E foi por um triz que um dos maiores traficantes da Bahia não pôs os pés fora da Colônia Penal Lafayete Coutinho (CPLC), em Salvador. Um dos fundadores do extinto Comando da Paz (CP), que hoje faz parte do Comando Vermelho (CV), Cláudio Eduardo Campanha da Silva poderia ter deixado a prisão, após justiça conceder a liberdade condicional. Acontece que, só dois dias depois que o juiz soube que haveria um Procedimento Administrativo Disciplinar contra o traficante e então suspendeu temporariamente a saída.
A decisão atual foi dada no dia 12 deste mês (quinta-feira), pela 1ª Vara de Execuções Penais de Salvador. “Ocorre que este magistrado teve conhecimento – informação extra-autos pendente de comprovação – que o penitente Cláudio Eduardo Campanha da Silva foi, recentemente, envolvido em um Procedimento Administrativo Disciplinar no qual está sendo, no âmbito da CPLC, apurada um possível cometimento de falta grave”, diz o juiz Almir Pereira de Jesus, que assinou o documento, ao qual o CORREIO teve acesso com exclusividade.
Por precaução, o juiz impediu a saída de Campanha até que se tenha, primeiro, a comprovação da ocorrência de falta disciplinar grave, depois, que se tenha, na conclusão do PAD, “a imputação da autoria para que sejam, enfim, definitivamente cancelados”. “Em face do quanto exposto, suspendo, provisória e cautelarmente, o livramento condicional, a autorização para mudança de domicílio e alvará de soltura no ID 272.1 até que seja a situação do penitente Cláudio Eduardo Campanha da Silva definitivamente esclarecida no procedimento administrativo dito instaurado no âmbito da CPLC”, justifica o juiz.
Campanha assumiu a liderança da então CP em 2005, quando seu principla fundador, Eberson Souza Santos, o Pitty, morreu em confronto com a polícia, na cidade de Candeias. No tempo em que permaneceu no Presídio Salvador, o traficante coordenou pessoalmente o comércio de drogas e ordenou uma série de ataques a ônibus e a módulos policiais, chacinas e assaltos, com apoio, na ocasião, do Primeiro Comando da Capital (PCC). Em 2008, ele foi preso no Ceará e um ano depois foi transferido para o Presídio Federal de Campo Grande, Mato Grosso do Sul. e, posteriormente, para a Penitenciária Federal de Catanduvas, unidade de segurança máxima, criadas para abrigar chefões do crime organizado.
Tempos depois, ele volta ao Complexo Penitenciário da Mata Escura, onde passa um período na Unidade Especial Disciplinar (UED). Em 2020, Campanha passa a cumprir em regime semiaberto na CPLC, no bairro de Castelo Branco – coincidência ou não, no mesmo ano o CP deixa de existir e para fazer parte do Comando Vermelho (CV), acirrando a guerra do tráfico de drogas em Salvador e Região Metropolitana (RMS).
Decisão que mantém prisão foi dada dois dias após autorizada soltura de traficante. Crédito: Divulgação
Quase saiu
A saída de Campanha já era dada como certa, através da primeira decisão do juiz Almir Pereira de Juiz, no dia 10 (terça-feira), apesar de o Ministério Público do Estado (MP-BA) ter opinado pelo indeferimento do benefício do livramento condicional – o pedido feito pelo próprio traficante, “alegando possuir os requisitos elencados no artigo 83 do Código Penal, bem como a sua transferência para Comarca de Jaboatão dos Guararapes/PE”.
O documento, que o CORREIO também teve acesso, diz que as penas unificadas de Campanha totalizam 47 anos, dois meses e sete dias de reclusão – o traficante está preso desde de 23 de julho do ano de 1997 e por tráfico de drogas, homicídio, roubo e outros crimes.
Segundo o juiz, o traficante cumpriu mais de 59% das sentenças. “Assim sendo, em análise ao cálculo de pena ora juntado e computando-se o tempo de pena já cumprido, o penitente tem, efetivamente, já cumprido lapso mais que suficiente para obtenção do livramento condicional, conforme o disposto no Art. 83, incisos I, III e V, do Código Penal Brasileiro”, justifica juiz, antes de voltar atrás.
O artigo 131 da Lei de execução Penal prevê a possibilidade de concessão do livramento condicional. Este tipo de benefício constitui uma etapa da pena, que visa preparar o condenado para usar sua liberdade definitiva, ou seja, uma fase necessária do sistema de execução, pelo qual a readaptação do condenado à vida livre se desenvolve progressivamente, mediante a observação direta e constante do Estado.
Tarde demais
Ednaldo Freire Ferreira, o “Dadá”, um dos fundadores da facção Bonde do Maluco (BDM), está sendo procurado pela Justiça da Bahia após ter sido liberado pelo Plantão Judiciário do Tribunal de Justiça, no dia 1º de outubro (domingo, às 20h42), para cumprir prisão domiciliar, durante o plantão do desembargador Luiz Fernando Lima. A decisão chegou a ser revogada pelo desembargador Julio Travessa, da 2ª Câmara Crime 1ª Turma, mas ele não foi mais encontrado e é considerado foragido.
Em março deste ano, “Dadá” foi um dos criminosos alvo da “Operação Tarja Preta” para desarticular a facção responsável por crimes como homicídios, tráfico de drogas, tráfico de armas de fogo e lavagem de dinheiro em Salvador. Ele nasceu em Irecê e e sua ascensão no mundo do tráfico se deu com a morte de José Francisco Lume, o Zé de Lessa, ocorrida em 2019.
A decisão tomada pelo Plantão Judiciário a favor de “Dadá” foi com base ao pedido da defesa, que alegava que o filho autista dele tem “crise de convulsão em razão da desregulação emocional causa pela ausência da figura paterna”. O argumento do transtorno da criança foi usado em favor de “Dadá” em outro momento, levando-o à prisão domiciliar. Na ocasião, ele não cumpriu as condições e foi preso no dia 5 de setembro deste ano, com uma habilitação falsa, em um carro avaliado em R$ 400 mil, na cidade de Sertânia (PE).