está na hora de o eleitorado de Bolsonaro se perguntar o porquê de tudo ser sempre uma narrativa contra ele. E por que é sempre a narrativa dele a única verdadeira. Ora, se uma pessoa quer te enganar, é claro que ela vai dizer que todo o resto do mundo mente, apenas ela fala a verdade. Todos os veículos de imprensa, todas as instituições brasileiras, o Governo Federal, outros países, eu, você, todo mundo mente, mas Bolsonaro é quem fala a verdade? Nas redes sociais dele? Nos grupos de zap dele? Está na hora de questionar essa narrativa, que já virou uma ladainha. E está na hora, também, de o bolsonarismo parar de subestimar a inteligência do eleitorado.
Valdemar aguenta – Até quando vai durar a fidelidade e a lealdade de Valdemar Costa Neto, presidente nacional do PL, a Bolsonaro? Estará ele disposto a ir para a cadeia pelo ex-presidente? Sabendo que essa turma gosta mesmo é de poder, Costa Neto vai afundar junto com o barco bolsonarista e arriscar perder espaço na política nacional para 2026? A mesma pergunta serve para todos os demais aliados do ex-presidente, inclusive os de Pernambuco. Voltando a Valdemar, assim como Bolsonaro, ele foi indiciado por abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa, no relatório da Polícia Federal. Ele entrou na mira dos investigadores porque a PF viu elementos de que a estrutura do partido foi usada para ajudar na elaboração da minuta golpista contra Lula.
Do Blog do Magno Martins