Comando Vermelho passou a dominar o Amazonas após derrotar facção local e agora disputa área com PCC

Numa noite de julho de 2017, Adriana Monteiro da Cruz fechava sua barraca de churrasquinho no bairro Novo Aleixo, em Manaus (AM), quando dois homens armados se aproximaram e dispararam tiros contra ela. A vendedora autônoma não resistiu a perfurações no tórax e no abdômen. O Ministério Público do Amazonas apontou que o assassinato foi ordenada por Clemilson dos Santos Farias, o Tio Patinhas, um dos líderes do Comando Vermelho no Estado. Foi por meio de execuções sumárias, intimidações, motins em presídios e repasses ilegais de dinheiro que a facção ampliou, nos últimos anos, sua presença no Amazonas.

Tio Patinhas é casado, há 11 anos, com Luciane Barbosa Farias, a “dama do tráfico”. O Estadão revelou que ela foi recebida duas vezes vezes no Ministério da Justiça, na condição de presidente de uma ONG bancada pela facção.

Luciane Barbosa se reuniu com dois secretários e dois diretores do Ministério da Justiça em um período de três meses. A revelação levou o órgão a editar às pressas uma portaria mudando as regras de acesso ao Palácio da Justiça, sede da pasta. O prédio fica ao lado do principal acesso ao Congresso Nacional e próximo ao Palácio do Planalto e ao Supremo Tribunal Federal (STF).

O episódio causou desgaste para o ministro Flávio Dino, levando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sair em defesa do auxiliar, e ameaçou a indicação de Dino para o Supremo Tribunal Federal (STF), que se consolidou após a aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) no Senado limitando atuação de ministros da Corte.

Como o Comando Vermelho chegou ao Amazonas
O grupo criminoso chegou a Manaus em 2016. A execução no Novo Aleixo ilustra o avanço da facção no Amazonas de lá para cá. Investigadores da Polícia Civil concluíram que Adriana morreu por engano: o alvo era a irmã dela, Simone Monteiro da Cruz, casada com Francis Olumuyiwa Olufunwa, um dos líderes da Família do Norte (FdN), uma facção que nasceu no interior do Estado.

O crescimento do Comando Vermelho no Amazonas ocorre numa situação de aumento da violência. Em 2022, os Estados da Amazônia Legal registraram uma taxa de homicídio de 26,7 para cada 100 mil habitantes. No País, o índice foi de 19,0 homicídios para cada 100 mil. É tempo ainda de aumento do número de presos.

Os especialistas em segurança pública observam que as cadeias do Norte se tornaram verdadeiros centros de recrutamento para as facções criminosas – da mesma forma que em outras regiões do Brasil.

De 2016, até o primeiro semestre deste ano, a população carcerária na região Norte cresceu 21,9%, mais que a média nacional (18,8%). Hoje, são 63,5 mil encarcerados, sendo 10,6 mil só no Amazonas. Os dados foram compilados pela reportagem do Estadão a partir de informações do Sistema de Informações do Departamento Penitenciário Nacional (Sisdepen), mantido pelo Ministério da Justiça.

Guerra com PCC
No começo deste ano, a Secretaria de Administração Penitenciária (Seap) do Amazonas detalhou a atual da guerra entre CV e PCC no Estado ao pedir a transferência de Patinhas para um presídio federal – o pedido aguarda decisão da Justiça. Segundo documento do órgão, o CV tornou-se dominante a partir de 2020, ao vencer a Família do Norte. Como resposta, pequenos grupos criminosos remanescentes da FdN e recém-surgidos passaram a se aliar ao PCC. Em julho último, a briga entre CV e PCC resultou em dois assassinatos dentro de prisões.

