Em São Paulo, 40% dos roubos são praticados com armas de brinquedo

Um levantamento feito pelo Instituto Sou da Paz aponta que quatro em cada dez armas – 37,6% – apreendidas pela polícia em assaltos na cidade de São Paulo eram réplicas não letais – mas muito parecidas – com armas de fogo. Mas, apesar de inofensivas, o pânico de estar diante delas é igual ao causado por uma de verdade.

“O trauma de quem tem uma arma encostada na cabeça, seja de brinquedo ou seja de verdade, é o mesmo”, diz Bruno Langeani, coordenador de segurança pública do Instituto da Paz. Ele argumenta que os bandidos começaram a recorrer às armas de brinquedo após o Estatuto do Desarmamento, de 2003, endurecer as regras para obtenção de armas de fogo. “Isso significa que há menos armas disponíveis no mercado ilegal. Se o assaltante pudesse escolher é óbvio que seria por uma de verdade.”

Apesar dos efeitos positivos, há brechas no mesmo estatuto que permitem a comercialização desenfreada de protótipos idênticos a revólveres, pistolas, metralhadoras e fuzis no Brasil. A legislação proíbe a venda e fabricação, mas não prevê punição para quem as vende – nem mesmo a aplicação de multa. Assim, um bandido só pode ser preso se for pego em flagrante. Já as armas de brinquedo ficam à disposição de quem quiser comprá-las. Em uma rápida pesquisa pela internet, é possível encontrar diversos sites que comercializam armas de brinquedo idênticas aos modelos originais.

As diferenças entre uma arma de verdade e uma falsa são imperceptíveis, sobretudo, quando o cidadão está sob o estresse de um assalto. “Se para um policial já é difícil distinguir, imagine para uma pessoa comum na hora do susto”, disse Langeani. Por isso, prevalece a recomendação da polícia de não reagir em uma situação como essas. “Continuamos recomendando que as pessoas tenham cautela”, disse o secretário de Segurança Pública de São Paulo, Fernando Grella, sobre o levantamento.

Casos – No dia 3 de dezembro, o sobrinho do cantor e vice-prefeito de São Bernardo do Campo (SP), Frank Aguiar, foi vítima de um sequestro relâmpago. Dois adolescentes, de 16 e 17 anos, abordaram o empresário Lucas Guideli Prado, de 24 anos, com uma arma de brinquedo quando ele estava parado em um semáforo no ABC paulista. Mesmo sendo fisiculturista, ele não reagiu e foi levado pelos menores. Uma testemunha, que estava no carro de trás e percebeu o sequestro, chamou a polícia e informou o modelo do automóvel de Prado.

Seguidos pela Polícia Militar, os bandidos foram surpreendidos quando estacionavam o veículo em uma agência bancária para sacar o dinheiro da vítima. Os dois menores foram apreendidos e só depois a polícia descobriu que arma que eles usaram no crime era falsa. “A sensação de ter uma arma apontada para você é horrível. Destrói o seu psicológico”, disse Prado.

Mesmo inofensiva, a arma de brinquedo pode terminar em tragédia. No dia 2 de novembro, Tharcisio Oliveira Rodrigues, de 23 anos, tentou assaltar um policial, que revidou atirando três vezes contra ele, em Guarulhos, na região metropolitana de São Paulo. Segundo a Secretaria de Segurança Pública do Estado, o PM só percebeu que foi ameaçado com uma arma de “mentira” quando Rodrigues já estava morto no chão.

Vizinhos do casal de PMs mortos na Vila Brasilândia, na Zona Norte da capital paulista, relataram que o filho Marcelo Pesseghini, de 13 anos, apontado pela polícia como o autor do crime, costumava praticar tiro no quintal com armas de pressão. Segundo os investigadores, no dia 4 de agosto, ele apanhou uma pistola .40, de propriedade da mãe, e executou os pais, a tia-avó e a avó, com a precisão de um profissional. Depois, teria atirado contra si mesmo. Fissurado por jogos violentos e com fácil acesso às armas dos pais, Marcelinho – como era chamado pelos amigos – foi diagnosticado pelo psiquiatra forense Guido Palomba como psicopata.

Legislação – No Estado de São Paulo, um projeto de lei, de autoria do deputado André do Prado (PR), estabelece penalizações para comercialização de armas de brinquedo, como ocorre no Distrito Federal. O projeto foi aprovado pela Assembleia Legislativa paulista em dezembro de 2012, mas foi vetado pela governador Geraldo Alckmin (PSDB), segundo quem a deliberação do tema é de competência do governo federal. No Congresso Nacional, um projeto do deputado Enio Bacci (PDT-RS) sobre o tema está em tramitação na Câmara.

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