Sebastião Salgado revela, em ‘Genesis’, vários recantos ainda selvagens
Foram 12 anos de trabalho – quatro de planejamento e o restante fotografando em diversos países. O resultado é Genesis, mais um ambicioso projeto de Sebastião Salgado, um dos fotógrafos mais prestigiados do mundo, cuja exposição será aberta nesta quarta (4) para convidados, no Sesc Belenzinho – o público poderá vê-la a partir de quinta (5).
Com curadoria de Lélia Wanick Salgado,Genesis é formada por 245 imagens e organizada em cinco seções, que mapeiam os diferentes ecossistemas visitados pelo fotógrafo, desde as paisagens da Antártida até a vida selvagem do continente africano, sem se esquecer de autênticos santuários, como as Ilhas Galápagos, Nova Guiné, Sumatra e Madagascar. Antes de vir ao Brasil, Salgado conversou por telefone com o Estado.
Você pretendeu alertar sobre os mais graves problemas ambientais focando justamente naquilo que ainda há de belo e de intocado?
Sim, porque há ainda muita coisa bela para se descobrir, cerca de 46% do planeta está praticamente intocado. Temos de preservar isso.
Por que Genesis começou nas Ilhas Galápagos?
Fiquei impressionado com o livro clássico de Charles Darwin, A Origem das Espécies, e foi lá que ele justamente entendeu sua teoria. Como quis trabalhar com espécies que ainda não conhecia, fui para lá para ter a mesma compreensão que a dele, para ter uma abertura do meu trabalho. Lá, dá para comparar como uma mesma espécie em um ecossistema evoluiu e se adaptou de forma diferente de outras. Não são terras vastas, mas é uma espécie de santuário do planeta pela quantidade de espécies e por abrigar a maior concentração de erupções do mundo. É assombroso.
Você foi bem recebido nas comunidades em que esteve presente?
Fiquei amigo dos povos. As primeiras comunidades visitadas foram no Xingu, passei três meses, tempo suficiente para ficar amigo, ser bem aceito, entender o que fotografar. São pessoas fantásticas, muito amáveis. Eles não comem animais de sangue quente para não ficar agressivos – preferem peixes, répteis. Chego para aprender. No Xingu, tinha um sonho de visitar aquele espaço. Quando eu era menino, ficava maravilhado com as matérias publicadas na Manchete sobre os primeiros contatos com aqueles índios. Quando fui, tinha esse sonho. Nos outros locais, não tinha muita informação, do nível de pureza. Só visitei tribos que já têm contato com o chamado mundo civilizado, mas encontrei povos que têm hábitos de vários milhares de anos. Não fui ainda a nenhum grupo totalmente virgem. Procurei não me informar demais para assimilar de maneira direta, particular
A escolha do preto e branco: transformar cores em cinza aumenta a interação do público com a obra?
No início da minha carreira, comecei a fotografar em preto e branco, pois era a única maneira de eu poder revelar meus filmes. Mas precisei fotografar em cor por obrigação, quando trabalhei em agências internacionais como Gamma, Sigma, Magno – naquela época, eu recebia muita encomenda de revista colorida. Mas, no fundo, meu coração sempre foi em preto e branco.
Você recomenda que o público tenha tempo para ver as fotografias da exposição, analisar e sentir o que a imagem representa.
O principal é que essas fotografias são quase uma nova apresentação do planeta. Espero que as pessoas tenham tempo para descobrir detalhes desse planeta vegetal, mineral. O fato de vivermos em grandes cidades nos afastou do convívio com o planeta original – só conhecemos o ambiente que nos cerca. Nós somos também natureza, mas esse afastamento nos fez esquecer que existem árvores macho e fêmea, que existem pássaros amorosíssimos uns com os outros, que existe uma verdadeira cidade de espécies vivendo em uma única árvore. Eu gostaria que as pessoas, vendo essa exposição, redescobrissem a dignidade que uma paisagem tem assim como um ser humano.
E seus próximos trabalhos?
Tenho vontade de fazer um trabalho na Amazônia. Precisamos fazer um esforço muito grande para preservar essa integridade territorial a partir da proteção da floresta. É custoso: participo do projeto de replantar árvores no Vale do Rio Doce, onde eu nasci, um dos maiores projetos ambientais do País e custa uma fortuna plantar árvores. Mas a floresta amazônica é muito mais valiosa do que qualquer pré-sal.
Fonte: Estado de S. Paulo