Um quinto dos parlamentares não conseguiu liberar um tostão para seu reduto

Muitos pegam carona em projetos de colegas com força política e não são autores de matérias relevantes

Naira Trindade

Enquanto alguns são tratados como celebridade e sofrem com o assédio do público nos corredores da Câmara dos Deputados, outros passam despercebidos. Não fossem os broches na lapela do paletó, que os identificam como parlamentares, caminhariam tranquilos em meio à multidão de anônimos. Apesar dos cerca de 200 mil votos, em média, que conquistaram para assumir uma vaga no Congresso, um quinto dos parlamentares não tem quase nada a apresentar para os 202 milhões de habitantes do país. Não são autores de projetos relevantes e tampouco conseguem liberar um centavo sequer dos R$ 15 milhões a que têm direito em emendas ao Orçamento específicas para os estados de origem.
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A maioria das emendas estão voltadas para saneamento e obras estruturantes
Levantamento do Estado de Minas com base nos dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) e da Lei Orçamentária Anual (LOA) mostra que 103 congressistas, entre os 500 deputados e senadores que apresentaram emendas individuais ano passado, encerraram 2013 com o saldo zerado. A cada ano, os parlamentares das duas Casas têm direito de destinar R$ 15 milhões para projetos que beneficiem os seus redutos eleitorais, como obras, compra de medicamentos, construção de unidades de saúde, reforma de escolas, entre outros. Os deputados são livres para escolher como querem gastar esse tipo de cheque orçamentário: pode ser usado em emendas individuais ou em grupo, projetos de outros parlamentares e em emendas da bancada. O levantamento mostra ainda que, em 2013, quase um sexto dos parlamentares das duas Casas sequer apresentou emendas individuais.

A maioria dos parlamentares, no entanto, segue a manada e pega carona em projetos apresentados por colegas, um jeito mais fácil de conseguir a liberação da verba. Essa estratégia é muito usada pelo chamado baixo clero. Mesmo sem projetos próprios, esses deputados sinalizaram, apenas em 2013, o envio de R$ 2 bilhões em emendas individuais. Mas pouco chegou a ser liberado para que eles pudessem cumprir promessas de campanha. Nem os R$ 990 milhões já empenhados chegaram ao destino. A esperança é que esse dinheiro seja disponibilizado ainda este ano, na rubrica “Restos a pagar”. Até agora, foram liberados efetivamente R$ 48 milhões, ou seja, 2,3% dos R$ 2,018 bilhões em emendas parlamentares.

A lista dos deputados sem força para liberar verbas orçamentárias é extensa. O carioca Alfredo Sirkis (PSB) apresentou R$ 11,5 milhões em emendas de autoria própria, mas não conseguiu fazer o dinheiro chegar ao destino apontado. O mesmo aconteceu com Ricardo Tripoli (PSDB -SP), que indicou R$ 11,3 milhões; Antônio Reguffe (PDT-DF), com R$ 12 milhões; Rodrigo Bethlem (PMDB-RJ), com R$ 9,3 milhões; Pinto Itamaraty (PSDB-MA), R$ 8 milhões; e Filipe Pereira (PSC-RJ), R$ 7,15 milhões. “Às vezes, a emenda é tão ruim que a Comissão de Orçamento a rejeita e o deputado não consegue liberá-la”, analisa o cientista político David Fleischer.

O doutor em ciência política Leonardo Barreto explica que nem todos os deputados conseguem entrar no jogo da liberação de emendas, que envolve elaboração de projetos e bom relacionamento nos ministérios, e acabam apostando em outras áreas, que não a de enviar dinheiro ao estado.

Apesar de ter apresentado, em 2013, emendas individuais no valor de R$ 12 milhões para o Distrito Federal, o deputado federal Antônio Reguffe (PDT-DF) ainda não viu a cor do dinheiro. “O Congresso é um campo de poder onde as pessoas disputam as melhores condições e essa disputa é dura. Reguffe tem uma projeção enorme com os eleitores, mas pouquíssima capacidade de articulação parlamentar. Não são todos os deputados que fazem isso bem”, analisa Barreto.

Reguffe, no entanto, rebate o argumento e alega falta de interesse do governo em liberar emendas para as áreas de saúde, educação e segurança na capital do país. “Eu não destino dinheiro para shows e eventos. Coloquei R$ 5 milhões na saúde, R$ 5 milhões na educação, R$ 5 milhões na segurança pública. Deles, consegui R$ 3 milhões para compra de remédios. Eu fiz minha parte, mas o governo não.”

Fonte: Correio Braziliense

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