Banco do Brasil cobrará na Justiça verba desviada por mensaleiros
Depois das primeiras prisões de condenados do mensalão, começam as movimentações para tentar reaver o dinheiro público desviado no esquema. Enquanto a Advocacia Geral da União (AGU) estuda formas de cobrar R$ 536 mil desviados da Câmara, o Banco do Brasil dá os primeiros passos atrás dos recursos que abasteceram o chamado valerioduto. Segundo o Supremo Tribunal Federal (STF), R$ 73,8 milhões da cota do BB no fundo Visanet foram repassados ao operador do mensalão, Marcos Valério, e utilizados para pagar propina a deputados aliados do governo Lula, entre 2003 e 2005.
Na última quinta-feira, três dias após O GLOBO perguntar se o BB iria cobrar a devolução dos recursos, os advogados do Banco do Brasil foram ao STF e pediram vista de toda a ação penal 470. O acórdão da Corte diz que ficou comprovada a transferência de “vultosos” recursos da cota do BB no fundo Visanet para o núcleo publicitário do esquema. O fundo é utilizado por bancos que operam com a bandeira do cartão de crédito Visa. O STF entendeu que a parte que cabia ao BB foi desviada para Valério.
A cobrança do valor desviado pela direção do BB é tema delicado para o PT, partido que está no comando do Executivo federal e, ao mesmo tempo, contesta as conclusões do STF sobre o mensalão.
Pizzolato recebeu R$ 326 mil de Valério
Para os ministros, houve pagamento por serviços não prestados. Ordens de transferência de recursos foram assinadas por Henrique Pizzolato, ex-diretor de Marketing do BB, que teria recebido propina em troca. Ele teria antecipado R$ 73,8 milhões do fundo Visanet para a agência de publicidade DNA, de Valério. Pizzolato, segundo o STF, recebeu R$ 326 mil do operador do mensalão. O Supremo ainda o considerou conivente com a apropriação indevida de R$ 2,9 milhões pela agência, referentes ao chamado bônus de volume, um benefício que as empresas de comunicação pagam à agências de publicidade.
Por tudo isso, Pizzolato poderá ser o principal alvo dos advogados do BB. O ex-diretor teve os bens bloqueados e está foragido da Justiça. Ele fugiu para a Itália para escapar da pena de 12 anos e sete meses de prisão em regime fechado, mas possui no Brasil imóveis que podem cobrir uma pequena parte do desvio. Antes de o BB pôr as mãos nesses bens, os apartamentos devem cobrir as multas estipuladas pelo STF, pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e peculato, estimadas em cerca de R$ 2,2 milhões.
Na análise de Marthius Sávio Lobato, ex-advogado de Pizzolato, o BB terá de cobrar o dinheiro não apenas do ex-diretor, mas de todas as pessoas que autorizaram os procedimentos em pareceres jurídicos da instituição, anexados ao processo. Ou seja, a execução não seria apenas contra o fugitivo, mas teria de envolver todos os que ocupavam altos cargos na época, como presidente, vice-presidente de varejo, diretor jurídico e consultores. Além dos executivos do BB, para o advogado, também teria de ser executado o funcionário da Visanet que autorizava as transferências.
— Se o banco for cobrar, vai ter de responsabilizar todos aqueles que fizeram documentos que legitimavam os pagamentos — afirmou Lobato. — Pizzolato pode chamar todos para serem responsabilizados.
BB prevê que processo vai demorar
A análise do BB é que a instituição não deve conseguir receber todo o valor de volta, e que o processo se prolongará durante anos, por causa dos recursos que condenados podem usar para atrasar a tramitação da cobrança. O BB não quer fazer alarde sobre o assunto porque considera que isso poderia prolongar o desgaste sofrido pela instituição ao longo do escândalo do mensalão.
Se cabe ao BB cobrar o valor desviado do fundo Visanet, é a Advocacia Geral da União que deve cuidar da cobrança dos recursos que saíram irregularmente dos cofres da Câmara dos Deputados para também abastecer empresas de Marcos Valério. E a AGU também já estuda como vai cobrar esse dinheiro.
O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha foi acusado de desviar R$ 536 mil. Nesse caso, o advogado-geral da União, Luís Adams, tem duas opções na mesa: acionar o Tribunal de Contas da União (TCU) para que seja instaurado um processo e formalizado o valor a ser cobrado; ou abrir um processo judicial de cobrança na Justiça Federal.
Com a primeira opção seria possível emitir um título de cobrança. Adams estaria mais inclinado a acionar o TCU, que já tem experiência na definição de valores desviados — isso poderia acelerar o processo.
Apesar de a ação contra João Paulo Cunha ainda não estar encerrada no STF, Adams já pode iniciar o processo no TCU sem precisar esperar o resultado do julgamento dos embargos infringentes apresentados pela defesa do deputado e que só devem ser julgados em 2014.
Petistas evitam comentar o assunto
No julgamento encerrado no fim do ano passado no STF, João Paulo foi acusado de receber R$ 50 mil de Marcos Valério e seus sócios para facilitar a vitória da SMP&B numa licitação para contratar a agência de publicidade da Câmara. A empresa de Valério teria terceirizado 99,9% do valor do contrato.
Procurado pelo GLOBO, o presidente do PT, Rui Falcão, informou, por meio de sua assessoria, que não se pronunciaria sobre o assunto. Outros petistas seguiram a mesma linha:
— Não é um assunto do qual estou por dentro. Não posso ajudar — desculpou-se o senador Jorge Viana (PT-AC).
— Não tenho acordo com essa suposição (de que o mensalão existiu) e não cabe a mim comentar — cortou o deputado Ricardo Berzoini (PT-SP).
A imediata cobrança dos prejuízos aos cofres públicos divide opiniões em outros partidos. Para o presidente do DEM, José Agripino Maia (RN), é preciso esperar o fim do processo no STF para entrar com novas ações a fim de evitar estragos no período pré-eleitoral.
— Se começarmos a pensar nisso agora, o processo de vitimização do PT vai para a estratosfera — previu. — Cada coisa a seu tempo.
No entanto, Agripino garante que, se as instituições não entrarem com ações de cobrança após o fim do julgamento, o DEM provocará o Ministério Público para que encaminhe o processo. Já o senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) defende que a discussão da cobrança de valores desviados no mensalão não seja politizada em nenhum momento.
— Temos de despolitizar essa questão; politizar enfraquece as instituições. Temos apenas de cumprir decisões judiciais — frisou.
— Dificilmente haverá uma recuperação satisfatória, como no caso do TRT de São Paulo — afirmou o senador Álvaro Dias (PSDB). — No caso do mensalão, acho mais complicado porque os recursos (desviados) foram pulverizados.
Fonte: O Globo