“O PCC está em Manaus, e a chegada dele se deu a partir de um racha (dentro do Comando Vermelho), liderado pelo bandido ‘Cascudo’. Ele não aceitou ser chamado a atenção pelo Conselho (grupo que comanda o CV), e então rompeu com o CV do Amazonas, se aproximou do PCC e levou junto com ele vários outros integrantes que eram do CV ou que já foram da Família do Norte”, afirma o geógrafo Aiala Colares de Oliveira Couto, que é professor da Universidade do Estado do Pará e integra o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. “Tem vários bairros (em Manaus) que hoje estão sob o comando do PCC. Esse racha se deu não tem nem um ano.”

No momento, o líder máximo do CV no Amazonas é o traficante Gelson Carnaúba, conhecido como “Mano G”. Antes de integrar o CV, Carnaúba foi um dos fundadores da Família do Norte. Ele é acusado de comandar uma chacina no Complexo Penitenciário Anísio Jobim, o Compaj, em 2002, quando doze presos foram mortos pelo CV. Os mesmos documentos apreendidos pela Polícia Civil do Amazonas que mostram os pagamentos para a ONG de Luciane Barbosa Farias, revelados pelo Estadão, apontam também remessas para Carnaúba, identificado pelo codinome “Amigo de Longe”.

Como o CV age no Amazonas e as orientações via WhatsApp

Elaborado com informações apreendidas no celular de uma integrante do CV, o relatório da Polícia Civil mostra como é a organização da facção no Amazonas. O grupo é comandado por um “Conselho” – do qual Tio Patinhas faz parte. Foi como membro do “Conselho” que ele teve papel de destaque na guerra contra a Família do Norte, a partir de 2016. Hoje, aguarda preso julgamento do caso pelo tribunal do júri.

O Comando Vermelho no Amazonas conta também com uma espécie de Conselho de Sentença, tribunal do crime, formado pelos líderes do grupo para determinar até penas capitais”, segundo a Polícia Civil. Abaixo do Conselho estão os representantes de cada município ou região de Manaus, chamados de “Geral”.

O “Geral” de determinada localidade é auxiliado por um “Frente”. Os “frentes” coordenam “os trabalhos locais e dirimem conflitos entre seus associados. Também levam as demandas de seus associados para que sejam solucionadas pelo Conselho”. Por fim, cada local tem um tesoureiro, chamado pela facção de “Torre”. “Esses são responsáveis por coletar o dinheiro do que chamam de ‘Caixinha’ (uma espécie de contribuição sindical do crime)”, diz o relatório da Polícia Civil.

A facção chegava a distribuir, via WhatsApp, as informações sobre o balanço das contas do mês, sob o título de “Transparência CV-AM”. “O Comando Vermelho que articula as coisas na Amazônia é um CV diferente do CV do Rio de Janeiro. São várias células espalhadas por vários municípios de vários Estados”, explica Aiala Colares. “Não é uma autonomia, porque há um Conselho, que é composto por integrantes da região amazônica e do Rio de Janeiro, onde está o comando máximo. Muitas decisões partem do comando geral, deste Conselho”, diz ele.

Guerra por território promoveu uma “verdadeira barbárie
Em 2018, o delegado da Polícia Civil do Amazonas Ivo Henrique Moreira Martins pediu a prisão de Tio Patinhas. Num documento, registrou uma disputa “escancarada” entre os faccionados comandados por José Roberto Fernandes (FdN) contra os comandados por Gelson Lima Carnaúba (Comando Vermelho). A guerra por território promoveu uma “verdadeira barbárie”, escreveu. “Com a prisão de Gelson, quem dita as ordens do Comando Vermelho é justamente Clemilson dos Santos Farias.”

Um outro trecho do documento destaca que Clemilson tinha a função de estruturar o CV-AM, fomentando, ainda mais, a disputa por pontos de vendas de drogas contra integrantes da Família do Norte. O delegado aponta que, consequentemente, ele contribuiu para aumentar os índices de criminalidade e homicídios na cidade de Manaus.

