Por que o Brasil continuou um só enquanto a América espanhola se dividiu em vários países?
Há exatos 196 anos, em 7 de setembro de 1822, o Brasil ganhava sua independência de Portugal.
Mas por que a América portuguesa se tornou um único país, enquanto a América espanhola se fragmentou em outros tantos?
Não há apenas uma única razão, mas várias, segundo historiadores com quem a BBC News Brasil conversou. E, para quem busca respostas fáceis, um alerta. Não há unanimidade nas conclusões.
Maiores distâncias, diferentes estilos de administração
Uma das causas tem a ver com a distância geográfica entre as cidades das antigas colônias e a forma como as duas possessões eram administradas por suas respectivas metrópoles.
Ainda que a colônia portuguesa tivesse dimensões continentais, a maior parte da população se concentrava em cidades costeiras, enquanto o interior permanecia praticamente inexplorado, lembra à BBC News Brasil o historiador mexicano Alfredo Ávila Rueda, da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM).
“É verdade que, hoje, o Brasil é um país enorme, com mais de 8 milhões de km². Mas, na prática, na época da independência, as principais cidades se concentravam no litoral. As distâncias entre as cidades eram, assim, menores do que na América Espanhola. O interior era praticamente território que não era controlado pela Coroa portuguesa”, diz.
Já a América Espanhola era formada por quatro grandes vice-reinados: Nova Espanha, Peru, Rio da Prata e Nova Granada, com poucos vínculos – senão comerciais – entre si. Cada um deles respondia à Coroa e tinha vida própria.
Ou seja, eram administrados localmente. Além disso, foram criadas capitanias que tinham governos independentes desses vice-reinados, como as da Venezuela, Guatemala, Chile e Quito, acrescenta Ávila Rueda.
“A administração espanhola se deu em torno de duas ‘sub-metrópoles’: México e Peru. Isso não aconteceu no Brasil, onde a administração era muito mais centralizada”, explica o historiador mexicano.
Diferenças entre as elites
Outra causa está relacionada à formação e à representatividade das elites nas duas colônias, na opinião do historiador brasileiro José Murilo de Carvalho.
No Brasil, a elite era muito mais homogênea ideologicamente do que a espanhola, diz ele.
Carvalho argumenta que isso se deveu à tradição burocrática portuguesa. Portugal nunca permitiu a criação de universidades em sua colônia. Escolas superiores só foram criadas após a chegada da corte, em 1808. Assim, os brasileiros que quisessem e pudessem ter formação universitária tinham que viajar a Portugal, sobretudo à cidade de Coimbra.
“Diante de um pedido para se criar uma escola de Medicina em Minas Gerais, no século 18, a resposta da Corte foi: agora pedem uma faculdade de Medicina, daqui a pouco vão pedir uma faculdade de Direito e, em seguida, vão querer a independência”, exemplifica o historiador brasileiro.
Quando se formavam, esses ex-alunos voltavam ao Brasil e acabavam ocupando cargos importantes na administração da colônia. Ou seja, um desembargador em Pernambuco formado em Coimbra tinha grandes chances de conhecer um desembargador do Rio de Janeiro também diplomado na mesma universidade, ou de ter conhecidos em comum, o que, na opinião de Carvalho, favoreceu um sentimento de unidade na colônia.
“Esses estudantes luso-brasileiros em Coimbra tinham organização própria. Envolveram-se no mesmo ensino que os portugueses e foram absorvidos pela burocracia da Corte, sendo enviados a todos os pontos do império português – do Brasil à África. Portugal tinha uma população muito pequena à época e não havia gente suficiente para administrar seu império. Acabou dependendo dos brasileiros treinados lá”, diz.
“Eles formaram grande parte da elite política brasileira até cerca de 1850, como ministros, conselheiros de Estado, deputados e senadores”, acrescenta.
Segundo Murilo de Carvalho, essa formação da elite brasileira em Portugal acabou por favorecer a obediência à figura real e a crença nas virtudes do poder centralizado.
Entre 1772 e 1872, passaram pela Universidade de Coimbra 1.242 estudantes brasileiros.
