Na queda de braço entre Polícia e governo, pior para a população

Com atividades em marcha lenta, inquéritos se acumulam

Felipe Vieira

Inquéritos se acumulam nas delegacias / Diego Nigro/JC Imagem

Inquéritos se acumulam nas delegacias

De um lado, parte da Polícia Civil, representada pelos sindicatos da categoria, reivindicando melhores salários e condições de trabalho. Do outro, o governo do Estado, acossado pela crise que sacode o País e sem poder responder aos pleitos dos policiais. O resultado da queda de braço é o aumento da criminalidade e a perda de capacidade de resolução de crimes, tendo como maior prejudicado o motivo primeiro da existência do aparelho estatal: o cidadão.

Nos últimos dois meses, o governo ficou longe da meta traçada contra os homicídios. A projeção de julho era não ultrapassar 226 assassinatos, mas ficou em 297. Para agosto, 220. Mas até o dia 25 já eram contabilizadas 260 mortes. Alguns homicídios, como os de maior repercussão, têm resolução rápida. Outros, em meio ao turbilhão que passa a categoria, se arrastam para ser esclarecidos.

Há dois meses, parte dos agentes, escrivães e delegados de polícia decidiram, como forma de protesto, não mais participar do Programa de Jornada Extra e Serviço (PJES). Muitos também começaram uma operação padrão que termina atrasando os procedimentos nas delegacias.

Com isso, a Polícia Civil – que já tinha um déficit de 50% no efetivo – passou a ter ainda menos poder de fogo na hora de elucidar crimes. A Força Tarefa do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), responsável pela primeira apuração dos assassinatos, perdeu duas equipes no último ano. “Durante a semana, eram três equipes nas ruas, agora existe apenas uma, e com número reduzido de integrantes”, conta, em reserva, um delegado. Apenas no mês de julho deste ano, a identificação da autoria dos homicídios no Estado caiu em 58%, comparada com o mesmo mês de 2014.

É na Central de Plantões, no bairro do Arruda, Zona Norte da cidade, onde o sistema dá um nó. Para lá são levados todos os flagrantes feitos no Grande Recife. Um procedimento simples, como a autuação por porte de drogas, em condições normais seria feito em uma hora. “Por conta da operação padrão, a gente chega a ficar de sete a oito horas, tempo em que poderíamos estar de volta nas ruas”, conta um policial militar.

Com a corporação em marcha lenta, o reflexo no número de inquéritos conclusivos enviados ao Ministério Público cai vertiginosamente. Em 2013, ano em que o Pacto pela Vida teve seu melhor resultado, foram 5.298 procedimentos que terminaram em denúncia ao Judiciário. Em 2014, o número caiu para 4.141. Nos sete primeiros meses deste ano, são 1.810. Se o atual ritmo for mantido, a expectativa é que pouco mais de 3 mil inquéritos sejam transformados em denúncia ao final de 2015.

O alto escalão do governo do Estado vê motivação política no movimento sindical. Falando em reserva, um funcionário graduado do Palácio do Campo das Princesas dispara, sem rodeios: “Existe uma tentativa política de enfraquecer o Pacto pela Vida, que é o maior legado do governo de Eduardo Campos e cuja continuidade é um compromisso de Paulo Câmara”. Outro integrante da cúpula palaciana crava que é impossível conceder reajuste de salário à categoria. “O momento é de crise e de cortes em todos os setores. Eles (delegados e agentes) sabem disso, e se continuam o movimento, é porque existem outros motivos”.

O presidente da Associação dos Delegados de Polícia de Pernambuco (Adeppe), Francisco Rodrigues, alega que a categoria não está sendo intransigente. “Sabemos que, no cenário atual de crise, aumento de salário está fora de cogitação. Mas temos outras reivindicações que ajudariam bastante no dia a dia, e para as quais o governo faz cara feia”. Ele cita a inamovibilidade, que é a garantia de que o servidor não será transferido ao bel-prazer do Executivo, além da realização de concurso de provas e títulos para delegados, nos modelos do que é feito no Judiciário.

O presidente do Sindicato dos Policiais Civis (Sinpol), Áureo Cisneiros, diz que o movimento é resultado de um processo antigo de sucateamento da entidade. “Os agentes não têm mais motivação para trabalhar, pois não há estrutura e segurança nas delegacias. Nossa luta é para mudar esse quadro”.

O governo do Estado se pronunciou através de nota, afirmando que as reivindicações não podem ser atendidas no momento, por causa da crise, e que está em constante esforço para realizar eventuais ajustes na operação das polícias em Pernambuco.

Coube ao Chefe da Polícia Civil, o delegado Antônio Barros, a declaração mais contundente sobre o caso. “É preciso que todos tenham atenção para com a sociedade e com a instituição. Não se pode destoar. O momento é de crise financeira geral, não apenas na segurança pública. Os pedidos da categoria são legítimos e o próprio governo reconhece isso. Mas é impossível atendê-los no momento. Temos que continuar trabalhando duro”.

Fonte: JC

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