Farras da emendas: TCE aponta superfaturamento e propaganda política na execução das emendas para shows
De acordo com o levantamento do TCE, entre janeiro e julho de 2014, quase R$ 25 milhões em emendas parlamentares foram destinadas para contratações de apresentações musicais. Os técnicos também concluíram que houve um sobrepreço de R$ 522 mil no pagamento de shows
Carolina Albuquerque
Atual deputado federal João Fernando Coutinho (PSB), um dos citados no relatório do TCE
Por meio da Auditoria Especial de número 1405301-9, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) aprofundou as investigações sobre a “farra” de emendas parlamentares destinadas para contratação de shows. O caso foi revelado em uma série de reportagem do JC em 2014. No relatório técnico, ao qual o JC teve acesso por meio da Resolução de número 10 de 2015, várias irregularidades são reveladas: indícios de superfaturamento nas contratações pela Empetur resultantes de emendas ou não; propaganda política e pessoal de deputado e prefeito durante esses eventos; relações interpessoais entre deputado e produtora que recebeu o recurso público; eventos privados pagos com dinheiro público. De acordo com o levantamento do TCE, entre janeiro e julho de 2014, quase R$ 25 milhões em emendas parlamentares foram destinadas para contratações de apresentações musicais. Os técnicos também concluíram que houve um sobrepreço de R$ 522 mil no pagamento de shows. É preciso lembrar que a execução das emenda se tornaram obrigatórias a partir da sanção em 2013 pelo então governador Eduardo Campos (PSB) do Orçamento Impositivo. O relatório produzido pelos auditores de conta é apenas a primeira etapa do processo. Ele tem por objetivo fundamentar com documentação e análise de dados as supostas ilegalidades encontradas. O processo, sob relatoria do conselheiro Dirceu Rodolfo, deve seguir em breve para julgamento na Corte de Contas. Leia abaixo a reportagem.
A emenda parlamentar 269/2013, de autoria do deputado estadual Diogo Moraes (PSB), no valor de R$ 150 mil pagou um show da banda Garota Safada em Água Preta. A apresentação ocorreu durante a 10º Vaquejada dos Amigos, organizada pelo então deputado estadual, hoje na Câmara Federal, João Fernando Coutinho, à época primeiro-secretário da Alepe, em pleno ano eleitoral. O local onde foi realizado o evento: a fazenda Santa Helena, de propriedade da família do prefeito, Eduardo Coutinho e de João Fernando, pai e filho.
A festa ainda contou com outros três shows, todos pagos por emendas, no valor de R$ 95 mil. Nos panfletos e cartazes da vaquejada reproduzidos em sites, o nome do deputado estadual aparece em destaque. No local, letras garrafais com o nome dele também foram pintadas dos muros. Segundo relatos descritos no relatório, o local estava repleto de aliados políticos do parlamentar, como prefeitos e vereadores. Esse foi apenas um dos achados da equipe técnica do TCE. De acordo com o relatório, trata-se de uma ilegalidade, visto que a lei proíbe a promoção pessoal e política em eventos custeados com recursos públicos.
“A promoção pessoal e propaganda indevida violam os princípios da Administração Pública, previstos no artigo 37 da Constituição Federal, principalmente, os da Impessoalidade e Moralidade”, destaca a equipe técnica. O documento argumenta que a Empetur, que liberou o recursos das emendas, “ao aceitar a incumbência de realizar processos de inexigibilidade (dispensa de licitação) e efetuar as contratações desses artistas foi corresponsável pelos atos praticados”.
São levantados, com a prova de fotos, notícias e filmagens, pelo menos mais outros 11 shows pagos por meio de emendas, nos quais se identificou a propaganda de prefeitos e deputados. Um outro caso ocorreu no Baile Municipal de Macaparana, também em 2014. O deputado Antônio Moraes (PSDB), que é considerado um dos responsáveis pelo evento, é saudado pelo mestre de cerimônia no palco onde se apresentou o cantor Ed Carlos e Banda, cujo cachê de R$ 20 mil foi pago por emenda enviada pelo mesmo parlamentar. O município é um dos redutos eleitorais do tucano, que alçou o próprio assessor, conhecido por “Paquinha”, a prefeito.
As ilegalidades não se encerram aí. Os auditores de contas identificaram que não somente um filho do deputado estadual Augusto César (PTB) foi beneficiado por emendas, como noticiou o JC em agosto do ano passado. Além de Juan Diego dos Santos (filho), sócio na empresa HC Produções Artísticas e Eventos LTDA, o outro filho, Henrique Queiroz de Carvalho e a assessora lotada no gabinete do parlamentar Maria de Fátima Silva constam também na sociedade que responde pela produtora. Essa semana, inclusive, o Ministério Público de Pernambuco abriu uma investigação criminal para apurar o caso.
De acordo com o relatório do TCE, a empresa contratou, nos últimos três anos, com o Estado de Pernambuco um montante de mais de R$ 7 milhões, dos quais R$ 6 milhões já foram liquidados. Por meio de 73 emendas, de janeiro a julho de 2014, foi um total de R$ 2.093.600 milhões. Dessas, 25 são de autoria do próprio pai e chefe, Antônio Moraes, um total de R$ 493 mil.
Outro caso de relações interpessoais na liberação de recurso público exposto no relatório é o da WM Entretenimento e Edições Musicais, cujo sócio é Wagner Coelho de Moura, que foi exonerado do gabinete do deputado João Fernando Coutinho (PSB) logo após o JC publicar matéria. A produtora recebeu um total de R$ 288.100,00 por meio de 11 emendas parlamentares, das quais duas são de autoria do seu ex-chefe, o atual deputado federal. Ambas somam R$ 62 mil pagos à produtora para financiar os shows da banda Forró do Firma, em Caruaru e Xexéu.
Nos ofícios enviados ao secretário estadual de Turismo, os deputados deixam explicitado o nome do artista, o evento e a cidade para a qual a emenda deve ser destinada. “Desta forma, os deputados indicaram indiretamente as empresa a serem contratadas”, frisa a auditoria. A equipe técnica concluiu que essa prática infringe os princípios constitucionais da impessoalidade e moralidade, exigidos através do artigo 37 da Constituição Federal.
Fonte: JC