‘Sempre fui mediano em literatura’: americano ajuda a decifrar carta ‘criptografada’ há 150 anos pelo escritor Charles Dickens
Jennifer Harby
Mais de mil voluntários de todo o mundo uniram forças para tentar desvendar o conteúdo de uma carta escrita em código pelo romancista inglês Charles Dickens há mais de um século e meio.
Um dos mais célebres escritores britânicos, autor de clássicos como David Copperfield, Grandes Esperanças e Oliver Twist, Dickens dominava a taquigrafia – o exercício de escrever por meio de símbolos – e deixou uma série de manuscritos em linguagem cifrada.
Um deles foi a Carta de Tavistock, incluída no projeto The Dickens Code, iniciativa liderada pela pesquisadora da Universidade de Leicester Claire Wood que busca desvendar as mensagens por trás dos escritos misteriosos de Dickens.
A equipe ofereceu uma recompensa de 300 libras (aproximadamente R$ 2,1 mil) a quem decifrasse o maior número de símbolos.
Quem levou o prêmio foi o americano Shane Baggs, que mora na cidade de San Jose, no Estado da Califórnia.
“Sempre tirei nota C [desempenho mediano] em literatura. Nunca imaginei que alguma coisa que eu fizesse fosse interessar a estudiosos da obra do Dickens”, diz ele, que conta ter aprimorado suas habilidades de decodificação em grupos na rede social Reddit.
“Tem sido uma honra trabalhar com o professor Hugo Bowles [da Universidade de Foggia, na Itália, que também colabora no projeto] e com a Dra. Claire Wood, estou feliz por ter podido contribuir.”
O que diz a carta
A Carta de Tavistock permaneceu indecifrada por mais de 150 anos, segundo Wood. Ela foi escrita na linguagem de símbolos desenvolvida por Dickens, um sistema complexo que ele mesmo chamava de “the devil’s handwriting” (“a letra do diabo”, em tradução livre).
Bowles explica que as diferentes interpretações foram usadas em conjunto para que se pudesse finalmente “ler” a mensagem: um apelo de Dickens para que alguém interviesse sobre um anúncio recusado.
“Um de nossos solucionadores encontrou as palavras ‘Dia da Ascensão’, o que nos ajudou a identificar a data da carta”, relata.
“Quando outros solucionadores encontraram as palavras ‘anúncio’, ‘recusado’ e ‘enviado de volta’, sabíamos que ele estava escrevendo sobre um anúncio dele que havia sido rejeitado.”
Os pesquisadores encontraram a provável resposta à carta de Dickens em um museu de Nova York. Ela foi escrita em 1859 por Mowbray Morris, gerente do jornal britânico The Times à época, pedindo desculpas pela grosseria de um funcionário que havia rejeitado um anúncio sobre um novo periódico.
“O trabalho dos decodificadores de Dickens ajuda a jogar luz sobre esse período conturbado da vida de Dickens”, ressalta Wood, que é professora de literatura da era vitoriana.
“Na carta temos uma visão de relance do Dickens empresário, usando seus contatos pessoais para tentar promover seus interesses e argumentando de forma contundente para defender seu ponto de vista.”