Cristina Pereira fica com raiva quando a chamam de velhinha

Cristina Pereira é Prazeres em “Pega pega”
Cristina Pereira é Prazeres em “Pega pega” Foto: Fábio Guimarães / Agência O Globo
Regiane Jesus

A volta de Cristina Pereira à Globo no ano passado como Safira Abdala em “Haja coração” não foi fato isolado. Após cair novamente nas graças do público ao fazer uma espécie de revisita a Fedora, personagem que a consagrou na TV em “Sassaricando” (1982), a atriz, de 67 anos, vive agora a divertida Prazeres de “Pega pega”. Nesta entrevista, ela abre seu baú de memórias, fala sem ressentimentos da ausência de mocinhas no currículo, sobre não se adequar aos padrões de beleza, os altos e baixos da carreira, envelhecimento e muito mais: “Idoso deve ter liberdade para namorar e ter fantasias sexuais”.

“Haja coração” (2016) marcou sua volta à Globo após 11 anos de afastamento e lhe rendeu o convite para fazer Prazeres, em “Pega pega”. O que representa ter sido redescoberta pela emissora?

Uma coisa muito boa! “Haja coração” foi uma participação afetiva porque Fedora — vivida na trama de Daniel Ortiz por Tatá Werneck — foi a mocinha da minha carreira. Ela era muito doida, mas também eu nunca faria uma mocinha normal porque não sou muito normal (risos). Brincar que era uma parente da Fedora quase 30 anos depois de interpretá-la foi demais! Emendei logo com “Pega pega”. Estou muito feliz com essa volta à Globo.

Sentiu falta de fazer uma heroína clássica ao longo dos seus 48 anos de carreira?

Não tenho o biotipo. Se hoje tivesse 20 anos, talvez até fizesse uma mocinha porque atualmente existe elasticidade, flexibilidade, no conceito de beleza. Antigamente, ninguém podia ser diferente. Hoje, o diferente é até mais charmoso, mais bonito.

Cristina Pereira e Tatá Werneck) em
Cristina Pereira e Tatá Werneck) em “Haja coração” Foto: Estevam Avellar/Rede Globo/Divulgação

Estar fora dos padrões de beleza atrapalhou sua carreira?

De jeito nenhum! Não tenho tristeza em relação a isso porque fiz trabalhos muito interessantes. Nunca fui vaidosa. Mais jovem, saía de casa descabelada, sem passar um batom na boca. Sempre fui muito simples.

Altos e baixos são comuns na profissão. Passou por dificuldades?

Fiquei desempregada muitas vezes, mas nunca passei sufoco a ponto de não ter o que dar para os meus filhos comerem. Consegui viver dignamente de teatro. E, quando fazia uma peça que não era suficiente para o meu sustento, dava aulas de interpretação. Também escrevi teatro, dirigi, fui coordenadora da Funarte, trabalhei na Casa da Gávea… Não ficava sentada esperando aparecer um convite para uma personagem de novela.

Cristina Pereira e Nicette Bruno contracenam em “Pega pega”
Cristina Pereira e Nicette Bruno contracenam em “Pega pega” Foto: Rafael Lima/Rede Globo/Divulgação / Rafael Lima

Você se mudou para São Cristóvão há seis anos, o que na época gerou especulações sobre sua situação financeira. Afinal, por que trocou a Gávea pelo Bairro Imperial?

O estranhamento se deu porque, normalmente, as pessoas fazem o caminho contrário, ou seja, saem da Zona Norte e vão para a Zona Sul. Fiz o inverso porque morei 28 anos na Gávea de aluguel e quis ter minha casa própria. Como não tinha dinheiro para comprar um imóvel na Gávea, comprei em São Cristóvão, num condomínio novo. O bairro é um lugar histórico, merecia um outro olhar. Me apaixonei pelo lugar e não quero mais sair de lá.

Você está com 67 anos. Como lida com o passar do tempo?

Minha idade é maravilhosa, o que me incomoda é ser chamada de velhinha. Quando se referem a mim e a Nicette (Bruno) como as velhinhas de “Pega pega”, fico com raiva, grilada. Não me sinto uma velhinha, eu não encaretei. Pertenço a uma juventude hippie, livre, que discutiu valores, como a liberdade sexual. Minha geração não se encaixa no estereótipo do idoso. Sou aberta para a modernidade, e Prazeres também! Ela é, inclusive, erotizada e tem fantasias sexuais. O idoso deve ter liberdade para namorar, para ter fantasias sexuais. E, se não tiver vontade de ter vida sexual, também não é pecado.

Você está namorando?

Estou solteira. Eu me casei, me separei, tive namorados… Não sou obcecada por esse assunto como a Prazeres (risos). Se aparecer alguém que seja bacana, tudo bem. O bom da terceira idade é não ter mais que dar satisfação para ninguém. Já criei meus filhos (a atriz é mãe de Letícia, de 37 anos, Lourenço, de 27, e avó de Augusto, de 5), cumpri várias missões, está tudo certo!

Qual é o lado ruim de envelhecer?

A invisibilidade e a perda da credibilidade. Se minha internet cai e ligo para a operadora para pedir que consertem, a primeira coisa que perguntam, quando percebem na minha voz que tenho mais idade, é se o aparelho está ligado na tomada. Respondo: “É claro!”. Sem falar que as pessoas não ligam para o que o idoso pensa. É preciso ser forte e saber se colocar muito bem para ser ouvido.

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