Delegado quis evitar ‘conotação política’ de assassinato de Marielle e exigiu que morte não ocorresse no trajeto para a Câmara, diz Lessa

Por Sarah Teófilo  e Jeniffer Gularte, do Extra

Em depoimento à Polícia Federal, o ex-policial militar Ronnie Lessa, preso em março de 2019 pela participação nas mortes da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, afirmou que o então chefe da delegacia de homicídios do Rio de Janeiro, Rivaldo Barbosa, exigiu que a Marielle não fosse executada no trajeto de deslocamento para a Câmara do RJ para evitar suspeita de conotação política do crime.

A informação é destacada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) em manifestação que pede a prisão de Rivaldo, do deputado federal Chiquinho Brazão (União-RJ), do conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio (TCE-RJ) Domingos Brazão, os dois últimos apontados como mandantes dos homicídios.

“Em relação a Rivaldo Barbosa, Ronnie Lessa declarou que aceitou a empreitada homicida, pois os irmãos Brazão expressamente afirmaram que o então chefe da Divisão de Homicídios da PCERJ teria contribuído para preparação do crime, colaborando ativamente na construção do plano de execução e assegurando que não haveria atuação repressiva por parte da Polícia Civil. Ronnie pontuou que Rivaldo exigiu que o M.F. da S. [Marielle Francisco da Silva] não fosse executada em trajeto de deslocamento de ou para a Câmara Municipal do Rio de Janeiro, pois tal fato destacaria a conotação política do homicídio, levando pressão às forças policiais para uma resposta eficiente”, diz a PGR.

Em delação premiada, Ronnie Lessa declarou que aceitou cometer o crime, pois os irmãos Brazão expressamente afirmaram que o então chefe da Divisão de Homicídios da Polícia Civil do Rio de Janeiro “teria contribuído para preparação do crime, colaborando ativamente na construção do plano de execução e assegurando que não haveria atuação repressiva por parte da Polícia Civil”.

Dentre os trechos da delação, a PGR destaca um no qual Lessa diz que as exigências de Rivaldo foram repassadas a ele por Domingos.

— O Rivaldo disse que não poderia ser de outra forma; ele foi bem firme nisso, foi contundente, então não é não, e não pode porque o Rivaldo não quer. Então, na verdade nós sentimos até bastante firmeza pela magnitude da coisa, tá lidando com o diretor da DH [Delegacia de Homicídio]; se o diretor da DH faz uma exigência dessa, na minha concepção ele já tem uma linha traçada pra desviar o assunto — disse Lessa.

A procuradoria ressaltou que após as execuções dos crimes, Rivaldo, que passou a ser chefe da Polícia Civil, “indicou o delegado Giniton Lages para as investigações, ajustando com a autoridade policial que as investigações deveriam ser dirigidas de forma a não revelar os mandantes do crime”. Lages foi alvo de medidas cautelares na operação deste domingo.

Incriminar

 

Com a repercussão dos crimes, Ronnie Lessa afirmou que foi feita uma nova reunião com os irmãos Brazão, ocasião em que eles “teriam assegurado que Rivaldo teria direcionado a investigação de modo a incriminar indivíduos que não participaram dos crimes, assegurando-se a impunidade do grupo”. Segundo Lessa, os dois indicaram que a Polícia Civil incriminaria falsamente o miliciano Orlando Araújo, o Orlando Curicica, e o ex-vereador Marcello Siciliano, ambos que chegaram a ser acusados pelas mortes de Marielle e Anderson.

Jogos ilegais

 

A PGR citou, ainda, que no aprofundamento das investigações, a PF desvendou que havia um “esquema estrutural de corrupção na Delegacia de Homicídios do Rio de Janeiro, conduzido por Rivaldo Barbosa, a quem competia manter acordos ilegais com grandes contraventores do município, com o intuito de encobrir a autoria e a motivação dos crimes violentos ligados à exploração de jogos ilegais”.

“Esses ajustes indicam a razão pela qual homicídios de grande repercussão na Capital Fluminense jamais eram esclarecidos”, frisou a procuradoria.

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