Projeto que reduz recursos no processo está parado na Câmara
Se o Judiciário é lento para julgar e punir um criminoso, o Congresso Nacional não fica para trás na incumbência de mudar as leis que favorecem a impunidade. Aprovado pelo Senado em 2010, o projeto de reforma do Código de Processo Penal está parado até hoje na Câmara dos Deputados. Uma das medidas propostas para acelerar a tramitação processual é a redução do número de recursos, limitando a apenas um o embargo declaratório (recurso utilizado quando se quer esclarecer omissão ou ambiguidade de acórdãos dos tribunais de apelação, câmaras ou turmas) em cada instância.
O Código do Processo Penal, aprovado em 1941, no governo Vargas, é o conjunto de regras e princípios destinados à aplicação dos preceitos contidos no Direito Penal no julgamento do acusado de praticar crime.
Embargo declaratório, agravo de instrumento, embargo infringente, recurso extraordinário são alguns dos muitos recursos oferecidos às partes, nos códigos processuais, para tentar mudar uma decisão. Na prática, as medidas eternizam o processo. Com recursos, é possível prorrogar um processo por mais de 40 anos no país — onde a pena máxima é de 30 anos — e garantir a impunidade. Não há nenhuma restrição contra a apresentação sucessiva de recursos, estratégia amplamente utilizada como instrumento para atrasar o cumprimento da sentença ou atrasar os julgamentos
Outra novidade do projeto é a criação da figura do juiz de garantias, que atuará somente na fase da investigação do inquérito, com objetivo de controlar a legalidade da ação da Polícia Judiciária e a garantia dos direitos do investigado. Também estabelece no código que o prazo máximo para realização da audiência de instrução e julgamento passasse dos atuais 60 dias para 90 dias, para adequá-lo aos prazos máximos da prisão preventiva.
A votação na Câmara não avança porque os advogados não aceitam as mudanças. Por sugestão do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) apresentou um substitutivo que preserva os atuais direitos dos réus. Eles também divergem da proposta de criação do juiz de garantias, por entender que esse papel já é inerente às funções do juiz natural dos processos.
— Supressão de recursos não pode ser confundida pelo parlamento com supressão de direitos — argumenta o deputado Miro Teixeira.
O deputado sustenta, contudo, que a demora na tramitação da reforma não se deve à pressão dos advogados, mas ao regimento interno da Câmara, que não permite a discussão de dois projetos de reforma de códigos ao mesmo tempo. Ele explicou que, no momento, a prioridade é a aprovação do projeto de reforma do Código do Processo Civil, que encontra-se pronto para a votação em plenário.
Tão logo isso ocorra, disse Miro Teixeira, será designada uma comissão especial para apreciar o projeto do Código Penal e o seu substitutivo. Quando uma proposta apresentada é semelhante a outra que já está tramitando, a Mesa da Câmara determina que a mais recente seja apensada à mais antiga. Se um dos projetos já tiver sido aprovado pelo Senado, este encabeça a lista, tendo prioridade.
O professor de Direito constitucional Adriano Pilatti, da PUC-Rio, concorda com a necessidade de redução do excesso de recursos, mas não vê relação alguma com a decisão do STF de acolher os embargos infringentes dos mensaleiros:
— Não é só no Direito brasileiro, mas é uma tradição da cultura jurídica do Ocidente, o direito do réu a ter o duplo grau de jurisdição. (O Globo)