Ex-chefe de documentação do Planalto diz que Mauro Cid perguntava sobre presentes: ‘pode vender?’

“Ele me ligava sempre: ‘Marcelo, o presidente recebeu isso’. E um detalhe interessante é que ele já emitia um juízo de valor: ‘Isso é personalíssimo’’, relatou Marcelo Vieira

Mauro Cid (à esq.), Jair Bolsonaro e joias dadas ao Brasil
Mauro Cid (à esq.), Jair Bolsonaro e joias dadas ao Brasil (Foto: Marcos Corrêa/PR | Reprodução | Reuters)

Marcelo Vieira, ex-chefe do Gabinete Adjunto de Documentação Histórica (GADH) do Palácio do Planalto, afirmou que o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), o consultou para saber como proceder no caso da venda de itens recebidos pelo então mandatário. A declaração de Vieira foi feita em entrevista à revista Veja.

“O Cid me ligou no dia 27 de dezembro, num contato de não mais que um minuto. ‘Marcelo, tem um ofício de um presente para o presidente que está retido na Receita e eu preciso que você assine para liberar’. Eu falei: ‘manda pelo WhatsApp que vou dar uma olhada’. Logo no primeiro parágrafo vi que estava escrito que o presente era para o Estado. Expliquei que não poderia assinar. Aí o Cid disse: ‘Marcelo, então explique para o chefe’. Aí eu passo essas informações ao presidente, que só falou ‘O.k., obrigado’ e desligou”, disse Vieira à reportagem.

Ainda segundo o ex-chefe do GADH, os contatos de Cid sobre o assunto eram frequentes. “Ele me ligava sempre: ‘Marcelo, o presidente recebeu isso’. E um detalhe interessante é que ele já emitia um juízo de valor: ‘Isso é personalíssimo’. Eu falava assim: ‘Cid, pelo amor de Deus, isso não é personalíssimo’. E eu repetia até o último dia que era personalíssimo só o que era dado por chefe de Estado. Todas as conversas que eu tive com o Cid foram relacionadas a presentes que o presidente recebeu”, afirmou.

Na entrevista, Vieira ressaltou que o então ajudante de ordens de Bolsonaro jamais o informou formalmente sobre a intenção de vender os itens de alto valor recebidos pelo então mandatário ao longo do mandato.

“Formalmente, não. Uma ligação para tirar uma dúvida não é uma comunicação. Cid me ligava e perguntava: ‘Pode vender?’. Eu respondia: ‘Pode, desde que obedeça à lei’. Em caso de venda, a União tem direito de preferência. Os presentes não podem ser alienados para o exterior sem manifestação expressa da União. O gabinete não emite juízo de valor. A gente só responde aquilo que nos perguntam de acordo com a legislação”, assegurou.

A Polícia Federal (PF) investiga um esquema de desvio e venda ilegal de presentes recebidos pela gestão Jair Bolsonaro em viagens ao exterior. Vieira é um dos investigados. A investigação também apura se o dinheiro obtido pela venda de joias ia para contas de Bolsonaro ou da ex-primeira-dama Michelle.

Na quinta-feira (31), Jair e Michelle Bolsonaro, Frederick Wassef, advogado ligado ao clã Bolsonaro, o ex-ajudante de ordens, o tenente-coronel Mauro Cid, o general Mauro Lourena Cid, pai do ex-ajudante de ordens, além de Marcelo Câmara e Osmar Crivelatti, outros dois militares que integravam a Ajudância de Ordens, e o ex-secretário de Comunicação Fábio Wajngarten, prestaram depoimento à PF no âmbito do inquérito que apura o escândalo das joias.

Na ocasião, apenas Mauro Cid e o pai forneceram as informações solicitadas pelos investigadores. Todos os demais depoentes exerceram o direito ao silêncio e não responderam aos questionamentos feitos durante a oitiva.

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