Do Clube de Engenharia
(Imagem: Ministério das Minas e Energia)
O governo deu o primeiro passo para acabar com a Reserva Nacional de Cobre e Seus Associados (RENCA), área com cerca de 47 mil quilômetros quadrados e grande potencial para exploração de ouro, localizada na floresta da Amazônia, nos estados do Pará e do Amapá. A portaria nº 128/2017 do Ministério das Minas e Energia (MME), publicada em 7 de abril, informa que um futuro Decreto vai extinguir a reserva – fechada ao setor privado desde 1984 –, e que serão reativados os requerimentos de títulos para pesquisa e concessão de lavra na região já concedidos ou encaminhados antes da sua criação. As áreas não cobertas por pedidos de títulos minerários serão divididas em blocos e oferecidas ao mercado. Ao justificar a decisão, o ministro das Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, que assina a portaria, considera “a importância de se criar mecanismos para viabilizar a atração de novos investimentos para o setor mineral”. E também afirma que “a extinção da RENCA viabilizará o acesso ao potencial mineral existente na região e estimulará o desenvolvimento econômico dos Estados envolvidos”.
Na opinião da geóloga do Serviço Geológico do Brasil (CPRM), Maria Glícia da Nóbrega Coutinho, diretora de Atividades Institucionais do Clube de Engenharia, qualquer projeto de desenvolvimento na região vai exigir um grande esforço de pesquisa para o reconhecimento de áreas potenciais para exploração. Uma tarefa de alta complexidade devido às dificuldades de acesso à região. “O problema de acesso à RENCA em condições amazônicas e a pesquisa em áreas de floresta de densa cobertura exigem o emprego de metodologias de alta tecnologia e resolução, além da aplicação de modernos conceitos de modelos de mineralização, implicando, portanto, em custos onerosos”. Ela observa que realizar pesquisa na região demanda altos investimentos e programas de pesquisa tecnicamente bem definidos para desenvolver o potencial mineral da RENCA.
“Estes fatos associados à não disponibilidade de recursos financeiros, bem como a não definição de mecanismos de repasse de recursos assegurados pelo Decreto de criação da RENCA levaram a CPRM a não realizar trabalhos na região. Trabalho de pesquisa em áreas de conhecimento geológico insuficiente e de condições ínvias é tarefa típica de ação governamental, no contexto global”, e diz: “É imperativo uma ação de governo para tentar solucionar os problemas de ordem financeira e legal, de forma que a nova Província Mineral da RENCA transforme-se em um polo mínero-metalúrgico, a exemplo de Carajás”.
Os pedidos de pesquisa encaminhados ao governo por empresas interessadas em atuar na região cobrem, atualmente, mais de 90% da área da RENCA, correspondendo a um total de 416 áreas ou requerimentos de pesquisa, sendo 196 deles anteriores ao Decreto de constituição da reserva. Deste total, o Departamento Nacional de Pesquisa Mineral (DNPM) outorgou alvarás de pesquisa para apenas 5%, ou seja, 22 áreas. Cerca de 80% dos pedidos de pesquisa (350 áreas) foram requeridas por 9 grupos, onde se inclui CPRM e a Vale, sendo esta a detentora do maior número de áreas na RENCA.
A recente Portaria nº 128/2017 do MME dispõe sobre os títulos minerários (autorizações de pesquisa, concessões de lavra, permissões de lavra garimpeira e registros de licença) na área da Reserva Nacional de Cobre e Seus Associados (RENCA), e afirma que os requerimentos que se encontram pendentes, apresentados antes da criação da reserva (em 24 de fevereiro de 1984), serão analisados. Aqueles com data posterior ao Decreto serão indeferidos. O DNPM, com apoio técnico do CPRM, vai fazer a divisão das áreas em blocos, que serão postos em disponibilidade para pesquisa separadamente ou em grupos. Os títulos minerários outorgados à CPRM continuam em vigor.
