Ou seja, com as exceções que a própria lei determina, crianças e adolescentes terão de ficar longe das redes sociais, aplicativos e joguinhos virtuais durante o tempo em que estiverem em seus colégios – tanto na rede privada quanto na pública. Em uma fala entusiasmada, o presidente definiu a lei como um ato de coragem, cidadania e respeito ao futuro do País. “Eu, muitas vezes, imaginei que os deputados e as deputadas não iam ter coragem de aprovar esta lei, com medo da internet”, disse Lula na cerimônia.
Já adotado em alguns países e até aqui mesmo, em estados como São Paulo e Rio de Janeiro, o freio no uso dos celulares no ambiente escolar parece um caminho sem volta. “Esse é um debate mundial, amparado em vários estudos que mostram como aparelhos como celulares e outros eletrônicos interferem e prejudicam o processo de aprendizagem”, afirma o professor Manoel Calazans, assessor especial da Secretaria Estadual de Educação.
Nas escolas estaduais, diz, embora não tenha proibição, há a recomendação de que os celulares ou tablets só sejam usados com a mediação do professor. Vale ressaltar que alunos do segundo ano estão recebendo tablets, que ficam com eles, para usar como ferramenta de apoio ao ensino. Manuel explica que muitos professores utilizam a tecnologia nas disciplinas, para acessar conteúdos, fazer simulados e orientações pedagógicas. Com a nova lei, a primeira dúvida é essa, como será o planejamento desse uso?
Regulamentação
“A gente espera esclarecer os muitos pontos, mas sem dúvidas a família precisa estar próximo da escola e se responsabilizar também. É um amadurecimento coletivo”, reflete Calazans. Para ele, até o 5º ano, com as crianças menores, será tranquilo. O desafio maior é com os alunos do ensino médio, que usam redes sociais e o celular para fins variados. “Essa lei passa a existir pela necessidade dos educadores disputarem atenção dos estudantes com o celular, mas ao mesmo tempo não tem como excluir a tecnologia. Vamos ter que chegar nesse acordo”, reitera.
Diretor do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Estado da Bahia (Sinepe), o educador Mário Sérgio Aragão acredita que o maior entrave está na proibição do uso nos intervalos, recreios e aulas vagas. “Porque na sala de aula esse uso não é permitido, ainda que alguns professores sejam mais permissivos”, afirma.
Assim como as escolas públicas, as particulares aguardam a regulamentação do MEC, que tem prazo de 30 dias a partir da assinatura. E vão retornar às aulas a partir do dia 27 com as regras antigas. Já a rede pública volta no dia 10 de fevereiro.
Mário Sérgio atua na rede particular e na pública. Apesar das realidades completamente distintas, ele vê como uma preocupação comum a responsabilidade do controle recair sobre o docente. “O professor vai precisar de muito apoio das escolas e dos pais, pois é uma mudança de hábito que interfere muito no dia a dia, sobretudo dos jovens”, diz.
Se depender de Genival Santos dos Reis, pai de Lucas, 14, a escola terá apoio total para cumprir as novas determinações. Aguardando para matricular o adolescente no Colégio Estadual Vila Canária, Genival disse que ele não leva o celular para a escola. “Celular é útil para quem sabe usar. E ainda tem o perigo de roubo. Caso ele precise falar comigo é só pedir na direção da escola”, afirma Genival, que é pastor evangélico e enfrenta o mesmo problema na igreja. “Temos um aviso de que é proibido celular, mas as pessoas deixam o aparelho ligado e continuam usando”. Lucas diz concordar com o pai e garante que não sente falta do aparelho na escola.
Mãe de Ana Júlia, 12, a dona de casa Ana Cláudia Reis está preocupada em ficar muito tempo sem notícias da filha, que está mudando de escola, após a família morar no Paraná. “Tem toda uma questão de adaptação, então gostaria de saber que o celular está ligado na mochila”, fala Ana, acrescentando que, se tiver oportunidade, vai colocar seu ponto de vista para o colégio.
Estudantes em tempo integral no Colégio Vila Canária, Carlos Eduardo dos Santos, 17, Ana Beatriz dos Santos, 13, e Daniel de Aragão, 14, entendem as novas medidas, mas fazem ressalvas. Os três acham que “não faz sentido” a proibição do uso fora da sala de aula. “Sempre uso meu celular para fotografar o quadro e, nesse momento, com minha avó internada, quero ficar me comunicando com minha família”, pontua Carlos, que está indo para o último ano. Já Ana critica os colegas que “vivem postando stories dos colegas e professores”, mesmo sem permissão. E Daniel já lamenta se tiver de ficar sem jogar com os colegas no intervalo.
Sabendo dos “muitos desafios”, o professor de educação física Edmilson Lima tenta como pode tirar os alunos das telinhas e fazê-los se movimentar à moda antiga. “Propomos, por exemplo, jogos de tabuleiros e práticas esportivas variadas, mas não é fácil enfrentar o vício”, reconhece Edmilson.