Segundo investigadores, a ação contra Adriana Monteiro da Cruz foi o revide a um atentado da Família do Norte contra Patinhas, em 2015, ao qual ele sobreviveu. No mesmo ano, Clemilson foi para a prisão pela primeira vez, após ser pego em Manaus portando ilegalmente uma arma. Por fim, após uma série de execuções, o Comando Vermelho venceu a guerra contra a FdN. Hoje, o inimigo do CV em Manaus é o Primeiro Comando da Capital (PCC), de origem paulista.

Ainda em abril de 2018, um homem foi encontrado morto em um terreno baldio no bairro de Puraquequara, na Zona Leste de Manaus. Preso ao rosto dele, havia um cartaz com os dizeres “Tava devendo Mano Alex e Tio Patinhas”. Também é atribuído ao líder do Comando Vermelho o homicídio a facadas de um mototaxista de 23 anos em Autazes (AM), a 107 quilômetros de Manaus. A família da vítima ficou sabendo da morte por meio de um vídeo, que circulou no WhatsApp.

Em maio do mesmo ano, Clemilson teria participado da fuga de 35 presos do Centro de Detenção Provisório Masculino II (CDPM II), por meio de um túnel. Segundo relatório da PC-AM, a fuga foi “planejada e financiada por integrantes do CV-AM”, com a finalidade, ainda segundo o documento, “de oxigenar a atuação da organização criminosa no Estado”.

Patinhas teria também ordenado a execução de dois homens dentro de um motel de Cidade de Deus, na zona norte da capital do Amazonas, como parte de um acerto de contas. Rodrigo Pinheiro de Souza, 20 e Menison Bezerra Gomes, 23, foram baleados enquanto estavam com duas mulheres. Pinheiro morreu na hora, mas Menison sobreviveu ao ataque. Em depoimento, atribuiu a Tio Patinhas a responsabilidade pelo ataque.

Os crimes da “dama do tráfico”

À frente do Instituto Liberdade do Amazonas que a mulher de Tio Patinhas teve acesso aos gabinetes das pastas da Justiça e dos Direitos Humanos. A entidade está longe de ser uma simples entidade de apoio a detentos. Um relatório sigiloso da Polícia Civil mostra recibos de pagamentos do “tesoureiro” do Comando Vermelho no Amazonas, Alexsandro B. Fonseca, o “Brutinho”, para a organização, no valor de R$ 22,5 mil, para o mês de fevereiro. O relatório traz ainda uma espécie de planilha de custos do Instituto Liberdade do Amazonas, sugerindo que todas as despesas da ONG eram pagas pela facção.

A denúncia do Ministério Público do Amazonas, apresentada em agosto de 2018, registra que Luciane Barbosa Farias atuava como “braço financeiro” do marido, sendo responsável pela lavagem de dinheiro do tráfico da facção. Essa denúncia foi rejeitada pela juíza de primeira instância, mas aceita pela desembargadora que revisou o caso, em outubro deste ano. Resultou na condenação de Luciane a dez anos de prisão pelos crimes de associação para o tráfico, lavagem de dinheiro e formação de organização criminosa. Ela atualmente recorre em liberdade.

Trecho da decisão do TJAM que condena Clemilson e Luciane Barbosa por lavagem de dinheiro, associação para o tráfico e organização criminosa Foto: Reprodução

Comando Vermelho passou a dominar o Amazonas após derrotar facção local e agora disputa área com PCC
Financiadora de ONG com acesso a gabinetes de Brasília, facção surgiu no Rio de Janeiro, no fim dos anos 1970, e tirou a hegemonia da Família do Norte, grupo criminoso do que atuava nas cidades amazonenses.