Por outro lado, na América Espanhola, durante esse mesmo período, 150 mil estudantes se formaram em universidades locais, diz Carvalho. Havia pelo menos 23 universidades na colônia, três delas apenas no México. Só a Universidade do México formou quase 40 mil estudantes.
Dessa forma, argumenta o historiador, quando os movimentos de independência na América Espanhola começaram a ganhar força, no século 19, eles surgiram coincidentemente nos locais onde havia universidades. E praticamente todos esses locais com universidades acabaram dando origem a um país diferente.
Ávila Rueda contesta, contudo, essa última hipótese. “Essas universidades eram, em sua maioria, reacionárias…aliadas à Coroa espanhola”, diz.
“A Universidade do México, por exemplo, era muito reacionária, a tal ponto que, em 1830 (após a independência do México), o governo mexicano decidiu fechá-la porque acreditava que não seria possível reformá-la”, acrescenta.
Neste sentido, o historiador mexicano diz acreditar que a livre circulação de impressos (jornais, livros e panfletos) na América espanhola, que não era permitida na América portuguesa (a proibição só foi revertida em 1808, com a chegada da corte portuguesa ao Brasil), teve papel muito mais importante na construção de identidades regionais do que propriamente as universidades.
“Já na América portuguesa, tudo o que era consumido vinha de Portugal, o que gerava esse vínculo muito forte com a metrópole”, lembra.
Mas fato inconteste era que, na América espanhola, os nascidos na colônia, os chamados criollos, a elite local (grandes proprietários de terras, arrendatários de minas, comerciantes e pecuaristas) eram desprezados em relação aos nascidos na Espanha, os Peninsulares.
Até 1700, quando a Espanha era governada pela dinastia dos Habsburgo, as colônias tinham bastante autonomia.
Mas tudo mudou com as reformas borbônicas feitas pelo rei espanhol Carlos 3º. Naquele momento, a Espanha precisava aumentar a extração de riqueza de suas colônias para financiar a manutenção de seu império e guerras nas quais estava envolvido.
Com isso, a Coroa decidiu expandir os privilégios dos peninsulares – colonos nascidos na Espanha -, que passaram a ocupar os cargos administrativos anteriormente destinados aos criollos.
Ao mesmo tempo, as reformas realizadas pela Igreja Católica reduziram os papéis e os privilégios do baixo clero, que também era formado em sua maioria por criollos.
Napoleão invade Portugal…e a família real portuguesa foge para o Brasil
Outro motivo que explica a manutenção da unidade do Brasil, senão o mais importante, foi a fuga da família real portuguesa para sua então maior colônia, de acordo com os historiadores.
Em 1808, com a invasão de Portugal por Napoleão Bonaparte, o príncipe regente João fugiu para o Rio de Janeiro, transferindo não somente a corte, mas toda a burocracia do governo: arquivos, biblioteca real, tesouro público e cerca de 15 mil pessoas. O Rio de Janeiro virou, então, a sede político-administrativa do império. A presença do rei em território brasileiro serviu como fonte de legitimidade para que a colônia se mantivesse unida.
“O rei era um herdeiro legítimo do poder. Temos dificuldade de entender a importância disso hoje, mas naquela época a figura de Dom João 6º como monarca tinha muita força”, diz à BBC News Brasil o historiador americano Richard Graham, professor emérito da Universidade do Texas e considerado um dos maiores especialistas em história da América Latina nos Estados Unidos.
Carvalho explica que a “transferência trouxe para o Brasil toda a burocracia portuguesa. Portugal passou a ser uma dependência. Desenvolveu-se, portanto, um foco de legitimidade política no país”.
“Se Dom João não tivesse vindo para o Brasil, o país teria se dividido em cinco ou seis países. Os lugares de maior desenvolvimento econômico, como Pernambuco e Rio de Janeiro, teriam conseguido sua independência”, assinala.
Enquanto isso, o rei espanhol é forçado a abdicar do trono…
Na Espanha, contudo, essa fonte de legitimidade foi questionada após a invasão de Napoleão. Ele forçou o rei espanhol, Carlos 4º e seu filho, Fernando 7º, a abdicar do trono a favor de seu irmão, José Bonaparte (mais tarde José 1º da Espanha).
