Direita abraça Temer, mas não confia no PMDB
Está claro qual é o teor do projeto econômico da direita, aqui bem representada pelos jornais carioca e paulistano: o rigor fiscal deve se sobrepor às demandas sociais. Emerge do editorial da Folha, nesse contexto, um passo adiante do conservadorismo.
Diz o editorial do jornal paulista que a idade mínima para a aposentadoria é mais do que necessária, ponto pacífico entre os partidos, já que até mesmo o PT do Lula da Carta do Povo Brasileiro a defenderia.
Até aí tudo bem.
Adiante, contudo, plena de coragem com a intensidade da crise, a direita sugere um projeto ainda mais ortodoxo, com o fim das vinculações constitucionais mínimas de recursos para investimentos em educação e saúde.
Diz o editorial da Folha que “o partido (PMDB) advoga o fim dos gastos obrigatórios com saúde e educação, permitindo aos gestores do Orçamento maior flexibilidade. Na dose certa, a medida faz sentido. Não há política social possível quando as contas do governo estão em desequilíbrio; nenhum voluntarismo orçamentário sobrevive às injunções de uma dívida crescente e da elevação da taxa de juros.”
Quem aplicou tal receituário com obediência, mantendo o Brasil como a Meca da desigualdade nos anos 1990, foi Fernando Henrique Cardoso. Pode-se depreender daí a preferência da direita pelo PSDB, embora omitida no editorial, já que sem Michel Temer não há transição serena possível.
Resta evidente então que o PMDB não é o preferido para cozinhar uma transição sem traumas. A receita está correta, já o cozinheiro…
Argumentam os Frias:
“Cronicamente identificado como uma federação de interesses fisiológicos, o partido traz à luz um documento no geral sensato e positivo no que diz respeito à política econômica. Hesita-se, portanto, entre recebê-lo com algum ânimo ou com o mais puro ceticismo.”
“Com esse conjunto de propostas, o PMDB se habilita a apresentar-se, em algum momento, como alternativa viável de poder. Afasta-se do papel subalterno que vinha exercendo no esquema petista.”
“Mas é nesse ponto que sua credibilidade parece em xeque. A atuação do PMDB tem-se caracterizado de outra maneira. Oportunismo, fisiologismo e demagogia marcam as atitudes da bancada.”
O jornal não aponta a solução, contudo. Resume-se à advertência e à orientação pela vigilância, já que as oscilações políticas são próprias de momentos de crise:
“A mera perspectiva de alcançar o poder federal –como ocorreu com Lula em 2002– tende a ditar algum realismo nas propostas anunciadas. O calendário para tal bom senso varia, contudo, e o próprio PMDB oscila entre o impeachment e as eleições de 2018.”
Golpismo entusiasmado
A Folha deu um passo além, esfriando um pouco o ânimo dos Marinho, para quem, ao que parece, extirpar o PT seria a solução de todos os problemas, como se o PMDB não fizesse parte dele desde a redemocratização.
Na verdade, o entusiasmo com que O Globo saudou o texto “Uma ponte para o futuro” escancara o elã golpista da grã família carioca. Não apenas analtece as medidas propostas como aproveita para desancar a política econômica “perdulária” do PT.
Derrete-se O Globo:
“O PMDB identifica dois eixos que levaram o Brasil à situação de efetivo estrangulamento fiscal, mesmo com enorme carga tributária: um grande volume de despesas obrigatórias que engessam o Orçamento e, tão grave quanto, várias delas indexadas à inflação ou, pior, ao salário mínimo.”
“Este gesso precisa ser rompido, bem como desligados os mecanismos de indexação, pelos quais as despesas aumentam, mesmo quando as receitas tributárias e a renda da população encolhem, veneno mortal para qualquer país.”
É mais do mesmo velho e surrado discurso dos ortodoxos. Para honrar contratos, salvar bancos quebrados, pagar juros da dívida e estimular o capital especulativo todo rigor fiscal é válido. Tirar 20 milhões de brasileiros da pobreza extrema é irrelevante.
O Plano Temer de resgate da credibilidade política e econômica no país subiu no telhado. Saudado em editorial do jornal o Globo da família Marinho como um alicerce de referências corretas para balizar um grande e necessário acordo entre partidos e a sociedade, o texto “Uma ponte para o futuro” teve também seu conteúdo aplaudido pela Folha de S. Paulo em editorial neste sábado (31). O senão dos Frias é que o PMDB, “fisiológico”, “oportunista” e “demagogo”, não tem os predicados necessários, ao contrário, para levar adiante um projeto de unidade nacional.