Colômbia: tomada do Palácio da Justiça pelo grupo guerrilheiro M-19 completa 30 anos

Quase 100 pessoas morreram durante ocupação, retratada na série ‘Narcos’; episódio traumatizou o país, que também se refere à tragédia como ‘holocausto’
Em 6 de novembro de 1985, o grupo guerrilheiro M-19 (Movimento 19 de Abril, em referência a uma suposta fraude nas eleições presidenciais de 1970) invadiu o Palácio da Justiça, sede do Judiciário colombiano (o equivalente ao Supremo Tribunal Federal no Brasil), no centro de Bogotá, capital do país. Os confrontos que se seguiram à ofensiva das Forças Armadas pelo controle do Palácio resultaram em 98 mortes, incluindo todos os 11 juízes da Suprema Corte, e 11 pessoas desaparecidas.

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Por volta das 14h do dia 6 de novembro, tropas militares iniciam ofensiva pela retomada do Palácio de Justiça

O Palácio da Justiça esteve tomado durante 27 horas, entre as 11h30 do dia 6 até as 14h20 do dia 7. No total, mais de 300 pessoas foram feitas como reféns.

Algumas fontes relatam que o presidente da Suprema Corte da Colômbia, Alfonso Reyes Echandía, teria entrado em contato com o então presidente da Colômbia, Belisario Betancur, com o intuito de obter um cessar-fogo e mediar as negociações. Betancur, no entanto, não teria atendido a chamada e teria ordenado a ofensiva das Forças Armadas.

 

Sob a coordenação do coronel Alfonso Plazas Vega, então comandante da Escola de Cavalaria, os militares invadiram o Palácio com o uso de tanques blindados, após terem transcorrido três horas desde a entrada dos guerrilheiros. Segundo Gustavo Petro, ex-membro do M-19 e atual prefeito de Bogotá, o Exército colombiano acreditava que os guerrilheiros tinham condições de resistir a ofensivas de infantaria por meses e até anos, o que levou os comandados de Plazas Vega a atacar com violência e utilizando armamentos pesados.

O M-19 já havia realizado operações como o roubo da espada de Simón Bolívar de um museu de Bogotá, em 1974, e a tomada da embaixada da República Dominicana, em 1980. O grupo surgiu em 1970, após o conservador Misael Pastrana derrotar Rojas Pinilla, da ANAPO (Aliança Nacional Popular), em uma eleição presidencial apertada. Diante das acusações de fraude eleitoral, o setor socialista da ANAPO entrou em desacordo com o resto do partido e, em 1974, fundou o Movimento 19 de Abril, que acreditava na luta armada como única forma de chegar ao poder.

A tomada do Palácio se tornou um grande trauma nacional na Colômbia, que encara o episódio de modo semelhante a como os EUA veem o atentado às Torres Gêmeas em 2001. Na Colômbia, a tragédia também é conhecida como “holocausto”.

O episódio voltou à tona recentemente com a estreia da série “Narcos”, produção do Netflix, que menciona a tragédia na primeira temporada. Existem acusações de que o narcotraficante Pablo Escobar teria financiado o M-19 para invadir o Palácio, visão que é sustentada em “Narcos”. Segundo estimativas, ele teria ofertado uma quantia estimada em US$ 2 milhões. As investigações conduzidas pelo governo colombiano a partir de 1986 não conseguiram comprovar o suposto envolvimento de Escobar, que teria apoiado a iniciativa em retaliação a um tratado de extradição da Colômbia com os EUA.

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Forças Armadas utilizaram tanques blindados para invadir o Palácio que estava sob controle do M-19

Em 2010, Plazas Vega foi condenado a 30 anos de prisão pelo desaparecimento de algumas pessoas durante a retomada do Palácio, principalmente funcionários da cafeteria. Vídeos que mostravam militares levando pessoas que depois foram tidas como desaparecidas foram as principais provas de que o Exército era responsável pelo desaparecimento, tortura e morte de pessoas que estavam no Palácio. Outros três oficiais do Exército enfrentam acusações semelhantes. Advogados representantes das vítimas, promotores e a juíza do caso relataram ter recebido ameaças de morte por conta do processo contra Plazas Vega.

Dentre as 11 pessoas desaparecidas reconhecidas inicialmente, descobriu-se em 2000 que uma mulher havia sido enterrada em uma cova comum e outras três pessoas tiveram suas identidades conhecidas em 2014 após análise dos restos mortais. Até hoje, o paradeiro dos corpos das outras sete pessoas é desconhecido.

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