Pepe Mujica manda recado a Lacalle Pou: “autoridade não é autoritarismo”

Ex-presidente uruguaio disse que o presidente eleito, que assume em março, não deve confundir o que é “governar” e o que é “mandar”, e confessa que não aceitou ser candidato em 2019 “para não dividir o país”.

Foto: Ricardo Stuckert

Faltam somente duas semanas para que o Uruguai tenha um novo presidente. O empresário e político neoliberal Luis Lacalle Pou assumirá o país, acabando com 15 anos de hegemonia da Frente Ampla, e levando a direita de volta ao poder, em aliança com a ultra-direita – o ex-general Guido Manini Ríos, que apoiou Lacalle no segundo turno, para evitar a quarta vitória consecutiva da esquerda.

Diante desse cenário, o senador José “Pepe” Mujica, um dos presidentes da Frente Ampla (governou entre 2010 e 2015), disse em entrevista ao jornal La Diaria, de Montevidéu, que vê o futuro governo com preocupação.

Segundo Mujica, “ele (Lacalle Pou) não venceu com os votos do seu partido, porque quem ganhou o primeiro turno fomos nós (Frente Ampla). Ele necessitou da união de cinco partidos, e apesar de posar como liberal, está aliado com gente que confunde o eu é governar e o que é mandar, e são coisas diferentes. Governar não é mandar. Autoridade não é autoritarismo”.

A frase de Mujica é uma clara referência ao movimento de ultradireita Cabildo Abierto, liderado por Guido Manini Ríos, que ficou em quarto lugar nas eleições, com 11% dos votos, e cujo apoio a Lacalle Pou foi decisivo para sua vitória no segundo turno – na qual ele superou o socialista Daniel Martínez, da Frente Ampla, por pouco mais de 37 mil votos.

“Espero estar equivocado com essas coisas que, aparentemente, começamos a perceber, e que ele (Lacalle Pou) se distancie da tentação de mandar como se estivesse em um quartel”, completou Mujica, novamente aludindo a Manini Ríos.

Ainda assim, pediu à imprensa que tenha paciência com o novo presidente. “É preciso dar tempo a ele, para que encontre seu caminho, e não julgá-lo de antemão”.

Ao ser perguntado diretamente sobre Guido Manini Ríos e seu movimento de extrema-direita, Mujica preferiu dizer que “ele está jogando o seu jogo, e eu não vou fazer isso por ele”.

Outra declaração de Pepe Mujica que chamou a atenção foi quando contou que a Frente Ampla queria que ele fosse o candidato presidencial em 2019. “Renunciei (à candidatura) porque sei que, se não fizesse, minha presença (na campanha) levaria o país a uma polarização, e não podemos nos dar ao luxo de ter metade do país brigando contra a outra metade”.

Para o senador socialista “não há pior veneno para um país do que a divisão interna, e é lamentável que nem todos entendem isso”.

Ao falar sobre o perigo da polarização, Mujica mandou outro recado ao governo de Lacalle Pou. “Há uma parte importante da sociedade que gosta muito do que fizemos. Nos últimos 20 anos, nas últimas cinco eleições, nossa lista (de candidatos ao Legislativo) é a mais votada, e mesmo perdendo o governo continua sendo a mais votada”.

E o senador tem razão: a Frente Ampla continuará tendo a maior bancada no Parlamento uruguaio, e Lacalle Pou só poderá contar com maioria se conseguir apoio de outros partidos, alguns de centro, e outros de extrema-direita.

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