Da Folha de São Paulo
A crítica de Tabata Amaral (PSB) de que o adversário Guilherme Boulos (PSOL) fez “safadeza” ou “estatística criativa” numa publicação nas redes sociais levou à comparação no eleitorado progressista de que a deputada vai agir não como uma Simone Tebet (MDB), mas sim como um Ciro Gomes (PDT).
Rivais do prefeito Ricardo Nunes (MDB) na eleição da capital paulista, Boulos e Tabata se aproximam pela atuação no campo da esquerda e compõem a base do presidente Lula (PT), o que criou uma expectativa de pacto de não agressão e de apoio mútuo no segundo turno.
Num pleito que espelha a última eleição presidencial, com a repetição da polarização nacional entre petistas e bolsonaristas, Tabata, ao buscar seu eleitorado na estrangulada terceira via e se opor à extrema direita, desempenharia o papel de Tebet, que se uniu a Lula no segundo turno.
Mas, por não poupar o psolista, Tabata tem sido chamada nas redes sociais por eleitores do PT e do PSOL de Ciro, candidato que mirou em Lula em 2022 e, com isso, teria inflado o antipetismo.
A comparação, no entanto, é rejeitada pela deputada e pelo entorno de Boulos, que ainda conta com o apoio de Tabata no segundo turno e, por isso, tem evitado o embate com ela.
Aliados de Tabata admitem o paralelo com Ciro no sentido de que, assim como o pedetista em 2022, ela não cumprirá a função de linha auxiliar no pleito municipal. Eles afirmam que ela não aceitará ser colocada num lugar secundário e que não adotará uma postura complacente.
Questionada pela Folha ontem, Tabata não quis comentar as comparações com Ciro nas redes. “No dia em que eu me preocupar com o Twitter, por favor me retirem dessa disputa. Porque aí só vou dialogar para a bolha”, disse.
“Nunca achem que eu vou ter um posicionamento ou uma atitude para agradar essas bolhas que não representam a sociedade. O Twitter vai chiar, vai falar mal e está tudo bem.”
Na última terça (5), depois que Boulos publicou um gráfico com uma combinação de cenários de uma pesquisa e a excluiu entre os adversários, Tabata gravou um vídeo insinuando que ele distorceu o levantamento para prejudicá-la.
Atendendo a ações movidas por Tabata e por Nunes, a Justiça Eleitoral determinou que Boulos retirasse o post do ar. Segundo o psolista, a intenção do gráfico era compará-lo somente aos adversários do campo bolsonarista e, por isso, ela foi excluída.
Questionado sobre o episódio, Boulos não quis comentar um possível pacto de não agressão com Tabata, evitou criticá-la e disse que a considera uma “grande parlamentar da bancada da educação”.
“Não vou ficar entrando em bate-boca de internet, não me cabe isso. […] Eu tenho maior respeito pela Tabata, acho que a pré-candidatura dela contribui para a qualificação do processo eleitoral. […] Ela faz parte de um campo político democrático e vai expressar isso no processo eleitoral”, afirmou.
Em outras ocasiões, Tabata também voltou-se contra Boulos. Em entrevista à Folha, em setembro passado, ela disse que o radicalismo não era o maior problema do deputado, mas sim “a falta de seriedade e maturidade”.
Apesar da resposta dura do ex-presidente do PSOL Juliano Medeiros ao vídeo de Tabata, a orientação na equipe de Boulos é a de não inflar o confronto.
“Quando um não quer, dois não brigam. Nossa postura não é de brigar com ela, vamos centrar combate no bolsonarismo e no seu representante, Ricardo Nunes”, diz o deputado estadual Donato (PT), um dos coordenadores do programa de governo de Boulos.
“Não vejo por que não teria como dialogar com ela para ter o apoio dela no segundo turno. Da mesma forma, se for ela que estiver no segundo turno, a gente não teria nenhuma dúvida em apoiá-la”, resume o petista.
Donato diz ainda que é “inadequado” compará-la com Ciro e que o episódio do post “não vai dar o tom da relação entre Tabata e Boulos”. O deputado afirma que ela não trata Boulos como alvo prioritário e tem denunciado irregularidades de Nunes.
Outros estrategistas de Boulos minimizam o embate com a deputada, afirmam que ela tem legitimidade para definir sua tática eleitoral e que faz parte do jogo receber ataques.
Já a equipe de Tabata avalia que aliados de Boulos esperavam dela uma postura de não agressão e de apoio no segundo turno, como aconteceu com Tebet. Para eles, o entorno do deputado, incluindo Lula, tenta criar um clima de parceria entre os dois, como se ela fosse “café com leite”.
Um exemplo da construção dessa narrativa estaria no elogio de Lula à parlamentar, ao afirmar que ela é uma jovem com futuro político —a fala incluiria uma mensagem subliminar de que hoje ela não está pronta para a função.
Pesquisas internas indicam que Tabata consegue avançar tanto sobre o eleitorado de Boulos quanto de Nunes e, portanto, não haveria motivo para poupar o psolista das críticas.
Também existe a avaliação de que a campanha municipal é uma ferramenta para Tabata se posicionar no tabuleiro político e trabalhar sua imagem, mesmo que não consiga vencer. Assim, não faria sentido assumir uma postura tímida.
“Ela não começou essa confusão relacionada ao gráfico. Na medida em que os candidatos tentam fazer com que ela seja invisível, claro que ela também precisa se apresentar. Sempre com elegância, com argumento”, afirma o deputado estadual Caio França (PSB).
“A Tabata vai cumprir um papel muito importante na campanha. Se fosse para aderir a uma das candidaturas, era melhor não ser candidata”, completa.
O cientista político Marco Teixeira, da FGV-SP, diz que a comparação de Tabata com Ciro é infeliz. “É outra eleição, outro perfil. A Tabata não é o Ciro, não é agressiva, não sai xingando.”
Na opinião dele, essa comparação pode inclusive gerar prejuízo para a campanha de Boulos se atrapalhar o eventual apoio dela no segundo turno. “Não é algo que agregue à campanha do Boulos e só gera tensão. Ainda mais que a relação de Lula e Ciro é tensa. É chamar um problema para si”, diz.
Teixeira avalia que a estratégia de Boulos é reeditar a polarização nacional, e esse parece ter sido o motivo para excluir Tabata do gráfico. “[Ele está] olhando para trás, com a lembrança de que Bolsonaro perdeu para Lula na cidade. Mas Boulos tem que lembrar que tem um teto e que, se queimar possíveis aliados de segundo turno, isso pode ser decisivo.”