Por André Shalders

Numa noite de julho de 2017, Adriana Monteiro da Cruz fechava sua barraca de churrasquinho no bairro Novo Aleixo, em Manaus (AM), quando dois homens armados se aproximaram e dispararam tiros contra ela. A vendedora autônoma não resistiu a perfurações no tórax e no abdômen. O Ministério Público do Amazonas apontou que o assassinato foi ordenada por Clemilson dos Santos Farias, o Tio Patinhas, um dos líderes do Comando Vermelho no Estado. Foi por meio de execuções sumárias, intimidações, motins em presídios e repasses ilegais de dinheiro que a facção ampliou, nos últimos anos, sua presença no Amazonas.

Tio Patinhas é casado, há 11 anos, com Luciane Barbosa Farias, a “dama do tráfico”. O Estadão revelou que ela foi recebida duas vezes vezes no Ministério da Justiça, na condição de presidente de uma ONG bancada pela facção.

 

Por que a Amazônia virou alvo da disputa entre PCC, Comando Vermelho e mais 20 facções

Luciane Barbosa se reuniu com dois secretários e dois diretores do Ministério da Justiça em um período de três meses. A revelação levou o órgão a editar às pressas uma portaria mudando as regras de acesso ao Palácio da Justiça, sede da pasta. O prédio fica ao lado do principal acesso ao Congresso Nacional e próximo ao Palácio do Planalto e ao Supremo Tribunal Federal (STF).

O episódio causou desgaste para o ministro Flávio Dino, levando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sair em defesa do auxiliar, e ameaçou a indicação de Dino para o Supremo Tribunal Federal (STF), que se consolidou após a aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) no Senado limitando atuação de ministros da Corte.

Como o Comando Vermelho chegou ao Amazonas

O grupo criminoso chegou a Manaus em 2016. A execução no Novo Aleixo ilustra o avanço da facção no Amazonas de lá para cá. Investigadores da Polícia Civil concluíram que Adriana morreu por engano: o alvo era a irmã dela, Simone Monteiro da Cruz, casada com Francis Olumuyiwa Olufunwa, um dos líderes da Família do Norte (FdN), uma facção que nasceu no interior do Estado.

O crescimento do Comando Vermelho no Amazonas ocorre numa situação de aumento da violência. Em 2022, os Estados da Amazônia Legal registraram uma taxa de homicídio de 26,7 para cada 100 mil habitantes. No País, o índice foi de 19,0 homicídios para cada 100 mil. É tempo ainda de aumento do número de presos.

Os especialistas em segurança pública observam que as cadeias do Norte se tornaram verdadeiros centros de recrutamento para as facções criminosas – da mesma forma que em outras regiões do Brasil.

De 2016, até o primeiro semestre deste ano, a população carcerária na região Norte cresceu 21,9%, mais que a média nacional (18,8%). Hoje, são 63,5 mil encarcerados, sendo 10,6 mil só no Amazonas. Os dados foram compilados pela reportagem do Estadão a partir de informações do Sistema de Informações do Departamento Penitenciário Nacional (Sisdepen), mantido pelo Ministério da Justiça.

Guerra com PCC
No começo deste ano, a Secretaria de Administração Penitenciária (Seap) do Amazonas detalhou a atual da guerra entre CV e PCC no Estado ao pedir a transferência de Patinhas para um presídio federal – o pedido aguarda decisão da Justiça. Segundo documento do órgão, o CV tornou-se dominante a partir de 2020, ao vencer a Família do Norte. Como resposta, pequenos grupos criminosos remanescentes da FdN e recém-surgidos passaram a se aliar ao PCC. Em julho último, a briga entre CV e PCC resultou em dois assassinatos dentro de prisões.

“O PCC está em Manaus, e a chegada dele se deu a partir de um racha (dentro do Comando Vermelho), liderado pelo bandido ‘Cascudo’. Ele não aceitou ser chamado a atenção pelo Conselho (grupo que comanda o CV), e então rompeu com o CV do Amazonas, se aproximou do PCC e levou junto com ele vários outros integrantes que eram do CV ou que já foram da Família do Norte”, afirma o geógrafo Aiala Colares de Oliveira Couto, que é professor da Universidade do Estado do Pará e integra o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. “Tem vários bairros (em Manaus) que hoje estão sob o comando do PCC. Esse racha se deu não tem nem um ano.”

