A voz de um inocente foi ouvida

O advogado Francisco de Jesus Penha, aos 98 anos, funcionário publico por mais de 30 anos, foi inocentado, ontem, durante os desdobramentos da Operação Background, que investiga integrantes do Grupo João Santos denunciados pelo Ministério Público Federal. Além de ser inocentado, Francisco teve o seu nome removido dos autos do processo, o que está sendo amplamente comemorado por ele e por familiares. Abaixo, o leitor confere uma carta de Francisco sobre o seu processo e sua vitória.

Prezados Amigos,

Foram décadas de trabalho honesto e dedicado. Acima de tudo, obediente à lei e pautado em premissas técnicas, como aprendi com grandes mestres. Nunca tive inclinação para imoralidades e muito menos para bandidagem.

Infelizmente, fui taxado assim por alguns anos em razão de equívocos das autoridades de nosso país e também pela má-fé e falsas acusações de alguns, que, levianamente, e por culpa de artimanhas de outrem, me impuseram dor, sofrimento e restrições de todas as ordens possíveis.

Fui acordado às 5h da manhã naquele maio de 2021 e tive minha casa revirada. Lembranças de fotos da minha família, tudo vasculhado conforme mandado solicitado pela Polícia Federal em conjunto com a Procuradoria da Fazenda e Ministério Público do Trabalho. Sem prévia deliberação sobre meus poderes como mero empregado do Grupo.

Revirar coisas tão pessoais foi como uma invasão da partilha íntima que tive de cartas, fotos de casamento e eventos com a pessoa que mais amei nesta vida, como todas elas fossem devassadas. As roupas dela, que eu ainda não tinha tido a coragem de rever, após a sua passagem para a morada eterna, foram redescobertas e espalhadas por agentes-policiais que seguiam ordens de bem arrumados Procuradores da Fazenda. Um deles sussurrou: “Aquilo é mala de dólar”.  Engano: era apenas um faqueiro que comprei, eu e minha esposa, há mais de 40 anos. Guardado para ocasiões especiais e sempre devolvido para sua mala. Foi o que lá acharam!

Naquele dia senti uma vida pautada na higidez e seriedade desabar.

Hoje, ainda respondo a centenas de ações fiscais e trabalhistas (que inclusive tiram de mim meu mínimo, minha aposentadoria que custeia minha morada, alimento e saúde). Espero que com a decisão da Operação, advogados e ex-empregados que não me conheciam tenha a dignidade de pedir minha exclusão ou ao menos não pedirem novos ataques em incidentes a serem inaugurados sobre a pessoa jurídica. Tudo isso deve recair para sócios culpados e não para empregados inocentes.

Ninguém ousa a me ajudar ou a me pagar o que é devido, em decorrência de serviços prestados efetivamente, nem quem me deixou nesta triste situação – que deixou também milhares de outros empregados – e muito menos a nova gestão. De que importa um velho de quase 99 anos, certo? Devem pensar “já viveu demais”. E como eu queria viver ainda mais! Tenho sonhos, sobretudo de escrever, em detalhes, sobre cada parte do ocorrido durante os últimos e sofridos anos. Pretendo reviver o enredo renovando uma retórica nova, uma nova teoria do absurdo. Voltar para Camus, do meu próprio jeito.

Que fique claro que não perdi minha força para viver. Tenho um Deus justo e santos protetores fiéis. Muitos sonhos me foram tirados a cada oficial de justiça e a cada carta com AR informando sobre novo processo judicial ou depoimento policial.

Para minha felicidade, a Operação Background, após minhas defesas em fase investigativa e diversas provas enviadas, rejeitou a denúncia, demonstrando minha inocência, por falta de justa causa para me processar!

Venho, por meio deste comunicado, agradecer aos que me deram, com sua amizade, conforto, permaneceram por perto e, sobretudo, por aqueles que se ofereceram (e o fizeram) para testemunhar sobre a minha conduta e minhas atividades no Grupo João Santos.

Como empregado, sem modéstia, devo dizer que sempre cumpri meus deveres; como Diretor fui técnico e respeitoso com minha equipe, de quem tenho a felicidade de receber diversas mensagens de felicidade pela justiça feita! Nunca tive poder financeiro, nunca geri, nunca pude decidir sobre os rumos de pagamentos ou não pagamentos. Hoje, lendo a denúncia federal, vejo com tristeza a derrocada de empresas inauguradas por um trabalhador, que começou do zero, sem apadrinhamentos, mas com muita garra.

Depois de perder tudo o que tinha para me defender, consegui resgatar o que mais era de meu interesse: A minha honra, o meu nome!

Que venham as próximas batalhas, tenho muita idade, mas muita força e muita fé.

Do amigo de sempre,

Francisco de Jesus Penha

Fonte: Magno Martins

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