Na colônia, a notícia caiu como uma bomba. Aqueles que viviam na América Espanhola já não sabiam mais a quem obedecer. Surgiram juntas administrativas, muitas das quais no começo governavam em nome de Fernando 7º, recusando-se a receber ordens de juntas semelhantes formadas na Espanha (após a invasão de Napoleão, o governo espanhol foi dividido em inúmeras juntas administrativas).
Quando Napoleão foi derrotado, esses líderes locais já tinham experiência de autogoverno. Reconduzido ao trono em 1814, Fernando 7º não garantiu a autonomia deles e tentou usar a força para restabelecer a submissão das colônias.
Esse fato aliado à política discriminatória por parte da Coroa Espanhola em relação aos nascidos nas Américas fez com que eles se rebelassem, inspirados pelos ideais iluministas espalhados pelas revoluções americana e francesa.
Com o apoio de outras castas, eles travaram lutas sangrentas contra a Espanha por independência, entre 1809 a 1826.
Por outro lado, quando Napoleão foi derrotado, Dom João 6º elevou o Brasil à condição de Reino Unido a Portugal. Também permaneceu no Rio de Janeiro até que as cortes exigissem seu retorno a Lisboa, em 1820, e aceitasse uma constituição liberal.
Dom João 6º deixou seu filho, Pedro, como príncipe regente no Brasil, e em 1822, Pedro tornou o Brasil independente, coroando a si mesmo como Dom Pedro 1º. O Brasil ganhou então a independência como uma monarquia constitucional.
Temor social
Preocupações econômicas e sociais também contribuíram fortemente para assegurar a unidade do Brasil.
Segundo Graham, fazendeiros e homens ricos das cidades acabaram aceitando uma autoridade central por dois motivos: a ameaça de desordem social e o apelo de uma monarquia legítima.
Um possível desmembramento do Brasil em diferentes países poderia colocar em xeque o firme controle social desejado pelos proprietários de terras e escravocratas. Inicialmente, eles achavam que conseguiriam manter o respeito e a obediência, mas revoltas populares provaram o contrário, na prática. No Haiti, por exemplo, a independência significou o fim da escravidão.
Embora o Brasil tenha conseguido sua independência de Portugal sem recorrer à luta militar generalizada, os líderes regionais procuravam maior liberdade em relação à capital, o Rio de Janeiro, diz Graham.
Mas, com o tempo, eles perceberam que essa vontade de reivindicar um autogoverno regional ou a independência completa do governo centralizado poderia enfraquecer sua autoridade, não somente sobre os escravos, mas também sobre as classes inferiores em geral. Ou seja, temiam a desordem social.
“É importante lembrar que o Brasil era um país de escravos. Eles compunham grande parte da população. Era muito perigoso que as classes dominantes começassem a brigar entre si e colocassem em risco sua legitimidade”, destaca Graham.
“Essa classe dominante temia que esses escravos pudessem aproveitar-se de suas divisões internas para se rebelar”, acrescenta.
Na América Espanhola, por outro lado, diz o historiador americano, “as elites (…) aprenderam que poderiam lidar muito bem com uma população irrequieta. Todos os países hispano-americanos tomaram medidas que objetivavam terminar com a escravidão, possivelmente para diminuir o perigo da revolta escrava. Mestiços (e alguns mulatos, como na Venezuela), tinham o comando de forças militares e eram frequentemente recompensados com posse de terras tomadas dos monarquistas”, diz.
Estatísticas sobre o comércio de escravos embasam tal hipótese.
Entre 1500 e 1866, a América Espanhola recebeu 1,3 milhão de escravos trazidos da África. No mesmo período, desembarcaram no Brasil 4,9 milhões, segundo dados da The Trans-Atlantic Slave Trade Database, um esforço internacional de catalogação de dados sobre o tráfico de escravos – que inclui, entre outros, a Universidade de Harvard.
O levantamento foi possível porque os escravos eram uma mercadoria, registrada na entrada e saída dos portos, sobre a qual incidia cobrança de impostos. Nenhum outro lugar do mundo recebeu tantos escravos.
