Juízes federais criticam Reforma da Previdência ‘violam direitos’
A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) divulgou hoje (12) uma nota na qual critica a reforma da Previdência anunciada pelo governo federal na última terça-feira (06). No texto, assinado pelo presidente da entidade, Roberto Carvalho Veloso, a associação afirma ser “inaceitável” uma reforma “que viole os direitos e garantias fundamentais, piorando as condições de vida da população brasileira”.
Um dos questionamentos da Ajufe é o fato de o governo ter enviado a proposta ao Congresso sem um “debate sério e qualificado com os trabalhadores e servidores públicos”. O tempo de contribuição de 49 anos para que o trabalhador tenha direito à aposentadoria integral é outro ponto criticado no texto, assim como o aumento da idade mínima para 65 anos, que, para a Ajufe, “não condiz com a realidade de toda a população brasileira”.
Nota Pública – Manifestação em relação à Proposta de Emenda Constitucional nº 287/2016, que trata da Reforma da Previdência
A Associação dos Juízes Federais do Brasil – Ajufe vem a público manifestar-se em relação à Proposta de *Emenda Constitucional nº 287/2016, que trata da Reforma da Previdência.
1. A Previdência Social é um direito humano fundamental, garantida pela Constituição Federal de 1988. A inclusão previdenciária garante um seguro social, necessário quando o indivíduo se encontra em situação vulnerável e desamparado, seja pela idade avançada, acidente, invalidez ou maternidade, riscos sociais cobertos pelo sistema previdenciário brasileiro.
2. A Reforma da Previdência atingirá substancialmente a população brasileira, devendo se submeter a um debate sério e qualificado com os trabalhadores e servidores públicos. Assim, é inaceitável e temerário que a Reforma seja encampada pelo Governo, apenas sob o único enfoque da crise econômica, sem as discussões necessárias acerca dos aspectos jurídicos e sociais.
3. A Reforma da Previdência, conforme a PEC 287, acaba com o conceito de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição e institui, tanto para servidores públicos como para trabalhadores do RGPS unicamente a aposentadoria por idade (aos 65 anos), sem distinção para homens e mulheres. Para que o cálculo do benefício se faça pela integralidade da média remuneratória, o trabalhador deverá comprovar 49 anos de contribuição. O aumento da idade mínima para 65 anos e ainda com a possibilidade de elevação posterior, não condiz com a realidade de toda a população brasileira. Em Estados com baixos índices de desenvolvimento humano, a expectativa de vida da população não corresponde à média nacional apresentada pelo IBGE. Assim, resta evidente que poucos brasileiros, notadamente os que ocupam as faixas de menor renda, conseguirão atingir a idade necessária para se aposentar.
4. A exigência de 49 anos de contribuição, necessários para se alcançar a aposentadoria integral, da mesma forma, é totalmente desprovida de razoabilidade. Essa exigência, aliada à idade mínima, farão com que o povo brasileiro viva praticamente apenas para trabalhar, sendo a exceção a obtenção da aposentadoria integral. A exigência de 49 anos de contribuição para se obter uma aposentadoria integral, em um país com elevado grau de pobreza e desemprego, um sistema único de saúde com problemas de gestão e recursos, em crise econômica forte, aumentará as desigualdades sociais.
5. O tratamento diferenciado para homens e mulheres tem justificativas históricas que não se modificaram, para a grande maioria das cidadãs brasileiras, que continuam concentrando responsabilidades pela dupla jornada como mãe e trabalhadora, com pouca inserção no mercado de trabalho, possuindo rendimentos, em geral, menores que os dos homens.
6. Outra inconsistência da Reforma é o parâmetro das regras de transição, que não apresenta justificativa adequada, ao se pautar unicamente pela idade do trabalhador/servidor (idade esta que seria de 50 anos para o homem e 45 anos para a mulher). Aqui, mais uma vez, a Reforma não se pauta pelo valor social do trabalho/tempo de contribuição, pois defere o direito a regras de transição por um indicador que não premia o valor do trabalhador que iniciou sua vida laborativa em datas longínquas. A Constituição Federal tem, como fundamento, o valor social do trabalho, que também é tratado como direito social.
7. Em dispositivo inédito, a PEC 287 possibilita a revogação de normas transitórias de Emendas Constitucionais anteriores (EC’s 20, 41 e 47), que previam medidas de transição para servidores civis, de acordo com suas datas de ingresso no serviço público, se anteriores às respectivas datas de promulgação das Emendas. Isto fere a segurança jurídica e traz, de modo desassombrado, lesão ao Estado Democrático de Direito. As constantes mudanças das regras desencadeiam uma sensação de insegurança na população, desestimulando a contribuição previdenciária pública.
8. O elevado déficit da previdência social, conforme noticiado pelo governo, embora bastante questionável, deve atingir R$ 146 bilhões em 2016, com previsão de R$ 181,2 bilhões em 2017, o que requer uma discussão real acerca dos problemas geradores desse grave problema. O estado brasileiro tem a obrigação de executar uma política direcionada ao combate à sonegação fiscal, com cobrança dos devedores da União, bem como prevenindo a imensa corrupção que assola o país. Sobre a dívida de pessoas físicas e jurídicas com a União, o estoque de débitos chegou ao astronômico valor de R$ 1,8 trilhão.
9. Do estoque da dívida ativa, R$ 403,3 bilhões são débitos previdenciários, valor este que, se fosse integralmente cobrado, cobriria o déficit da previdência social. Da mesma forma, são desviados bilhões por ano em corrupção. Soma-se a isso a má gestão dos recursos do INSS, bem como as inúmeras fraudes para a obtenção de benefícios.
*10. A Ajufe considera inaceitável uma Reforma da Previdência que viole os direitos e garantias fundamentais, piorando as condições de vida da população brasileira, justamente em momentos essenciais, quando o desamparo requer a prestação de benefícios diversos pelo Estado.*