STF ‘estica a corda’, e Congresso vai reagir contra ele, afirma líder da bancada do agro

 

Presidente da maior bancada do Congresso, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), o deputado federal Pedro Lupion (PP-PR) afirmou que, quanto mais o Supremo Tribunal Federal (STF) “estica a corda”, mais avança a tese propagada no Legislativo para conter o poder dos ministros da Corte. “Ao que me parece eles estão dobrando a aposta”, disse o parlamentar, em entrevista exclusiva ao jornal O Estado de São Paulo.

Lupion afirmou que o início deste ano já tem sido “atribulado” com as recentes decisões do STF. Ele cita, como exemplo, a autorização de busca e apreensão no gabinete do líder da oposição na Câmara, Carlos Jordy (PL-RJ), e nos endereços ligados ao ex-diretor da Abin, deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ).

“Vai haver provavelmente, imagino que deve haver algum posicionamento ou alguma reação do presidente (do Senado, Rodrigo) Pacheco e do presidente (da Câmara) Arthur Lira em relação a isso, mas obviamente que isso acirra os ânimos e incentiva avançar (no Congresso) com essas pautas de limitação aí dessas atitudes”, avaliou o deputado.

O parlamentar disse que, até o ano passado, não via disposição do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), em apoiar propostas que confrontassem o poder dos ministros da Corte. “Pode ser que com essas atitudes do Supremo (este ano), isso tenha mudado”, ponderou. Lupion avalia que, diante da relação ruim entre os Poderes, em algum momento Lira terá que se posicionar sobre o assunto. Sem o apoio do alagoano, dificilmente a agenda avança na Casa, disse.

No ano passado, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), defendeu o avanço da Proposta de Emenda à Constituição (PEC), aprovada na Casa, que limita decisões monocráticas de ministros do STF. O movimento foi visto com um aceno à oposição, orquestrado com o senador Davi Alcolumbre (União-AP), que trabalha para sucedê-lo no comando da Casa. Segundo Lupion, essa agenda também pode ser determinante na disputa pela sucessão de Lira.

Abaixo, leia os principais trechos da entrevista:

Vimos no ano passado, especialmente no Senado, o avanço na discussão sobre contenção de poder do STF, com a aprovação da PEC que limita decisões individuais de ministros. Também existe a discussão em torno da PEC que estabelece mandatos aos magistrados. Essa agenda pode avançar este ano na Câmara?

Eu acho que quanto mais eles esticam a corda, mais essa tese avança. Nós estamos tendo um começo de ano bem atribulado. Teve operação contra o deputado (Carlos) Jordy, hoje (quinta-feira, 25) operação contra o (Alexandre) Ramagem. Ao que me parece eles estão dobrando a aposta. Vai haver provavelmente, imagino que deve haver algum posicionamento ou alguma reação do presidente (do Senado, Rodrigo) Pacheco e do presidente (da Câmara) Arthur Lira em relação a isso, mas obviamente que isso acirra os ânimos e incentiva avançar com essas pautas de limitação aí dessas atitudes.

E como a FPA vai se posicionar?

A gente tem sempre defendido que essa interferência excessiva do Judiciário no Legislativo é muito negativa e a gente vai continuar com essa tese, dizendo que a gente precisa defender o artigo 49 da Constituição que fala que cabe ao Congresso Nacional zelar por suas atribuições. E é isso que a gente tem feito. Chegamos ao ponto no ano passado que eram tantos os ataques ao Poder Legislativo e a interferência no Poder Legislativo que acabamos convergindo diversas frentes em atuar unidas em relação a isso. E esse grupo está unido. São mais de 20 tantas frentes parlamentares prezando pelo Poder Legislativo e vamos continuar nisso.

Vocês vão defender alguma proposta em específico?

Eu, particularmente, como deputado e não como FPA, sou favorável à PEC 8 (aprovada no Senado, que limita decisões monocráticas), eu sou favorável à limitação de Poderes, sou favorável a impedir decisões monocráticas. Óbvio que eu não posso ser irresponsável em falar por toda a bancada. Mas existem situações como essa decisão monocrática do Fachin em relação às demarcações (em Guaíra, no Paraná) que se a gente tivesse já avançado com esse projeto não teria acontecido. Então tem pontos convergentes que a gente pode acabar trabalhando.