 

No momento, o líder máximo do CV no Amazonas é o traficante Gelson Carnaúba, conhecido como “Mano G”. Antes de integrar o CV, Carnaúba foi um dos fundadores da Família do Norte. Ele é acusado de comandar uma chacina no Complexo Penitenciário Anísio Jobim, o Compaj, em 2002, quando doze presos foram mortos pelo CV. Os mesmos documentos apreendidos pela Polícia Civil do Amazonas que mostram os pagamentos para a ONG de Luciane Barbosa Farias, revelados pelo Estadão, apontam também remessas para Carnaúba, identificado pelo codinome “Amigo de Longe”.

Como o CV age no Amazonas e as orientações via WhatsApp
Elaborado com informações apreendidas no celular de uma integrante do CV, o relatório da Polícia Civil mostra como é a organização da facção no Amazonas. O grupo é comandado por um “Conselho” – do qual Tio Patinhas faz parte. Foi como membro do “Conselho” que ele teve papel de destaque na guerra contra a Família do Norte, a partir de 2016. Hoje, aguarda preso julgamento do caso pelo tribunal do júri.

O Comando Vermelho no Amazonas conta também com uma espécie de Conselho de Sentença, tribunal do crime, formado pelos líderes do grupo para determinar até penas capitais”, segundo a Polícia Civil. Abaixo do Conselho estão os representantes de cada município ou região de Manaus, chamados de “Geral”.

O “Geral” de determinada localidade é auxiliado por um “Frente”. Os “frentes” coordenam “os trabalhos locais e dirimem conflitos entre seus associados. Também levam as demandas de seus associados para que sejam solucionadas pelo Conselho”. Por fim, cada local tem um tesoureiro, chamado pela facção de “Torre”. “Esses são responsáveis por coletar o dinheiro do que chamam de ‘Caixinha’ (uma espécie de contribuição sindical do crime)”, diz o relatório da Polícia Civil.

Complexo Penitenciário Anísio Jobim, o Compaj, onde doze presos foram mortos pelo CV sob o comando de Gelson Carnaúba

A facção chegava a distribuir, via WhatsApp, as informações sobre o balanço das contas do mês, sob o título de “Transparência CV-AM”. “O Comando Vermelho que articula as coisas na Amazônia é um CV diferente do CV do Rio de Janeiro. São várias células espalhadas por vários municípios de vários Estados”, explica Aiala Colares. “Não é uma autonomia, porque há um Conselho, que é composto por integrantes da região amazônica e do Rio de Janeiro, onde está o comando máximo. Muitas decisões partem do comando geral, deste Conselho”, diz ele.

Guerra por território promoveu uma “verdadeira barbárie

Em 2018, o delegado da Polícia Civil do Amazonas Ivo Henrique Moreira Martins pediu a prisão de Tio Patinhas. Num documento, registrou uma disputa “escancarada” entre os faccionados comandados por José Roberto Fernandes (FdN) contra os comandados por Gelson Lima Carnaúba (Comando Vermelho). A guerra por território promoveu uma “verdadeira barbárie”, escreveu. “Com a prisão de Gelson, quem dita as ordens do Comando Vermelho é justamente Clemilson dos Santos Farias.”

Um outro trecho do documento destaca que Clemilson tinha a função de estruturar o CV-AM, fomentando, ainda mais, a disputa por pontos de vendas de drogas contra integrantes da Família do Norte. O delegado aponta que, consequentemente, ele contribuiu para aumentar os índices de criminalidade e homicídios na cidade de Manaus.