Fragmentação em vários países
Mas por que as fronteiras dos países recém-independentes na América Espanhola não se mantiveram as mesmas das dos quatro vice-reinados? Ou seja, por que houve tanta fragmentação?
Explica Ávila Rueda: “Na época colonial, o conceito de fronteira era distinto do dos Estados modernos. O que havia era um sistema de jurisdição, não de fronteiras. E as diferentes jurisdições às vezes se sobrepunham umas às outras”.
Ele cita o caso do vice-reinado de Nova Espanha (território que compreende parte dos Estados Unidos, México e América Central).
“Em termos de governo, o vice-rei tinha controle sobre praticamente todo o território, salvo as regiões mais ao norte, que eram independentes neste sentido. Mas, a nível fiscal, o governo do México tinha controle sobre essas regiões. Já em relação a questões jurídicas, a gestão era totalmente diferente”.
“Assim, houve conflitos bélicos muito fortes para delimitar essas fronteiras no século 19, inclusive após a independência”, acrescenta.
Ávila Rueda lembra que, com a abdicação de Fernando 7º, ocorre um processo em que os territórios provinciais passam a lutar por “mais autonomia”.
“Julgamos o passado a partir do nosso ponto de vista atual. Achamos que o vice-reinado de Nova Espanha se manteve como um país unido, que é o México atual. Mas nos esquecemos que depois da independência, surgiu o império mexicano, que incluía a atual América Central. Posteriormente, com a dissolução do império mexicano, se estabeleceram a federação mexicana e a federação centro-americana, que mais tarde se desintegraria em outros países”, diz.
“Houve um processo de fragmentação na América Espanhola. Eventualmente, algumas dessas províncias formam confederações para ter força militar e se defender de outros inimigos. Ou são unidas à força, como fez Simón Bolívar”, acrescenta.
Graham concorda. “Se você vai se tornar independente da Espanha, por que continuaria a se submeter aos mandos e desmandos de Buenos Aires, por exemplo? A divisão por vice-reinos era burocrática. E as fronteiras atuais dos países da América Latina demoraram para ser consolidadas. Não era possível prevê-las antes de 1810, pois resultaram de disputas internas após a independência”, explica.
Mas é importante lembrar que também houve na América Espanhola planos de unificação, que não avançaram.
Em 1822, Simón Bolívar e José de San Martín, duas das figuras mais importantes da descolonização da América Espanhola, reuniram-se na cidade de Guayaquil, no Equador, para discutir o futuro da América Espanhola.
Enquanto Bolívar era partidário da unidade das ex-colônias (ele forçou a unificação da Colômbia e da Venezuela) e a formação de uma federação de repúblicas, San Martín defendia a restauração da monarquia, sob a forma de governos liderados por príncipes europeus. A ideia de Bolívar voltou a ser discutida no Congresso do Panamá, em 1826, mas acabou rejeitada.
E se Fernando 7º tivesse feito o mesmo que D. João 6º e transferido a corte às Américas, o mapa da América Latina seria diferente do que é hoje?
Em um artigo, o historiador americano William Spence Robertson, já falecido, cita a frase de um observador espanhol em 1821: “O México não aceitaria as leis que fossem sancionadas em Lima; nem Lima aceitaria as leis que fossem sancionadas no México”.
“A principal pergunta, portanto, é onde ele escolheria se estabelecer. Não acredito que o México permaneceria leal a um rei estabelecido em Lima e não em Madri”, diz Graham.
“Mas certamente (se Fernando 7º tivesse se transferido às Américas) haveria menos divisões do que, na verdade, ocorreu”, acrescenta.
Isso porque os reis oferecem legitimidade.
Tanto é que, na Argentina, quando um congresso em 1816 declarou a independência das “Províncias Unidas”, Juan Martin de Pueryrredón, nomeado diretor dessa entidade, tentou, nos três anos seguintes, em vão buscar alguém na Europa com vínculo real para se tornar rei das Províncias Unidades do Rio da Prata.
“A própria mulher de Dom João, Dona Carlota Joaquina, tinha vontade de se tornar rainha do Prata”, lembra Murilo de Carvalho.
