No ano passado, a ministra da Cultura, Marta Suplicy, disse ao GLOBO que o trabalhador brasileiro seria autorizado a comprar pacotes de TV a cabo usando o vale-cultura. A notícia foi alvo de várias críticas de produtores culturais e artistas. Dias mais tarde, Marta reviu a posição. Desde então, a classe artística aguarda definições precisas sobre os limites do uso do benefício. Segundo o governo, o vale deve atender a um milhão de trabalhadores até o fim do ano e injetar na cadeira cultural ao menos R$ 11 bilhões.Segundo a determinação da presidente Dilma, essas questões serão sanadas mais à frente por um “ato” oficial do MinC.
Procurado para esclarecer o “ato” citado na regulamentação, o MinC informou que se trata de uma “instrução normativa”, ou seja, uma portaria do ministério. Segundo a pasta, o documento será publicado até o próximo dia 6 e esclarecerá todos os “aspectos operacionais” do funcionamento do vale-cultura.
Benefício para todos
A regulamentação presidencial trouxe, por outro lado, um ponto que até agora não havia sido destacado nem pelo MinC nem pela ministra. Ela autorizou as empresas brasileiras que aderirem ao programa a repassarem o benefício de R$ 50 não só aos trabalhadores que ganham menos de cinco salários mínimos, como anunciado anteriormente. Segundo o texto, o auxílio poderá ser estendido a todos os empregados que tiverem interesse no vale, independentemente de suas remunerações. Para isso, as empresas precisarão, primeiro, atender àqueles que se enquadram na faixa salarial mais baixa.
A margem de desconto no salário dos trabalhadores que receberem o vale-cultura não será, no entanto, igual para todos, mas sim proporcional à remuneração de cada um. Quem ganha até um salário mínimo, por exemplo, poderá ser descontado em no máximo 2% do valor do benefício (R$ 1). Quem ganha cinco salários, até 10% (R$ 5). E quem ganha mais de 12 salários, até 90% (R$ 45) do benefício.
Para aderir ao vale-cultura, as empresas interessadas precisarão se inscrever no MinC nas próximas semanas. As que tiverem interesse em vender produtos e atividades culturais deverão procurar, por sua vez, as operadoras dos cartões — que ainda não foram anunciadas pela pasta.
Créditos não expiram
Outro ponto de interesse público é o fato de que os valores depositados pelas empresas nos cartões do vale não terão data para expirar. Isso quer dizer que o trabalhador poderá acumular os R$ 50 que recebe por mês ao longo do período que lhe interessar. A medida é vista como uma resposta ao fato de o vale ter perdido quase 17% de poder de compra desde que foi idealizado, em 2009, e aprovado pelo Congresso, no fim do ano passado.
Ainda segundo a regulamentação publicada ontem, a fiscalização do programa será feita por três ministérios, numa espécie de força-tarefa. O do Trabalho cuidará das questões ligadas à correta aplicação do vale-cultura por parte dos empregadores. O da Fazenda acompanhará as questões fiscais ligadas a ele, uma vez que as empresas que aderirem ao programa poderão deduzir até 1% do imposto de renda devido. Já o MinC informa que fiscalizará “o funcionamento do programa” em geral.
Para a advogada Cristiane Olivieri, que é mestre em Política Cultural pela Universidade de São Paulo (USP) e acompanha o vale-cultura desde sua idealização, a regulamentação não esclareceu dúvidas importantes sobre o programa.
— Ela não definiu as atividades, os produtos e os serviços que poderão ser pagos com o vale. Isso era algo muito aguardado por quem trabalha no setor. Então, a regulamentação frustrou um pouco. Depois, ao jogar para a frente esse detalhamento do vale, o governo acabou adiando ainda mais a implantação real do benefício.
Cristiane acredita que ainda será necessário cerca de um ano para que toda a estrutura legal e operacional ligada ao benefício esteja pronta para entrar em funcionamento.
— Depois que a ministra divulgar a portaria, as empresas deverão começar a se cadastrar. Aí, os trabalhadores deverão se posicionar, dizendo se querem ou não o benefício. Depois, quem tem produtos e serviços que poderão ser comprados como vale terão que procurar as operadoras dos cartões… Esse é um processo longo. Deve ser demorado também. Podemos esperar que o vale-cultura esteja ativo daqui a um ano mais ou menos. Algo bem próximo das eleições.
Marta Suplicy aposta num prazo mais curto:
— Agora falta pouco para o vale-cultura chegar às mãos dos trabalhadores. Com o decreto assinado, o vale se torna uma realidade. Vamos fazer uma força-tarefa para finalizar os procedimentos internos e disponibilizar esse alimento para a alma, que é o acesso à cultura, até o fim do ano.
Fonte: O Globo