Os líderes das Diretas Já e os seus herdeiros políticos

Movimento em defesa da reabertura política deixou sementes na política até hoje.

Movimento foi o mais importante em defesa da redemocratização do Brasil – Foto: Divulgação

O movimento político mais importante em favor da redemocratização do Brasil completa quatro décadas. A sementinha do Diretas Já foi plantada em solo pernambucano, numa ação tímida na Praça da Bandeira, em Abreu e Lima, no fim da tarde do dia 31 de março de 1983. Logo, logo virou árvore frondosa, plantada em todos os cantos do país.

Seus principais líderes – vivos ou mortos – deixaram frutos que até hoje alimentam a vida pública em Pernambuco.  Do ranço, eles só se lembram a partir dos relatos que ouviram e das páginas que folhearam. Desfrutam o sabor da liberdade. Carregam nas raízes o orgulho da plantação e da colheita e a responsabilidade de fazer germinar. E ela está nas mãos da governadora, do prefeito, dos deputados e deputadas, do líder de partido.

Confira alguns dos principais líderes e seus herdeiros:

Miguel Arraes: cabeça erguida e retorno triunfal

Prisão de Miguel Arraes (1964)

O ex-governador Miguel Arraes (1916-2005), um dos maiores líderes políticos do Brasil, acabou deposto pelos militares em 1º de abril de 1964 e exilado para a Argélia. A governança foi interrompida, mas o fôlego foi retomado quando se elegeu deputado federal em 1982 com a maior votação do Estado. Seguiu como governador em 1995. Sua trajetória contínua nos passos dos bisnetos: o prefeito do Recife, João Campos (PSB); a deputada federal Maria Arraes (Solidariedade) e a ex-deputada Marília Arraes (Solidariedade), candidata derrotada ao Governo do Estado em 2022.

“É muita responsabilidade conhecer a nossa história e ser parte de alguém que viveu isso. Meu pai (Eduardo Henrique Accioly Campos) nasceu em 1965, um ano antes do golpe militar. Ele foi morar no interior de Pernambuco naquele momento porque minha avó foi a única da família a não ir para o exílio. Meu pai não tem o nome da família materna (Arraes) porque naquele momento era um risco. Lógico que tudo isso faz diferença. Todo mundo deveria conhecer a nossa história para jamais repetir os erros cometidos lá atrás em momentos difíceis como o da ditadura, o do autoritarismo. Saber de pessoas que lutaram na linha de frente disso – como Miguel Arraes, como Eduardo e tantos outros companheiros – nos traz, sim, a responsabilidade de reconhecer que o caminho que nos trouxe até aqui deve ser um caminho que vai nos dar referência para seguir o caminho do futuro.”
João Campos (PSB), prefeito do Recife

“Há quase 60 anos, Arraes foi deposto do governo de Pernambuco, preso e obrigado a ir para o exílio pela ditadura militar instaurada no Brasil por meio de um golpe. Voltou como o grande líder que sempre foi. Desempenhou papel crucial na formação da Frente Ampla pela redemocratizacão. No dia 31 de março de 1983, promoveu a primeira manifestação pública a favor das Diretas Já! no País. Precisamos sempre lembrar, para não esquecer! Para que nenhuma aventura golpista vergonhosa, como a que assistimos no 8 de janeiro deste ano, volte a ocorrer”.
Maria Arraes (Solidariedade), deputada federal

 

“Nasci na época da redemocratização e, durante minha formação como criança e adolescente alguns dos assuntos mais importantes abordados sempre foram a consolidação democrática, a garantia e ampliação dos direitos humanos e a justiça social. São valores que até hoje norteiam meu caminho, pois saber de onde veio é muito importante para ter em mente aonde se quer chegar”.
Marília Arraes (Solidariedade), ex-deputada federal

Fernando Lyra: o mestre das costuras

Fernando Lyra

Um dos principais articuladores da redemocratização e mestre das costuras de bastidores, o ex-ministro da Justiça Fernando Lyra iria ficar satisfeito ao ver a sobrinha e primeira governadora de Pernambuco, Raquel Lyra (PSDB), citar sempre seu legado em defesa da democracia.