Segundo investigadores, a ação contra Adriana Monteiro da Cruz foi o revide a um atentado da Família do Norte contra Patinhas, em 2015, ao qual ele sobreviveu. No mesmo ano, Clemilson foi para a prisão pela primeira vez, após ser pego em Manaus portando ilegalmente uma arma. Por fim, após uma série de execuções, o Comando Vermelho venceu a guerra contra a FdN. Hoje, o inimigo do CV em Manaus é o Primeiro Comando da Capital (PCC), de origem paulista.

Ainda em abril de 2018, um homem foi encontrado morto em um terreno baldio no bairro de Puraquequara, na Zona Leste de Manaus. Preso ao rosto dele, havia um cartaz com os dizeres “Tava devendo Mano Alex e Tio Patinhas”. Também é atribuído ao líder do Comando Vermelho o homicídio a facadas de um mototaxista de 23 anos em Autazes (AM), a 107 quilômetros de Manaus. A família da vítima ficou sabendo da morte por meio de um vídeo, que circulou no WhatsApp.

Com a prisão de Gelson, quem dita as ordens do Comando Vermelho é justamente Clemilson dos Santos Farias (o Tio Patinhas)
Henrique Moreira Martins, delegado da Polícia Civil do Amazonas

Em maio do mesmo ano, Clemilson teria participado da fuga de 35 presos do Centro de Detenção Provisório Masculino II (CDPM II), por meio de um túnel. Segundo relatório da PC-AM, a fuga foi “planejada e financiada por integrantes do CV-AM”, com a finalidade, ainda segundo o documento, “de oxigenar a atuação da organização criminosa no Estado”.

 

Patinhas teria também ordenado a execução de dois homens dentro de um motel de Cidade de Deus, na zona norte da capital do Amazonas, como parte de um acerto de contas. Rodrigo Pinheiro de Souza, 20 e Menison Bezerra Gomes, 23, foram baleados enquanto estavam com duas mulheres. Pinheiro morreu na hora, mas Menison sobreviveu ao ataque. Em depoimento, atribuiu a Tio Patinhas a responsabilidade pelo ataque.

Os crimes da “dama do tráfico”
À frente do Instituto Liberdade do Amazonas que a mulher de Tio Patinhas teve acesso aos gabinetes das pastas da Justiça e dos Direitos Humanos. A entidade está longe de ser uma simples entidade de apoio a detentos. Um relatório sigiloso da Polícia Civil mostra recibos de pagamentos do “tesoureiro” do Comando Vermelho no Amazonas, Alexsandro B. Fonseca, o “Brutinho”, para a organização, no valor de R$ 22,5 mil, para o mês de fevereiro. O relatório traz ainda uma espécie de planilha de custos do Instituto Liberdade do Amazonas, sugerindo que todas as despesas da ONG eram pagas pela facção.

A denúncia do Ministério Público do Amazonas, apresentada em agosto de 2018, registra que Luciane Barbosa Farias atuava como “braço financeiro” do marido, sendo responsável pela lavagem de dinheiro do tráfico da facção. Essa denúncia foi rejeitada pela juíza de primeira instância, mas aceita pela desembargadora que revisou o caso, em outubro deste ano. Resultou na condenação de Luciane a dez anos de prisão pelos crimes de associação para o tráfico, lavagem de dinheiro e formação de organização criminosa. Ela atualmente recorre em liberdade.

Se o Amazonas abriga hoje uma das principais “sucursais” do Comando Vermelho, a “matriz” é no Rio de Janeiro. A facção surgiu no final dos anos 1970 no antigo Instituto Penal Cândido Mendes, uma colônia penal instalada na Ilha Grande, a 150 km da capital do Estado. Surgiu graças à decisão do Regime Militar de misturar presos políticos de esquerda – que ficavam na antiga Galeria da LSN, a Lei de Segurança Nacional – com detentos comuns. No começo, o grupo se chamava Falange Vermelha, em alusão à posição política de esquerda de alguns de seus fundadores. A origem do grupo é narrada por um de seus criadores, William da Silva Lima, no livro Quatrocentos Contra Um (1991).

 

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