Uma mulher é assassinada a cada duas horas em Pernambuco

Em Pernambuco, de janeiro até maio, foram 110 vítimas da violência de gênero

Rodrigo Passos

Maria Alice Seabra, 19 anos, premeditadamente assassinada na sexta-feira (19) pelo seu padrasto, Gildo da Silva Xavier, 34, não foi a primeira. Em Pernambuco, até o mês de maio, 110 mulheres foram mortas, segundo dados da Secretaria de Defesa Social (SDS). O problema é que também não será a última. A jovem vai fazer parte das estatísticas. Seu nome dará lugar a termos percentuais. Por outro lado, sua família jamais será a mesma. As cicatrizes vão levar Maria José de Arruda, mãe da menina – outra vítima -, aos lugares vividos na memória construída pelos 15 anos da relação que teve com o homem que roubou da sua filha o direito de viver. Maria Alice, Maristela, Taciana, Danielle, Jacielma, Maria, Patrícia, Dênia e outras tantas. Em comum, o fato de serem vítimas do feminicídio. Morreram por serem mulheres. Foram vítimas do machismo, que mata uma mulher a cada duas horas no Brasil.

Maria José era ameaçada constantemente pelo ex-companheiro e acabou morta a facadas

“Temos a naturalização da violência contra as mulheres. Algumas questões passam despercebidas. Por exemplo, a sociedade trata o ciúme como prova de amor, mas dificilmente as pessoas percebem como violência. O ciúme é uma expressão da violência, do sentimento de posse do outro”, explica a educadora do instituto feminista SOS Corpo, Simone Ferreira. Em meio a esse cenário, é comum se deparar com justificativas para a violência de gênero, que normalmente encurralam as vítimas no lugar de culpadas. Vide os casos de estupro, que são, em sua maioria, explicados pelas roupas curtas das mulheres e não por uma atitude doentia dos seus agressores. “A cultura machista faz com que a vítima passe a ser a opressora. No caso de Alice, o agressor foi o padrasto. Não podemos jamais culpar a menina nem a mãe. Temos que julgar quem cometeu o crime, que foi ele”.O feminicídio – assassinato motivado por razões de gênero, menosprezo ou discriminação contra mulheres – é considerado crime hediondo desde março. Para a secretária estadual da Mulher, Sílvia Cordeiro, a determinação escancara o problema. “Elas não morreram porque iam ser roubadas, morreram porque eram mulheres. Essa história de crime passional complica pois é um atenuante de que pode se fazer isso por paixão. Precisamos desconstruir esses mitos. Um homem que mata uma mulher não é um monstro, ele é um homem violento que precisa ser combatido”.

Mas o desafio é também cultural. “Há uma associação histórica, cultural, há séculos, que desvaloriza as mulheres por meio da associação de tudo aquilo que é feminino ao que é mal, menor. Esse comportamento é devedor dessa história de dominação patriarcal, que ainda prevalece na sociedade”, avalia a professora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Criminalidade, Violência e Políticas Públicas de Segurança da UFPE, Ana Paula Portella.

O papel de proteção pode ser executado por qualquer pessoa. Estudos apontam que a maior parte dos agressores é do ambiente de convívio das vítimas: padrastos, pais, tios, irmãos, primos, amigos. “As meninas dão sinais, mas as pessoas minimizam justificando que é demonstração de carinho”, destaca Portella. A conjuntura social é debatida por organizações que lutam em defesa das mulheres. Dentro desse conjunto, o Estado cumpre papel determinante. Algumas ações estão em andamento desde 2007, quando a secretaria foi implantada. Entre elas, o programa Maria da Penha nas escolas, que vai estimular o respeito desde a formação das crianças. “Não é para dizer que o problema não existe. Existe, é recorrente e resistente. Precisamos fazer mais do que estamos fazendo”, conclui a secretária Sílvia Cordeiro.

04/04/1989 – Maristela Ferreira Just, 25 anos, foi assassinada pelo ex-marido, que também atirou contra os dois filhos do casal, além do cunhado, em Jaboatão dos Guararapes.

11/05/2008 – Taciana Barbosa de Carvalho, 32, anos, estava grávida de oito meses do ex-PM Marco Antonio Silva quando desapareceu no Dia das Mães. Ele a sequestrou, matou e depois jogou o corpo no mar em Itamaracá.

10/06/2013 – Danielle Solino Fasanaro, 35 anos, Teria prestado queixa várias vezes contra o companheiro André Cabral Diniz por agressão física e ameaça de morte. O casal estava junto há nove anos. Foi morta com dois tiros por ele.

30/06/2014 – Maria José da Silva Oliveira, 35 anos, era ameaçada constantemente de morte pelo ex-companheiro Joane Luiz da Silva. Foi assassinada por ele com vários golpes de faca enquanto dormia.

09/03/2015 – Jacielma Vieira dos Santos, 32 anos, ia se mudar para a Bahia, por conta de um novo emprego. Foi assassinada pelo marido, Wellington Rodrigues de Araujo por estrangulamento durante relação sexual.

Também no dia 09 de março de 2015, a ex-PM Dênia Cristina Nunes, 32 anos, foi morta pelo ex-namorado, Djaci da Silva, na Zona Rural de Flores, no Sertão. Ele não teria aceitado o fim do relacionamento. Assassinou a tiros e depois se matou.

20/03/2015 – Patrícia Pereira da Silva, 20 anos, foi assassinada pelo companheiro Renato Silva. Ele teria visto algumas conversas dela pelo WhatsApp, com fotos íntimas. Efetuou vários golpes de faca e arrancou sua cabeça.

19/06/2015 – Maria Alice Seabra, 19 anos, foi assassinada pelo padrasto, Gildo Xavier, que a criou desde os 4 anos. A estuprou, espancou, enforcou e jogou o corpo em um matagal.

Fonte: FolhaPE

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