Polêmica: Ex-promotor de justiça de Euclides da Cunha lamenta abuso de poder de policiais e o aumento da violencia
Ação Popular
Em um texto bastante contundente, o ex-promotor de justiça do município de Euclides da Cunha, Bahia, Davi Gallo Barouh, faz declarações graves sobre possíveis casos de abusos de autoridade cometidos por policiais militares, aumento do tráfico de drogas na cidade e crimes cometidos contra o patrimônio. Ele demonstra o medo que a população vive atualmente.
Confira:
É com pesar e perplexidade que tenho acompanhado as últimas notícias vindas de Euclides da Cunha.
Exerci as funções de Promotor de Justiça naquela cidade por aproximadamente 05 (cinco) anos, podendo afirmar que se trata de uma comunidade pacata composta de cidadãos e cidadãs dignos.
Lembro que recentemente algumas pessoas daquela cidade me ligaram para falar que “Euclides da Cunha” já não era a mesma comuna que um dia eu conheci, pois as autoridades trancaram-se em seus gabinetes, deixando toda a sociedade à mercê do que viesse a acontecer, fosse bom ou ruim.
Quando por lá exerci minhas funções atuando na área criminal, sempre primei por ter uma integração junto à comunidade, sempre ouvindo os seus membros e tomando as medidas necessárias para que prevalecesse a paz social, mesmo que para isso tivesse que contrariar interesses daqueles que apenas visavam o caos e a balbúrdia.
Várias foram as medidas, judiciais ou administrativas, adotadas em sede da minha Instituição – Ministério Público -, sempre com o intuito de que prevalecesse a lei e o respeito aos cidadãos daquela comuna.
Ao sair de Euclides da Cunha no ano de 2004, o fiz com tranquilidade, pois deixei no exercício das funções de Ministério Público Criminal naquela cidade o colega e amigo Luciano Assis que, também comprometido com a lei e o bem estar da comunidade euclidense, deu continuidade aos trabalhos que havíamos traçado enquanto trabalhamos juntos naquela cidade.
Na verdade, Luciano não apenas deu continuidade, como também se aproximou ainda mais da sociedade de Euclides da Cunha, desenvolvendo projetos sociais e controle rigoroso das atividades ligadas à segurança pública. Enquanto ele esteve por lá, não tivemos nenhuma notícia de abuso ou desrespeito às leis.
Infelizmente, da mesma forma que eu Luciano também foi promovido para Salvador após cerca de 05(cinco) anos após a minha saída.
Daí por diante vários foram os membros do MP que por lá passaram, uns se destacando a exemplo da Doutora Mônia, outros nem tanto em função do exíguo tempo que por lá permaneceram, fato este decisivo para que não pudessem dar continuidade a um projeto ministerial em relação à segurança pública local.
É bom que se fique claro que quando falo da atuação do Ministério Público em Euclides da Cunha, o digo em relação às funções criminais e de controle externo da atividade policial, restando isentos os demais membros que atuam em outras áreas a exemplo da cível, ambiental e probidade administrativa, etc.
Embora afastado de Euclides da Cunha a mais de 11(onze) anos, jamais deixei de gostar daquela cidade, bem como de manter contato com seus cidadãos e cidadãs, sobretudo para saber como andavam as coisas por lá.
Muitas pessoas daquela comunidade têm me ligado ao longo dos últimos 05(cinco) anos. Relatam que a cidade se encontra entregue ao tráfico de drogas e aumento de crimes contra o patrimônio.
Em uma destas ligações, uma cara amiga me relatou que em certa ocasião seu irmão, comerciante local e cidadão cumpridor de suas obrigações, foi agredido fisicamente por um policial militar, simplesmente por ter estacionado seu veículo em um local não permitido. Disse-me ela que seu irmão tentou interagir com o citado policial, argumentando de que pagaria a respectiva multa, só não aceitava ser tratado daquela forma por ele, o policial, mesmo porque era um cidadão e não um criminoso.
