Recursos para demarcação de terras indígenas demoram a sair do papel

Mesmo sob protestos, a Câmara dos Deputados conseguiu instalar na última semana a Comissão Especial que analisará a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que transfere para o Congresso a decisão sobre demarcações de terras indígenas. A demarcação no Brasil é contestada por políticos ligados ao setor de produção agropecuária, que defendem que o processo não é transparente e não há direito de defesa dos produtores que estão no local e têm de ser removidos.

Atualmente, esses procedimentos são executados pelo Poder Executivo, em decisões dos ministérios da Justiça e do Meio Ambiente. A Fundação Nacional do Índio (Funai), entidade vinculada ao Ministério da Justiça, é responsável pela transferência de recursos para a ação “Fiscalização e Demarcação de Terras Indígenas, Localização e Proteção de Índios Isolados e de Recente Contato”. A iniciativa, que visa promover a proteção das terras indígenas através da demarcação e regularização fundiária, só recebeu 17%, ou R$ 15 milhões, dos R$ 87,8 milhões previstos no orçamento de 2013.

Os recursos destinados à ação são aplicados para evitar que as terras indígenas sejam ou permaneçam invadidas por terceiros, assegurando aos índios a integridade do território e do patrimônio natural. Comprovada a presença de invasores nessas áreas, a ação prevê proceder à extrusão e penalização dos responsáveis.

Para 2013, a ação de demarcação de terras indígenas foi aglutinada com outras iniciativas. Dessa forma, os recursos também servem para localizar geograficamente índios isolados, assegurando o direito a ocupação tradicional de seus territórios de forma a exercer gestão ambiental e territorial em terras indígenas habitadas por índios isolados.

Entre 2001 e 2006, os recursos destinados a essa atividade faziam parte da ação “Regularização Fundiária de Terras Indígenas”. De 2007 a 2011, o nome da iniciativa foi modificado para “Demarcação e Regularização de Terras Indígenas”. Em 2012, a ação passou a ser denominada “Delimitação, Demarcação e Regularização de Terras Indígenas”.

No período de 2001 a 2012, R$ 203 milhões foram desembolsados para ações de delimitação, remarcação e regularização de terras indígenas por parte do governo. O montante equivale a 68,8% do total de R$ 295 milhões autorizados, considerando os valores correntes em cada ano.

O Contas Abertas entrou em contato com a Funai e com o Ministério da Justiça,mas não obteve resposta até a publicação da matéria.

Polêmica

Os deputados da bancada ruralista e produtores rurais são unânimes em apoiar a proposta de emenda à Constituição que submete ao Congresso Nacional a decisão sobre a demarcação de terras indígenas (PEC 215/00).

Para a presidente da Confederação Nacional de Agricultura, senadora Kátia Abreu (PMDB/TO), o Congresso é o fórum mais adequado para decidir sobre as demarcações, já que vão ser ouvidos “todos os lados”, incluindo especialistas em produção agropecuária e especialistas em questões indígenas, por exemplo. Ela criticou a Funai, a Fundação Nacional do Índio, que hoje decide sobre as demarcações, que, na visão dela, só estaria olhando um lado.

A senadora destacou que a demarcação de terras indígenas aumentou 588% no País desde a Constituição de 1988. Segundo Kátia, as demarcações entram nas áreas produtivas. “Estão expropriando terra na marra, obrigando e fazendo com que terras que não são de índios se transformem em terras indígenas, deixando os produtores com uma mão na frente, outra atrás, sem nenhuma indenização, porque a lei não permite, e trazendo toda uma diminuição da produção brasileira. Quanto menos produção de alimento, mais caro o alimento fica”, aponta.

Para o deputado Valdir Colatto (PMDB/SC), a Constituição está sendo interpretada erroneamente no caso da demarcação de terras indígenas. “A demarcação foi regulamentada pelo Decreto-lei 1.775/96, e não por um projeto de lei complementar”, destacou.

“Isso permite às pessoas se autodeclararem indígenas e, assim, irem atrás de terras”, completou. “Se a Constituição não está clara, vamos mudar a Constituição e deixar claro o que é terra indígena e o que não é”, afirmou. Para ele, só deve ser considerada terra indígena aquela onde havia índios em 1988, quando a Constituição foi promulgada.

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse que o governo considera a proposta inconstitucional. “A Câmara é soberana e decidirá sobre isso. A posição do governo é muito clara, contrária à PEC 215. Defendemos o aperfeiçoamento dos processos de demarcação, mas não achamos que essa PEC soluciona o problema. Ao contrário, nos parece que ela ainda agrava mais a situação do país.”

Fonte: Contas Abertas

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