Tauan Saturnino e Anderson Bandeira
O momento de tensão pelo qual o Brasil passa e as consequentes manifestações de rua registradas nas grandes capitais brasileiras têm precedentes, ao menos em termos da magnitude dos protestos.
Há exatos 32 anos, em 10 de abril de 1984, o Brasil registrava a maior mobilização pública da história do Rio de Janeiro, até hoje tida como uma das maiores já registrada no País. O Comício da Candelária reuniu cerca de um milhão de pessoas em frente à Igreja da Candelária, na capital fluminense, e foi o segundo maior ato ocorrido dentro do contexto das Diretas Já, movimento que buscou o retorno das eleições diretas para a Presidência da República entre os anos de 1983 e 1984, sendo superado posteriormente pelo comício das Diretas Já na Praça da Sé, São Paulo.
Na ocasião, 52 pessoas discursaram ao longo do dia para os manifestantes. Dentre os oradores, estiveram desde representantes da classe artística, como Jô Soares, até políticos de destaque no contexto nacional da época, como Ulysses Guimarães e Leonel Brizola.
Nenhum ato de violência foi registrado na manifestação. Apesar da magnitude do ato, o movimento das Diretas Já terminou por não alcançar seu objetivo de imediato. A Proposta de Emenda Constitucional nº 5, de março de 1983, conhecida como Emenda Constitucional Dante de Oliveira, em homenagem ao deputado federal que a propôs, reestabeleceria as eleições diretas em 1985, mas terminou sendo derrotada na Câmara dos Deputados e a primeira eleição direta após o regime militar terminaria por ocorrer apenas em 1989.
Para o cientista político Hely Ferreira, o fato de as Diretas Já não ter alcançado seu objetivo já em 1985 demonstra como o comportamento do Congresso Nacional pode se revelar distante do desejo da população brasileira.
“Isso mostra que nem sempre o Congresso Nacional faz a vontade do povo. No caso da Emenda Dante de Oliveira, ela sequer chegou ao Senado, pois não conseguiu a votação mínima na Câmara dos Deputados”, comentou.
Já o cientista político Antônio Lucena, disse que a movimentação foi importante para pressionar os militares. “Os comícios das Diretas Já criaram uma pressão adicional sobre o regime militar. O País não vinha bem economicamente e o movimento reforçou o sentimento de mudança na sociedade. O movimento de certa maneira favoreceu a abertura. Os militares não concordaram com a Emenda Dante de Oliveira porque ela propunha eleições diretas e eles não desejavam uma mudança radical. Por isso fizeram a eleição indireta pelo colégio eleitoral”, frisou.
De acordo com Hely Ferreira, uma das principais diferenças do movimento das Diretas Já para as manifestações atuais contrárias ou favoráveis ao impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) diz respeito à virtual unanimidade na sociedade civil sobre o desejo de eleições diretas.
Além disso, ele disse acreditar que parte da insatisfação popular se deva mais à crise econômica que ao debate acerca do impedimento da presidente propriamente dito.
“Naquela época você tinha quase uma unanimidade na sociedade em relação à causa das eleições diretas. Hoje em dia, você tem um País dividido desde as eleições de 2014. Outro fator é que, atualmente, se você for às ruas pode encontrar pessoas que sequer sabem qual é o impacto do impeachment e mesmo assim vão para as manifestações. O que existe, muitas vezes, é o reflexo da insatisfação por conta da crise econômica”, avaliou.