Como os zumbis vão votar reformas
Vinicius Torres Freire – Folha de S.Paulo
NA PRAÇA DO mercado, apenas se quer saber do efeito da “lista de Fachin” na já prejudicada reforma da Previdência. Não vai se saber tão cedo.
Uma tese popular entre o povo do dinheiro grosso é que a desgraça política das lideranças do governo e de sua coalizão no Congresso deve rejuntar o governismo com a argamassa da promessa de recuperação econômica. Isto é, aprovada a reforma, diz a tese, aumenta a probabilidade de crescimento melhor em 2018.
Assim, seria atenuado o desgosto popular e diminuiria a taxa de renovação do Congresso. Cresce, pois, a chance de reeleição.
A tese é verossímil. Daí a dizer que o comando da coalizão parlamentar de Michel Temer seja capaz de adotá-la como estratégia são outros quinhentos. As lideranças estão ainda perdidas. De resto, muito deputado já não vê futuro político no governismo, mesmo com o PIB voltando a andar em 2018.
Não se trata de menosprezar o efeito que a visão real do precipício, os inquéritos, possa ter sobre o Congresso —talvez uma união dos desesperados. Mas é difícil dar chutes bem informados quando nem os envolvidos no rolo sabem o que fazer da vida. Além do mais, há complicadores.
Cerca de quatro quintos dos parlamentares não estão no bico do corvo da Lava Jato, da “lista de Fachin”, embora quase todas as lideranças governistas estejam. O parlamentar que escapou do rolo pode ter ideias diferentes a respeito do seu futuro político.
Por outro lado, o governo Temer trabalha para colocar ordem nas tropas. Libera nomeações, dinheiros, ameaça confiscar cargos. Insinua que vai fuzilar desertores.
Governo e coalizão atenuam a reforma em aspectos que mais afetam eleitores pobres do interior, o povo que passa na calçada do escritório do deputado do rincão, a maioria. É um peso no prato da balança pró-reforma, mas não é garantia de nada.
Não há dados bons e novos para saber o que o povo miúdo acha de reforma tão complicada e ameaçadora.
A primeira impressão foi péssima, ao menos pelo que se ouve de conversas aleatórias com o cidadão das ruas. Igrejas fazem campanha contra. Para o 28 de abril, estão marcadas greve geral e manifestações pela derrubada das reformas.
Entre os otimistas com o futuro da reforma circula também o argumento de que as consequências mais turbulentas da abertura de inquéritos em massa não seriam imediatas. Em parte, a tese se baseia na lentidão dos processos. Vide o mensalão.
Em parte, pode ser assim. O inquérito do mensalão chegou ao Supremo em julho de 2005. Virou denúncia em março de 2006. O processo mesmo foi do final de 2007 a agosto de 2010. Etc.
Mas durante o inquérito voa lixo. Quebras de sigilo, batidas da polícia, novas revelações, confissões, delações. Cabeças podem rolar pelo caminho.
Por fim, temos uma eleição presidencial daqui a um ano e meio, nesta desordem ou numa pior. Perderam-se medidas, padrões, capitais e referências políticos. Os líderes nacionais são quase todos zumbis, que causam entre medo e nojo.
Não se sabe como e em torno de quem vão se aglutinar os políticos. Sim, isso é assunto para a metade final do ano. Mas os parlamentares começam a pensar nisso, o que vai influenciar seus votos de agora.