Estudo revela que metade dos brasileiros não está feliz com a vida sexual

Daniela*, 35 anos, é bonita, solteira, independente, tem vários parceiros sexuais. Mas orgasmo a dois que é bom, nada. O prazer quase sempre vem solitário, proporcionado pela masturbação. “Nunca me realizo por completo. Não sei se é porque são casos e não relacionamentos sérios, mas sinto que falta algo”, admite Daniela.

Ela engrossa a lista dos brasileiros que declaram que estão insatisfeitos com a vida sexual. Esse número não é pequeno. Pesquisa lançada na última terça-feira pela Durex Global Sexy Survey, entrevistou 1.004 brasileiros, entre homens e mulheres de 18 a 64 anos, e constatou que metade deles não vivencia um sexo tão bom quanto gostaria.

E as mulheres são as que menos sentem prazer. Do total de entrevistados insatisfeitos, 56% são do sexo feminino. Por outro lado, a mesma pesquisa aponta que sete em cada 10 homens encaram a satisfação da parceira como uma obrigação.

Eis que surge uma contradição: se os homens estão afim de agradar as mulheres, por que danado é que elas estão tão infelizes sexualmente? “Hoje em dia a satisfação da mulher importa para o homem. E reflete um narcisismo masculino que não é pejorativo. Ao contrário, eles se satisfazem quando dão prazer às parceiras”, explica a psiquiatra Carmita Abdo, coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo.

Lúcio*, 36, avisa que o prazer da sua parceira vem em primeiro lugar. “Para o homem é bem mais fácil atingir o orgasmo, por isso me preocupo em não ir muito rápido aos finalmentes”, diz. Sendo assim, para Carmita, o orgasmo feminino depende da mulher. “Ela é que tem que conhecer o próprio corpo e dar esse conhecimento ao homem”, completa a psiquiatra.

A sexóloga Silvana Melo acredita que não é tão simples assim. Os homens também têm culpa no cartório. “Por trás dessa declarada vontade de satisfazer há uma autocobrança em relação à performance sexual perfeita”, explica. O fato é que, mesmo em tempos de pós-revolução sexual, sexo ainda é tabu para muita gente.

Se por um lado caras como Lúcio* juram de pés juntos que o prazer da parceira vem em primeiro lugar, por outro, mulheres como Daniela* não querem decepcioná-los. “É um comportamento meio submisso”, admite Daniela. E essa atitude tem a ver com a educação. “Ainda existe um resquício do comportamento anterior à revolução sexual dos anos 60”, diz a sexóloga Silvana. Não à toa, mais de 60% tem dificuldade de admitir que têm problemas sexuais.

E isso inclui os homens. Para o mestre em filosofia do direito Lucas Camarotti, 27, essa história de os homens dizerem que só ficam satisfeitos sexualmente se satisfizerem suas parceiras soa mais como um dever do que como um prazer. “A educação sexual parece cheia de regras e deveres. Tem muitos caras que não gostam tanto de sexo quanto são obrigados a admitir e poderiam gostar mais se não tivessem essa carga de obrigação”, acredita Lucas. Ele diz ainda que para sentir prazer não tem que depender sempre do prazer do outro. “Eu gosto de fazer minha parceira ter orgasmo, mas não necessariamente cobro isso dela”.

Se o orgasmo é um termômetro da relação, a coisa não anda muito boa para as mulheres. Enquanto 52% dos homens declaram que sempre chegam lá, somente 22% das mulheres conseguem o mesmo. Para resolver esse problema, as especialistas receitam doses cavalares de intimidade e autoconhecimento. “As mulheres precisam se conhecer e passar esse conhecimento aos homens”, aconselha Carmita. Joana*, 30, acredita piamente que sexo bom tem a ver com a tal química do casal. “Os dois têm que funcionar juntos, sem frescura nem pudor”. Mas Joana acha que não é preciso falar para o outro o que quer. “Gosto quando encontro um parceiro que me entende, sem ficar pedindo, explicando”.

Quando isso não acontece, uma conversa pode fazer muito bem. “A qualidade passa pela intimidade. É importante um diálogo aberto”, avisa Silvana. Preliminares mais elaboradas, segundo a sexóloga, também podem ser a solução para as mulheres, que naturalmente precisam de mais estímulos para chegar ao orgasmo. E de mais tempo. A pesquisa aponta que 40% dos brasileiros dedicam de cinco a 15 minutos às preliminares. Pelo visto, é muito pouco. “E muitos homens não tocam as mulheres como elas querem. Não é que sejam grosseiros, mas tocam pesado. E isso vem da educação genitalizada que receberam. Preferem ir direto no seio, vulva e nádegas. Afinal, foram educados assim. Tenho pacientes que tiveram a iniciação sexual com prostitutas que não estavam preocupadas com o próprio prazer”, analisa Silvana.

É justamente educação sexual o que nos falta para abandonarmos velhos pensamentos. Apesar de a pesquisa apontar que 40% das mulheres e 58% dos homens acham aceitável que o primeiro encontro termine em sexo, muita gente ainda acredita que esse relacionamento não tem muitas chances de seguir adiante. “Muitos homens continuam achando que, se a mulher transou com ele, vai transar com qualquer um”, justifica Carmita. O historiador Tiago Maranhão, 32, no entanto, discorda. “Para mim a transa na primeira noite pode afirmar uma escolha prévia de querer ou não algo mais sério a posteriori. Transei com a minha ex na primeira noite e ficamos cinco anos juntos. E já fiquei com outras mulheres, só por uma noite, e sem nem precisar transar eu já sabia que não teria mais nada com elas”, comenta.

Ao menos no quesito preservativo, o brasileiro anda bem educadinho em relação a outros povos. A pesquisa aponta que somos os que mais usam camisinha na primeira relação sexual: 66% dos entrevistados têm esse hábito. Mas basta a relação engrenar para esse dado cair para 20%. “As pessoas confundem estabilidade com exclusividade. Acham que não existe perigo e acabam negligenciando uma proteção numa relação mais fortuita”, adverte Carmita.

No começo dos relacionamento, Júlia*, 37, costuma usar camisinha porque ainda não conhece a pessoa e tem medo de possíveis doenças ou de gravidez. Mas logo o preservativo é deixado de lado. “Atrapalha na hora H, tem que parar para colocar…. Tem que ser bem lubrificada senão fica a sensação de estar transando com um boneco de plástico. Para afastar o risco de uma gravidez, tomo pílula”, conta Júlia, que viveu um relacionamento de 20 anos e com o sexo sempre aceso. Ela é mais uma entre os 69% dos brasileiros que concordam que é possível manter o desejo mesmo em relacionamentos de longa duração. Basta ser criativo. “Tinha sempre uma novidade, tipo transar na sala, durante o banho… Às vezes uma posição levemente diferente faz muita diferença”, conta Júlia.

A rotina é que é a grande inimiga. “Com o tempo, vão começando a surgir defeitos, mágoas que são um veneno para o desejo sexual. O ideal é fazer tudo para evitar: não acumular mágoas, reservar um tempo para os dois, fazer coisas legais juntos e surpreender de vez em quando”, aconselha Silvana.  (Carol Botelho/NE10)

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