Ao ouvir os argumentos do cidadão, o referido policial sentiu-se ofendido e, juntamente com outro miliciano, passou a agredir o irmão desta minha amiga. Pior ainda: prendeu o cidadão ao argumento de que ele lhe teria “desacatado”, conduzindo-o até a delegacia de policial local.
Não se precisa ser profissional da área do Direito para se comprovar que estávamos diante de um típico crime de abuso de poder praticado por um agente público contra um cidadão e se alguém cometeu crime, com certeza não foi este e sim aquele.
Pois bem, ao tomar conhecimento do fato aconselhei que o cidadão procurasse a sede do Ministério Público e relatasse os fatos a o Promotor de Justiça Criminal daquela Cidade a fim de que fossem tomadas as medidas legais pertinentes, o que foi feito, entretanto nada foi feito pelo Ministério Público de Euclides da Cunha, ficando este caso impune sem que o Estado tomasse nenhuma medida legal que o caso requeria, muito embora estivesse obrigado a fazê-lo.
De tão esdrúxulo que foi, levei este fato ao conhecimento de Luciano Assis o qual que da mesma forma que eu, também nutre grande afeição pela Cidade de Euclides da Cunha, sendo que ele, inclusive, possui uma residência nesta cidade e, portanto é cidadão da mesma, participando do seu cotidiano, muito embora só vá lá esporadicamente.
Nestas conversas Luciano me relatou o estado em que se encontra Euclides da Cunha após a nossa saída. Disse-me que várias são as notícias de abusos cometidos por pessoas que deveriam ali estar justamente para que coisas como estas não acontecessem, posto que pagos pelo Estado.
Os índices de crimes elevados; policiais violentos que põem em polvorosa a paz social. Tudo isso acontecendo sem que o Ministério Público tomasse uma providência para fazer cessar este estado de coisas.
Durante o tempo que fui Promotor de Justiça de Euclides da Cunha, fui taxado como “duro” e intransigente quando se tratava em combater o que era contra a lei. Denunciei e busquei a punição daqueles que, chegando ao meu conhecimento, estariam turbando a ordem pública, “fossem eles quem fossem”, poderosos ou policiais.
Nunca admiti nenhuma forma de abuso de poder, pois entendo que agentes públicos pagos pelo Estado, pelo Cidadão, têm o dever de servir à sociedade em que trabalham.
Continuo assim e talvez esteja pagando um preço por isso aqui em Salvador, mas não me arrependo de nada que faço ou ainda irei neste sentido, mesmo porque nesta minha caminhada conto com amigos do Jaez de Luciano Assis que, da mesma forma, sentem profundamente o que está acontecendo em Euclides da Cunha.
O fato ocorrido na madrugada do dia 24/10/2015 na Praça Duque de Caxias em Euclides da Cunha, diante do que já tínhamos tomado conhecimento, já era mais do que esperado e poderia ter tido consequências muito mais nocivas que as que ocorreram.
Claro que tudo vai depender das investigações, contudo em relação a um dos envolvidos na situação as notícias que me chegam não são boas, pois se trata de pessoa irascível, com histórico de violência e arrogância para com cidadãos de Euclides da Cunha, inclusive soube até que um médico local se encontra ameaçado pelo mesmo.
Deploravelmente pessoas como estas teimam e macular a imagem da briosa Polícia Militar, principal Órgão responsável pela paz social, cuja maioria esmagadora dos seus prepostos são homens e mulheres de bem comprometidos com o que fazem.
Na verdade, pelo que se diz, tudo começou com a prática de um crime de “abuso de autoridade”, cometido por um agente público que não se encontrava trabalhando no momento e que usando das prerrogativas de policial, após uma discussão de somenos importância, passou a agredir um cidadão simplesmente porque este lhe dissera algo que lhe desagradou. A perceber a ocorrência de um crime, o colega Pedro Safira, que naquele momento se fazia acompanhar do seu primo, um Policial Rodoviário Federal, se dirigiu ao então agressor, pedindo-lhe que fizesse cessar a agressão que estava praticando. Neste momento os ânimos se exaltaram culminando com um tiroteio em praça público, vindo a óbito um dos contendores, enquanto que o outro saiu gravemente lesionado.