Já no México, quando as cortes espanholas se recusaram a reconhecer a independência mexicana e a permitir que um membro da realeza aceitasse o trono do império mexicano, Agustín Iturbide, um dos mentores da independência, forjou uma eleição ao fim da qual foi coroado imperador, como Agustín 1º.
No Peru, também foi aventada a possibilidade de um príncipe espanhol liderar uma monarquia independente.
Rebeliões no Brasil
Mas o processo de unificação territorial no Brasil tampouco foi totalmente pacífico. Houve movimentos de caráter emancipacionista em Minas Gerais (1789), na Bahia (1798), em Pernambuco (1817).
No entanto, essas revoltas foram mais fomentadas por um sentimento de autonomia do que propriamente por um desejo de ruptura entre a colônia e a metrópole.
Um exemplo emblemático disso foi a chamada Inconfidência Mineira, liderada por Tiradentes em Minas Gerais (1789). Não havia nessa conspiração antimetropolitana nenhum desejo de libertação de todo o território.
Quando Dom Pedro 1º declarou a Independência do Brasil, em 1822, por exemplo, a maior parte das províncias do norte foram contra e permaneceram leais a Portugal, até defrontarem-se com uma força vinda do Rio de Janeiro.
Ainda assim, como lembra Graham, “mesmos os grupos do sul que declaram sua aliança a D. Pedro 1º, em meados de 1822, não significavam o triunfo do nacionalismo. Ao contrário, eles simplesmente preferiam o domínio dele, com a promessa de autonomia local, ao domínio das cortes portuguesas, que ameaçava essa autonomia”.
Ávila Rueda acrescenta ainda que, “como na América portuguesa não houve uma guerra de independência e sim uma continuidade com a transferência da corte, o governo do Rio de Janeiro tinha mais força para suprimir essas rebeliões”.
“Em contrapartida, o governo do México não tinha força suficiente para evitar o desmembramento da América Central. Tampouco o governo de Buenos Aires em relação a Uruguai ou Paraguai”, acrescenta.
‘Acordo de interesses’
Segundo a historiadora brasileira Lilia Schwarcz, “a independência do Brasil foi uma solução de compromisso entre as elites, no sentido de primeiro evitar uma mudança estrutural na então colônia que se tornaria um país e evitar grandes conturbações sociais”, diz.
“Houve um ajuste entre as várias elites locais no sentido de preservar a escravidão, evitar o formato de uma revolução, inclusive sabendo do que havia ocorrido na América Espanhola e conseguir manter o país unificado”, acrescenta.
Graham concorda. “O governo central não foi imposto às pessoas influentes ou até mesmo “vendido” a eles. Eles (a elite brasileira) o escolheram”, assinala.
“Eles procuravam legitimidade porque, sem ela, sua autoridade local permanecia relativamente fraca. Eles desejavam fortalecer a hierarquia porque ela validaria a sua própria posição local predominante. Para alcançar esses objetivos, eles construíram um estado central, simbolizado no imperador. A monarquia tinha sua utilidade”.
“A presença do imperador foi fundamental. As elites pretendiam que o imperador fosse uma espécie de símbolo a unificar as diferentes províncias e que, de alguma maneira, ele fizesse uma passagem não tão convulsionada como no restante da América Espanhola. Sabemos que a história não foi bem assim, mas foi o que aconteceu no momento da independência”, diz Schwarcz.
Por fim, a opção por um governo central, além de afastar o espectro de uma anarquia social, também favorecia estender o poder dessas elites, uma vez que cabia a elas as indicações aos cargos públicos, como oficiais da Guarda Nacional, delegados de polícia e juízes.
“Eles vieram a considerar o governo central como apropriado e útil para fins pessoais”, diz Graham.
Já no fim do século, com a unidade do Brasil já assegurada e a escravidão abolida, as elites já não precisavam mais “de um símbolo vivo do estado” para estabelecer sua legitimidade.
O império acabou destronado pelo Exército, que proclamou a república quase sem disparar um único tiro.
*Com ilustrações de Cecilia Tombesi e Kako Abraham