O senhor vê disposição do Lira em avançar nesta agenda que confronta o STF?

Eu não via até esse começo de ano pesado como está tendo. Pode ser que com essas atitudes do Supremo, isso tenha mudado.

O senhor já viu alguma sinalização de mudança?

Não, não falei com ele. O presidente Arthur tem sido bastante parceiro nas pautas do agro, ele sempre tem pautado nossos temas, cumprido o que combina conosco em relação ao calendário de votações. Agora existem pautas que aí é o presidente da Câmara, relação com outro Poder, coisa que não é especificamente sobre a temática do agro que a gente às vezes pode discordar, mas sempre com muito diálogo, com muita transparência. Então acho que ele tem essa capacidade. Eu chamo ele de primeiro-ministro, porque acho que ele está definindo as pautas do Brasil. Então a gente consegue ter essa capacidade de diálogo com ele para avançar nessas pautas importantes.

Haveria espaço na Casa para a proposta contra o STF avançar, mesmo sem o apoio do Lira?

Não. Ele tem que estar junto.

No Senado, nós vimos o Pacheco colaborando no avanço dessas pautas até como fortalecimento junto à oposição de olho na sucessão do seu cargo pelo comando da Casa. Isso pode acontecer na Câmara? Essa pauta pode ser determinante na disputa pela sucessão do Lira?

Pode, claro que pode.

Então Lira vai ter atuar mais firmemente?

Eu acho que sim. Em algum momento ele vai ter que falar. Eu tenho às vezes conversado com ele sobre isso, sobre essa questão do Jordy, nós conversamos um pouco, hoje (ontem) sobre o Ramagem não falei com ele, mas realmente hoje está uma relação muito ruim dos Poderes, ele vai ter que, em dado momento, se posicionar.

O que ele falou sobre o caso Jordy?

Ele falou que estava analisando o que tinha ocorrido, que precisa ter acesso aos autos, mas que iria se posicionar.

O presidente Lula disse nesta semana que vetou parcialmente o projeto do marco temporal das terras indígenas por uma “questão política” e que, com a derrubada do veto pelo Congresso Nacional, restará a decisão do STF sobre o tema. Foi um veto puramente para não desagradar a base, sem cálculo político?

Esse veto foi feito estritamente para jogar para a bolha deles, para torcida deles, para o grupo deles, para fazer com que efetivamente eles estivessem avaliação positiva com a bolha que apoia o governo. Então surpresa zero. É justamente o que a gente sempre dizia que ele tinha feito.

Na entrevista, Lula também disse que pediu ao ministro Paulo Teixeira uma “prateleira de propriedades improdutivas no País” para que não seja necessário discutir mais ocupações ou invasões de terra. É uma saída?

Eu vi essa fala, não entendi o objetivo. A gente entende que se quiser fazer reforma agrária, tem mais de 120 milhões de hectares que estão nas mãos do governo, e poderia fazer demarcação agrária com isso. O que a gente precisa é ter claro que sejam terras que sejam da União e não haja desapropriações.

Agora a grande dúvida é sobre qual tese passa a valer, já que de um lado temos a decisão do STF e do outro a derrubada do veto do marco temporal pelo Congresso. Podem avançar em alguma PEC que trata do tema?

Nós aprovamos a lei, a lei foi promulgada dia 3 de janeiro pelo (presidente do Senado) Rodrigo Pacheco, ela está vigente sem os vetos. A lei está valendo. Enquanto não houver um julgamento em relação ao cancelamento da lei no STF, ela continua vigente. O STF chegou a uma maioria de votos na tese do (ministro Dias) Toffoli sobre a indenização, mas ainda não publicou este acórdão. Então o que está valendo é o que está na lei. Nós vamos trabalhar nas PECs (Propostas de Emenda à Constituição) que já estamos trabalhando. O que não pode, o que nos causou muita estranheza foi a decisão do ministro (Edson) Fachin, monocrática, num período que ele assumiu interinamente a presidência, mandar, no caso de Guaíra, no Paraná, suspender as liminares vigentes lá que impediam a demarcação e mandar dar seguimento à demarcação sendo que o próprio entendimento do Supremo Tribunal Federal é da indenização prévia e a lei que nós aprovamos está vigente. Então realmente foi um excesso, um equívoco e sem dúvida, a gente tem que contestar isso. (Estamos) esperando voltar o recesso do Judiciário para poder contestar. (É) total uma insegurança jurídica e gera uma insegurança no campo muito grande. Isso motiva invasores, incentiva invasões, nosso povo está todo nervoso, está vendo suas terras serem invadidas e infelizmente o STF não contribui para a paz social no campo, pelo contrário.

