MPF/MG obtém condenação de servidor da Funasa por improbidade
A Justiça Federal em São João del-Rei (MG) condenou Ronaldo Inez de Vasconcelos, servidor da Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), por improbidade administrativa. Ele teve os direitos políticos suspensos por cinco anos e foi proibido de contratar com o poder público e de receber benefícios ou incentivos fiscais e creditícios também pelo prazo de cinco anos. O réu ainda terá de pagar multa civil no valor de R$ 33.333,32 e devolver aos cofres públicos R$ 16.666,66, quantias a serem corrigidas desde 16/11/1998.
A sentença foi proferida em ação civil pública de improbidade administrativa proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) em 25 de fevereiro de 2011. Segundo a ação, os fatos ocorreram em 1998, quando o Município de Desterro do Melo, a 146 km de Belo Horizonte (MG), firmou convênio com a Funasa para a construção de módulos sanitários domiciliares [banheiros em residências de pessoas carentes].
Foi somente em 2005, mais de sete anos depois, que veio a se descobrir graves irregularidades na execução do convênio: as obras tinham sido executadas em desacordo com o estabelecido no plano de trabalho, com paredes tortas, ausência de reboco externo e interno em vários módulos, ausência de laje e substituição de materiais por outros de qualidade inferior. Das 55 unidades previstas, pouco mais de 20 tinham sido construídas, e, ainda assim, a maioria ficou sem uso. Uma das irregularidades mais graves foi a ausência de construção da fossa séptica e do sumidouro na maioria dos banheiros.
Como destacou a juíza federal na sentença, “O esquecimento desses itens é inadmissível, principalmente porque o esgoto foi encaminhado para os cursos de água próximos à residência dos beneficiados”. Ou seja, o que deveria contribuir para a redução do índice de esquistossomose e de doenças parasitárias, objetivo do convênio, acabou piorando as condições sanitárias da população.
Apesar disso, o servidor Ronaldo Inez, encarregado pela Funasa para acompanhar a execução do convênio e verificar a regularidade na aplicação dos recursos públicos, emitiu diversos laudos atestando falsamente que os objetivos e o objeto tinham sido 100% atendidos (inclusive afirmando que as melhorias sanitárias contemplavam tanque séptico e sumidouro), que os materiais e serviços atendiam ao especificado no projeto e que não havia quaisquer impropriedades.
Essas declarações acabaram resultando na aprovação da prestação de contas feita pelo município, o que, como acentuou a magistrada, “jamais teria acontecido se o requerido tivesse feito seu trabalho conforme o esperado”.
A conduta do servidor da Funasa, ao elaborar relatórios, fichas e pareceres técnicos que retratavam de forma inverídica a fiel execução do convênio, favoreceu não só que a situação continuasse acobertada por mais de sete anos, como impediu que os recursos públicos fossem devolvidos e a construtora obrigada a refazer todas as edificações. E, não fosse a auditoria por sorteio realizada pela CGU, teria acarretado também a impunidade definitiva dos envolvidos.
Para a magistrada, a execução fraudulenta do convênio, além do “prejuízo para várias famílias que tiveram suas condições sanitárias pioradas pelo advento da poluição dos cursos de água, redundou em desperdício de recursos públicos e, principalmente, favorecimento da impunidade por atos de corrupção. Tema que desperta a mais profunda revolta em todos os brasileiros cumpridores da lei”.
A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92) prevê a responsabilização do agente público quando praticar atos que importem prejuízo ao erário ou lesão aos princípios da administração pública. No caso, o preenchimento dos relatórios de vistoria em desconformidade com a realidade dos fatos configura ato de improbidade, porque além de contrariar a lei, causou prejuízo aos cofres públicos, na medida em que influiu na aplicação irregular de verba pública.
Além disso, a conduta omissiva e culposa do réu também permitiu o enriquecimento ilícito da empresa Eclipse Construção Ltda. A sentença registra que a construtora “recebeu pelos serviços antes mesmo de iniciar as obras. E, segundo os depoimentos das testemunhas, ela nunca prestou os serviços, tendo eles sido executados com os recursos materiais e pessoais do município de Desterro do Melo”, o que resultou na incorporação ao patrimônio da empresa da quantia de 50 mil reais, sem a devida contraprestação.
O MPF ressaltou, na ação, que “quatro meses antes de começadas as obras para construção dos módulos sanitários, a contratada obtivera o total dos recursos federais inerentes à contratação, ilicitude que revelava o manifesto ânimo dos envolvidos em promover o desvio dos recursos públicos para fins outros que não a execução da avença estabelecida”.
Prescrição – O ex-prefeito Mário Celso de Araújo Tafuri, a empresa Eclipse Construtora Ltda e seu proprietário Edson Dutra Pereira, em razão das irregularidades apuradas na execução do Convênio 699/1998, não ficarão sujeitos às sanções previstas na Lei de Improbidade porque, quando do conhecimento dos fatos, já havia ocorrido prescrição.
A prescrição, contudo, não alcança a obrigação de ressarcimento ao erário. Por isso, o MPF ajuizou a Ação Civil Pública nº 724-54.2011.4.01.3815, por meio da qual pede que esses réus sejam condenados a devolver aos cofres públicos os valores desviados da Funasa.
No caso do servidor público federal, a prescrição não ocorreu, porque sua conduta está sujeita à aplicação conjugada de três dispositivos legais diferentes: da Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), da Lei 8.112/90 (Estatuto do Servidor Público) e do Código Penal (já que a inserção de informações falsas nos relatórios configura, em tese, o crime de falsidade ideológica do artigo 299).
A sentença é de primeira instância, estando, portanto, sujeita a recurso.