Não bastasse este fato deplorável, ainda sucederam outros que carecem de uma investigação profunda, pois as evidências apontam para fatos graves que, uma vez comprovados, farão chocar ainda mais toda a sociedade deste Estado.
Estou falando do incêndio do veículo do colega Pedro Safira, que até agora não se tem autoria definida, entretanto os indícios apontam para algo até então inédito neste Estado, reservando-me a falar sobre o mesmo após as investigações, contudo todos sabem muito bem quem incendiou o citado veículo e uma vez comprovada a autoria, ou autorias, se farão necessárias adoção de medidas duras contra aquele ou aqueles.
Ademais, o desdobramento dos fatos poderia culminar com a morte de um Membro do Ministério Público que ali se encontrava, o que encheria de vergonha ainda mais a nossa Instituição. Penso até que isto não aconteceu face à rapidez com que os fatos se desenrolaram, uma vez que vendo seu primo baleado, o citado Promotor de Justiça envidou esforços no sentido de lhe prestar socorro dirigindo até o hospital local.
Marcelo César, Colega Promotor de Justiça, a muito tempo tem postado aqui mesmo várias notícias dando conta de atos de violência, inclusive vários homicídios, ocorridos naquela região, notadamente Euclides da Cunha e Tucano, sem que tais crimes tenham tido o desfecho esperado pela lei.
Na verdade, pelo que tenho visto e sabido pelos moradores de Euclides da Cunha, esta localidade se transformou em uma “terra sem lei”, aonde seus moradores se encontram totalmente desguarnecidos e humilhados. Pior ainda, humilhados justamente por aqueles que têm o dever legal de lhes proteger, entretanto fazem uso do poder que lhes é conferido para subjugar os cidadãos e cidadãs euclidenses.
Sinceramente espero que medidas sejam adotadas com urgência em nível estadual.
Não se admite que uma pacata comunidade como a de Euclides da Cunha seja vilipendiada e humilhada desta forma. Seus cidadãos e cidadãs não merecem isso.
Espero que doravante minha Instituição adote medidas que já deveriam ter sido adotas há muito tempo, pois o que aconteceu foi anunciado há muito tempo atrás.
Defendo e sempre defendi que os membros do Parquet procurem se inteirar do que está acontecendo nas comunidades que estão sob sua responsabilidade, tomando medidas duras, se necessárias, contra todos que turbam a paz social, mesmo que sejam agentes do Estado.
É muito triste ouvir dos cidadãos e cidadãs de Euclides da Cunha que: “só existia lei em Euclides da Cunha quando o senhor ou o Doutor Luciano eram os Promotores da cidade”.
Vamos acabar com isso.
Euclides da Cunha mora no meu coração. Foi a Comarca que me ensinou a ser Promotor de Justiça e me preparou para o exercício de minhas funções aqui em Salvador.
Foi em Euclides da Cunha que aprendi a enfrentar poderosos e deles não ter medo nem receio, pois aprendi que se ao meu lado estiverem pessoas de bem, qualquer coisa vale a pena desde que eu tenha a lei ao meu lado fazendo a mesma prevalecer para a sociedade que paga os meus vencimentos.
Nunca fui e nem serei Promotor de Gabinete. Isso me ensinou que se tomarmos as medidas pertinentes na hora certa, fatos como os que estão acontecendo em Euclides da Cunha jamais aconteceriam.
Espero o desfecho das investigações temendo pelo resultado, pois pelo que vi a comunidade se encontra assustada e receosa em falar a verdade por medo de retaliações de algumas pessoas. Contudo, se as autoridades envolvidas quiserem, de verdade mesmo, este deplorável acontecimento terá o desfecho que a lei exige.
Neste momento me solidarizo com toda a comunidade de Euclides da Cunha, comunidade esta que aprendi a respeitar e gostar.
Me solidarizo também com o colega Pedro Safira pela perda de um ente querido que, pelo que sabemos, morreu justamente para que não fosse efetivada uma ilegalidade em plena praça pública na minha querida Euclides da Cunha.
Salvador, 25 de outubro de 2015.
Davi Gallo Barouh.