E como o senhor avalia a estratégia do governo de obter decisões favoráveis via STF?

O governo (Lula) desde o começo decidiu governar com o STF e não com o Congresso. A partir do momento que o governo fica buscando através do Supremo inviabilizar leis e projetos aprovados no Congresso, veta pautas importantes, inclusive pautas de acordo de votação que os próprios parlamentares do PT participaram também, isso tudo buscando suplantar o Poder Legislativo. Infelizmente é aquela briga que nós tivemos já desde o ano passado de cada um estar no seu quadrado, cada um ter a sua função. Essas pautas todas que se referem ao comportamento da sociedade, a participação das pessoas, isso cabe aos que são diretamente eleitos pela população para representá-los, não é o STF que tem que tomar essas decisões. Então é extremamente lamentável e o governo obviamente que se aproveita disso.

A bancada ruralista conseguiu influenciar em vários projetos no ano passado, como na reforma tributária. O que esperar da agenda da FPA neste ano?

Nós temos as pautas prioritárias que a gente precisa avançar, dentro dessas pautas está uma grande preocupação nossa com os projetos de lei complementar em relação à reforma tributária, principalmente essa questão dos produtos da cesta básica, essa questão do imposto seletivo, tributação de produção, isso tudo que a gente vai ter que se organizar muito bem para não deixar prejudicar o nosso setor. Pesticidas nós tivemos uma vitória importante no Congresso e houve o veto, vamos ter que derrubar esses vetos. A questão do licenciamento ambiental está avançando, tem o (projeto de lei) do Combustível do Futuro. Lembrando que esse ano é ano complicado, porque tem eleições (municipais).

Há alguma pauta no radar da FPA este ano que possa trazer dificuldades e constrangimentos ao governo?

Existem projetos que nós estamos tramitando que tem às vezes posicionamento favorável, às vezes posicionamento contrário, mas a gente defende por exemplo que haja a reforma administrativa que o governo não está querendo. Tem que haver um controle de gastos, não é possível R$ 250 bilhões de déficit nas contas públicas, a gente precisa se posicionar também em relação a isso. E eu acho que essa questão agrária, fundiária, vai gerar bastante debate, essa questão de direito de propriedade que está muito tenso.

Na LDO, as bancadas ruralista, evangélica e da bala se uniram para aprovar um destaque que proibia o financiamento de ações da pauta de costumes defendida pela esquerda. Pela força e tamanho que cada bancada tem, é representativa essa junção em algumas pautas. Há convergência de agenda entre essas bancadas que poderá se opor a decisões do governo, por exemplo?

A gente quando tem convergência nas ideias e no objetivo final a gente não tem problema nenhum de se juntar, óbvio que tem que pensar que a grande maioria dos membros, eu por exemplo sou das três bancadas, então a maioria dos membros se confunde entre uma e outra. Onde a gente puder se juntar a gente vai se juntar. Não é uma questão de oposição, é uma questão de pauta temática que a gente precisa se organizar. A pauta do STF é uma pauta que nos une e dá bastante força.

Lula vetou o trecho da LDO que blindava os recursos destinados ao Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) de contingenciamentos. Como está a articulação da FPA?

Nós vamos trabalhar para derrubar o veto. Mas a gente está falando de um ano que a gente não teve seguro rural praticamente, foram só R$ 500 milhões, ainda tiveram mais alguns milhões para outros fins. O que nos foi prometido de mais R$ 1 bilhão não aconteceu. Vamos ter que arrumar esse dinheiro. Lembrando que nós estamos com uma previsão de safra horrível. Vamos ter uma quebra de safra grande, Mato Grosso está falando já em 40%. Isso nos preocupa bastante. Então a gente precisa ter acesso ao seguro, senão a coisa não vai funcionar. Mas ainda não houve diálogo com o governo. Voltando a Brasília nós vamos conversar sobre isso.

 

Giordanna Neves/Estadão

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