O Papiro de 3 mil anos que teria descrito um caso de assédio sexual no Egito antigo

Em um longo documento, repercutido em 2018, um homem importante do período foi acusado de agressão sexual e diversos outros crimes, contudo, a análise intrigou pesquisadores

Isabela Barreiros
O Papiro Salt 124
O Papiro Salt 124 – Divulgação/The British Museum

No século 19, o pesquisador inglês Henry Salt foi responsável por uma descoberta impressionante, ao comprar um papiro egípcio muito antigo perto da cidade de Tebas. Na época, porém, ninguém sabia da importância do item, que demorou a ser traduzido para outras línguas e estudado de fato.

O egiptólogo tcheco Jaroslav Černý publicou a tradução do conteúdo do papiro para o inglês apenas em 1929, e o interesse dos especialistas da área começou a crescer exponencialmente. Graças a inúmeras análises realizadas ao longo desses anos, foi possível perceber que o texto pode narrar uma denúncia de assédio.

Como noticiou a revista Galileu em 2018, com informações do portal IFLScience, a escritura, que ficou conhecida como Papiro Salt 124, narra uma acusação contra um homem que viveu em por volta de  1244 a.C, na vila de Deir el-Medina. Indivíduo poderoso, pesquisadores acreditam que ele tenha sido o chefe dos artesãos que trabalhavam na cidade, construindo túmulos para a realeza egípcia.

A queixa estava relacionada a diversos crimes supostamente cometidos pelo artesão, que teria cometido suborno com o objetivo de subir de cargo, atos de violência, furto aos túmulos feitos pelos trabalhadores, adultério e, inclusive, assédio sexual a uma mulher. Como escreveu o IFLScience, ele “pode ser apenas a primeira documentação do mundo de um homem poderoso sendo despedido por agressão sexual.”

Quem acusou o homem, chamado Paneb, assinou o documento. O indivíduo era Amennakht, um dos trabalhadores da região, que era filho de um ex-chefe da vila, a posição de poder ocupada pelo próprio Paneb na época das acusações. O objetivo do autor era afirmar que o comportamento dele “é de fato indigno do cargo” de chefe de trabalho.

O papiro foi enviado ao Museu Britânico, em Londres, na Inglaterra, logo quando foi descoberto por Henry Salt e permaneceu na instituição desde então, onde é analisado constantemente. Embora o documento tenha sido investigado por muitos anos, a questão do assédio sexual foi levantado mais recentemente pelo historiador Carly Silver no Narratively.

O documento em questão narra como funcionava a justiça no Egito Antigo, há mais de 3 mil anos, com a queixa apresentada por Amennakht  ao faraó egípcio, a maior autoridade na época. Composto por um longo texto, ele é escrito em três folhas coladas e mede 38 por 62 centímetros.

O que seria o assédio

Crédito: Divulgação/The British Museum

Uma das traduções do papiro mostra que Amennakht  escreveu: “Paneb depravou a cidadã Tuy, quando ela era a esposa do trabalhador Kenna, ele assediou a cidadã Hunro, quando ela estava com Pendua, ele corrompeu a cidadã Hunro, quando ela estava com Hesysenebef; como informou seu filho”.

O documento também aponta, segundo o historiador Carly Silver, que o homem tirou as roupas de uma mulher, que levava o nome de Yeyemwaw, a pressionou contra a parede e abusou dela. Essa era apenas uma entre as diversas acusações contra Paneb.

Como apontou a Galileu, é difícil assumir o significado das palavras no Egito Antigo apenas a partir de traduções. Não é possível afirmar o que, de fato, significava o termo “corromper” ou “depravar”, do inglês “debauch”. Mas muitos pesquisadores ainda acreditam que se tratava de assédio sexual, embora a questão ainda esteja incerta.

Outra questão também é a da cultura do Egito Antigo. É possível que o crime de Paneb tenha sido se relacionar sexualmente com mulheres não casadas, por exemplo, em uma ofensa contra os costumes. Isso não estaria relacionado ao fato de ele ter abusado de uma mulher, levando em consideração se a relação era consensual ou não.

Não se sabe de fato o que aconteceu com cada uma das pessoas descritas no papiro ou envolvidas com o caso de maneira próxima. Pesquisadores acreditam que o chefe do trabalho possa ter perdido seu cargo e até mesmo condenado à pena de morte. Quanto às vítimas, nada se sabe.

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