Jarbas Vasconcelos: voz firme de resistência

Jarbas VasconcelosEx-deputado, ex-prefeito do Recife e ex-governador de Pernambuco, o senador Jarbas Vasconcelos andou esse país de ponta a ponta, articulando apoios contra o autoritarismo. Incentivou outras gerações. O deputado estadual Jarbas Filho (PSB) carrega o peso e a leveza do nome do pai. Jarbas é espelho também para quem não tem seu sangue nas veias. O amigo e atual presidente do MDB, Raul Henry, que já foi deputado e vice-governador, é outra das suas raízes.

“A democracia é um processo contínuo. Por mais que a gente ache que ela esteja consolidada, esteja forte, ainda existem episódios lamentáveis como o da tentativa de golpe na Praça dos Três Poderes, em Brasília. Cenas que devem ser punidas. Quem participou da luta pelas eleições diretas sabe do que sofreu na pele, sabe das perseguições. Muita gente teve que sair do país, e ainda existem os desaparecidos. Os mais jovens talvez não tenham essa consciência. Sinto muito orgulho de ser filho de quem sou, por ser uma pessoa que levantou com muita veemência a bandeira das Diretas Já, numa época em que você precisava ter coragem física e cívica. Ser filho de Jarbas Vasconcelos aumenta imensamente a responsabilidade – ele que com Dr Ulysses (Guimarães), chamado Dr Diretas, percorreu esse país para afastar os tempos sombrios. Essa é uma bandeira que eu tenho, é meu legado e carrego com muita alegria”.
Jarbas Filho (PSB), deputado estadual)

 

“Comecei a trabalhar com Jarbas na ressaca da campanha das Diretas Já, em 1985. De lá para cá, já se vão 38 anos. Ao lado dele, tive a oportunidade de viver, nesse período, todos os fatos que marcaram a história do Brasil e, sobretudo, de Pernambuco. Ocupei posições no executivo e no legislativo. Jarbas foi fundamental na minha formação política. Ele é exemplo de coragem, integridade, e espírito público. Além da capacidade de estar sempre à altura dos desafios que a vida lhe colocou. Foi aprovado como prefeito, governador e parlamentar. Para mim, presidir seu partido, ser seu amigo e continuar o caminho da defesa dos valores democráticos representa um orgulho, mas também uma grande responsabilidade.”
Raul Henry, presidente do MDB

Waldemar Borges, o Deminha: reparação histórica 

Família BorgesWaldemar Borges Filho, carinhosamente chamado Deminha, teve o mandato de deputado estadual cassado em 1968. Em uma sessão comovente, a Assembleia Legislativa restituiu simbolicamente seu mandato em 2012. Três anos depois, Deminha relatou à Comissão da Verdade as violações de direitos humanos enfrentadas por parlamentares pernambucanos na época do regime ditatorial Seguiu como um defensor da liberdade. Sua história de luta sobrevive no mandato de Waldemar Borges Neto, deputado estadual pelo PSB.

“O Movimento da Diretas Já foi único e muito importante em vários aspectos. Primeiro, por sua dimensão. Depois porque foi também o maior exemplo de unidade das mais diversas forças políticas do país, reunindo todos os democratas sob uma mesma bandeira, a da retomada do direito de votar para presidente da República. Por ser um momento de grande fervor político, espalhou um entusiasmo na sociedade de maneira geral, e na juventude em particular, despertando a consciência sobre a importância da participação de todos como protagonistas na construção de seus destinos. Para jovens como eu, foi o chamamento mais forte para participar da vida política do País, foi quando comecei minha militância política mais efetiva, ajudando, na condição de dirigente partidário, a organizar a juventude dentro daquela grande mobilização nacional. O Movimento das Diretas Já não tinha por objetivo apenas nos fazer retomar o direito de votar. Ele reavivou um sentimento de cidadania que havia sido oprimido pela ditadura, estimulando a sociedade a retomar o protagonismo da cena política. Isso contaminou a juventude, os movimentos populares, operários, enfim, sob a bandeira das diretas, aconteceu um grande impulso para a volta da participação da sociedade na política. E observe: mesmo sem que a emenda tenha sido aprovada, o engajamento que ocorreu em torno de sua defesa foi tão grande que a maior parte daqueles que participaram do Movimento das Diretas Já se integrou na campanha de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral. Ou seja, foi um movimento que não parou mais e assim fez chegar ao Congresso Nacional a determinação da sociedade em derrotar a ditadura. Que isso seja sempre lembrado para que aqueles que ainda hoje flertam com regimes autoritários entendam a importância da democracia”.
Waldemar Borges (PSB), deputado estadual.

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