Em sua despedida, Luciana Lóssio vota pelo fim de censura a Anthony Garotinho
Em seu último dia como ministra do Tribunal Superior Eleitoral, Luciana Lóssio votou pelo fim da censura imposta pela Justiça Eleitoral ao ex-governador do Rio de Janeiro Anthony Garotinho. Esse foi um dos três votos apresentados pela ministra relacionados ao político, já no encerramento da sessão de quinta-feira (4/5). Como foi pedido vista dos processos, nenhum julgamento foi concluído.
Desde que foi solto, em novembro de 2018, o político está impedido pelo juízo da 100ª Zonal Eleitoral de Campos dos Goytacazes (RJ) de se manifestar sobre a investigação da qual é alvo e sobre autoridades envolvidas na apuração.
No HC, o advogado de defesa de Garotinho, Fernando Fernandes, afirma que houve violação à liberdade de expressão e que as publicações que motivaram a medida cautelar sequer foram escritas por ele. Trata-se de reprodução de reportagens e textos opinativos publicados por outros veículos, entre eles um artigo publicado pela ConJur, intitulado Por que a sentença do caso Garotinho foi (bem) reformada pelo TSE?.
A ministra Luciana Lóssio afirmou em seu voto que a liberdade de expressão é um dos direitos fundamentais mais preciosos do cidadão, “cuja garantia tem se feito presente nas compilações normativas do constitucionalismo moderno”. A ministra lembrou ainda que o Supremo Tribunal Federal já garantiu que não há crime em textos opinativos, ainda que de forma crítica.
Luciana Lóssio classificou como não apropriada a cautelar decretada. Isso porque a medida cautelar prevista no artigo 319 do Código de Processo Penal deve ter nexo funcional entre a prática do delito e a atividade exercida. No caso, o crime eleitoral imputado a Garotinho não tem qualquer relação com sua atividade de jornalista.
O político é acusado de comprar votos por meio de inclusões indevidas em um programa social, o Cheque Cidadão. Garotinho é apontado na denúncia como dono de uma rádio e de um jornal em Campos de Goytacazes, seu reduto eleitoral — o que sua defesa nega. Radialista, o ex-governador mantém um blog pessoal.
Vereadores investigados
A ministra também votou pela revogação das medidas cautelares que impediram a diplomação de seis vereadores investigados por participarem do esquema de corrupção — todos do grupo político de Garotinho.
As cautelares foram impostas pelo juiz Ralph Manhães, que atuou em um único dia em regime de plantão na 99ª e na 100ª zonas eleitorais de Campos dos Goytacazes (RJ). Com base no Código de Processo Penal, o juiz suspendeu o exercício do mantado de vereadores pouco antes de eles serem diplomados.
Segundo o advogado Fernando Fernandes, o juiz teria decidido em um processo que tramitava há três meses na corte faltando 11 minutos para o início do recesso forense. O advogado classificou como excessiva a cautelar imposta e afirmou que afastar o candidato eleito de maneira sumária e ilegal fere de morte o próprio pleito eleitoral.
Ao analisar o caso, a ministra Luciana Lóssio afirmou que houve mescla de regimes jurídicos inconciliáveis. Para ela, o ato questionado foi ilegal, pois viola o princípio da soberania popular, antecipando os efeitos das investigações judiciais eleitorais. “A suspensão do ato da diplomação e do exercício dos mandatos conquistados nas urnas, por decisão de natureza cautelar, equivale à supressão da vontade do eleitor”, afirmou.
Juiz natural
O questionamento de violação do princípio do juiz natural também foi analisado pela ministra. Dos três HCs, esse foi o único que a ministra entendeu não haver ilegalidade.
A defesa de Garotinho aponta que a investigação teve início na 75ª Zona Eleitoral, que determinou busca e apreensão que acabou resultando na prisão de um vereador. No entanto, atendendo a um pedido verbal de um promotor, o caso foi encaminhado para a 100ª Zona Eleitoral, sem que fosse declarado declínio de competência.
No entendimento de Fernando Fernandes, essa alteração violou o princípio do juiz natural. De acordo com o advogado, conforme o artigo 83 do Código de Processo Penal, é do juízo que primeiro despachar nos autos a competência por prevenção. A defesa de Garotinho apresentou ainda parecer do professor Geraldo Prado nesse mesmo sentido.
Porém, para a ministra Luciana Lóssio, esse entendimento está equivocado. Segundo ela, a prevenção é um critério subsidiário, só devendo ser aplicada diante da insuficiência das demais regras. O que, para a ministra, não é o caso dos autos. Luciana Lóssio defende que se aplica ao caso concreto o artigo 70 do Código de Processo Penal combinado com o artigo 356 do Código Eleitoral, que dizem que a competência processual penal é definida pelo lugar em que se consuma o crime eleitoral. Na situação analisada, a prisão do vereador ocorreu na circunscrição da 100ª Zona Eleitoral.
Prisão do Garotinho
Anthony Garotinho foi preso no dia 16 de novembro pela Polícia Federal, mas se sentiu mal e foi internado no hospital municipal Souza Aguiar. No dia 20 de novembro, foi submetido a um cateterismo. Logo após ser detido, ele teve um HC negado pelo TSE, que viu tentativa de supressão de instância no pedido.
Para a ministra Luciana Lóssio, só se pode questionar decisão de juiz de primeira instância no Tribunal Superior Eleitoral após passar pelo Tribunal Regional Eleitoral. No dia seguinte à sua prisão, por decisão da Justiça, o ex-governador foi transferido para o hospital penal do Complexo Penitenciário de Bangu.
A transferência foi filmada, mostrando Garotinho exaltado, gritando e se debatendo enquanto era contido pelos bombeiros que o levavam de maca para a ambulância (clique aqui para assistir ao vídeo). No dia 18 de novembro, a ministra do TSE Luciana Lóssio concedeu Habeas Corpus ao ex-governador e permitiu que ele fosse transferido da cadeia para um hospital particular.
No dia seguinte, o TSE autorizou a prisão domiciliar de Garotinho e ele pôde ser transferido para o Quinta D’Or. Já no dia 21 de novembro, Anthony Garotinho pediu sua exoneração do cargo de secretário municipal de Campos. A prefeita da cidade é sua mulher, Rosinha Garotinho. A saída do ex-governador do posto, segundo o decreto que oficializa o ato, ocorre por orientação médica.