Potencial mineral
Maria Glícia explica que o nível atual do conhecimento geológico da área da reserva é insuficiente para se quantificar o valor da produção mineral da região abrangida pelo RENCA. “O reconhecimento de ambientes geológicos favoráveis às mineralizações não assegura a presença de depósitos minerais economicamente viáveis. O nível do conhecimento da RENCA é incompatível até com a escala de 1:250.000 (não aplicado à pesquisa mineral), somando-se as características da extensão da área (46.540 km²) e localização em região de condições amazônicas: presença de densa cobertura de floresta e ausência de acesso terrestre às áreas em estudo”.
Mesmo assim, por suas características geológicas, similares às de Carajás, a reserva apresenta, segundo Maria Glícia, potencialidade mineral rica e diversificada. Destaca-se a presença de ouro, seguindo-se o titânio e o fosfato, cuja pesquisa foi desenvolvida pela Docegeo/Vale. Há diversos registros de ocorrências ou garimpos de cassiterita, columbita e tantalita, relacionadas à aluvião. No que diz respeito à mineralizações de metais-base de cobre, chumbo e zinco, trabalhos executados pela CPRM em áreas inseridas na RENCA, anteriores ao estabelecimento da reserva, com base em mapeamento geológico e investigações geofísicas, foi reconhecida uma faixa de cerca de 10 km de extensão por 50-700 m de largura correspondendo à configuração de um corpo portador de sulfetos de Cu, Pb, Zn, e teores de ouro e prata, confirmado depois por furos de sondagens. Estudos de reconhecimento apontam, ainda, para indícios de níquel e cromo em rochas metavulcânicas-sedimentares e estanho, wolfrâmio, tântalo e terras raras em rochas granitoides, além de titânio, nióbio e terras raras em rochas máficas-ultramáficas – intrusões de natureza alcalina. “A Reserva Nacional de Cobre e seus Associados está inserida num contexto geológico-metalogenético altamente favorável a mineralizações polimetálicas, similar a Carajás, bem como a outras províncias minerais reconhecidas no contexto global, tais como Austrália, Canadá e África do Sul, que se encontram em franca produção”, avalia Maria Glícia.
Ouro mapeado
Em dezembro de 2016, o diretor-presidente do Serviço Geológico do Brasil (CPRM), Eduardo Ledsham, anunciou aos participantes do Mines & Money, em Londres, a maior conferência e exposição de investimentos em mineração da Europa, outras medidas em estudo para atrair recursos estrangeiros para o Brasil. “O jogo mudou no Brasil”, declarou, durante o evento, segundo reportagem sobre sua apresentação divulgada no site do CPRM. O objetivo do governo, segundo ele, é aumentar de 4% para 6% a participação do setor no PIB.
Na ocasião, Ledsham afirmou que a RENCA, uma das últimas fronteiras de greenfield (novos projetos) para depósitos de ouro de classe mundial, possui sequências vulcano-sedimentares arqueanas distribuídas ao longo de 160 km, onde a CPRM já mapeou mais de 40 ocorrências de ouro. Além disso, a própria instituição detém títulos minerários para pesquisa e lavra na reserva, que, nas novas regras, deverão ser leiloados.
O Decreto nº 89.404, de fevereiro de 1984, deu exclusividade à CPRM para pesquisa mineral na área, e vetou o aproveitamento mineral na região. Geograficamente a área do RENCA corresponde a 46.540 km² (aproximadamente duas vezes a área do estado de Sergipe e quase metade de Pernambuco). O acesso à área é extremamente difícil, feito por meio fluvial e das margens dos rios até a área da reserva, através de picadas abertas na selva Amazônica. Outra opção é helicóptero ou aviões monomotores, usando cinco pistas de pouso existentes na área em questão.
Para os investidores presentes ao evento de Londres, o executivo da CPRM também destacou a intenção do governo de criar condições para investimentos na fronteira brasileira por empresas estrangeiras, o que estimou representar quase 23% da superfície do país.
Fonte: Jornal GGN