Feira Literária de Paraty 2013 traz temática social e política
Homenageado da 11ª edição da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), Graciliano Ramos costumava dizer que “a literatura é revolucionária em essência”. Com temática social e texto engajado, a obra do alagoano continua atual e, coincidência ou não, é celebrada na Flip no momento em que o país passa por uma série de manifestações que pedem mudanças. O evento começa nesta quarta-feira (3) e vai até domingo.
“Graciliano nunca foi panfletário, nunca escreveu pautado pelo partido [o escritor foi do Partido Comunista Brasileiro]. As preocupações sociais estavam no texto de forma natural”, analisou o neto de Graciliano e também escritor Ricardo Ramos Filho, em entrevista ao UOL.
Autor de romances consagrados, como “Vidas Secas” e “São Bernardo”, Graciliano Ramos nasceu em 1892, em Quebrangulo (AL), mas cresceu no interior de Pernambuco. Passou parte da juventude em Palmeira dos Índios (AL), trabalhando ao lado do pai em uma loja de tecidos, e no Rio, onde foi revisor de jornais. Em 1928, de volta ao Nordeste, foi eleito prefeito de Palmeira, experiência que serviu de base para seu primeiro livro, “Caetés”.
Como prefeito, em 1929, produziu relatórios para o governado de Alagoas nos quais narrava com ironia os problemas e a burocracia, chamando atenção para sua escrita. Manteve a produção literária paralelamente à vida política. Ocupou distintos cargos públicos, entre eles o de diretor de Instrução Pública de Alagoas, até ser preso em 1936 (quando já havia escrito “Caetés” e “São Bernardo”), experiência que inspirou o romance “Memórias do Cárcere”. Em 1945, entrou para o Partido Comunista Brasileiro e publicou o livro de memórias “Infância”. Morreu em 1952, vítima de câncer de pulmão.
Apesar de todas as mudanças na história política do Brasil desde então, Ricardo Ramos Filho acredita que pouco mudaria no modo de Graciliano contar suas histórias. “Toda a vida ele se posicionou e certamente isso estaria no texto dele hoje também”, disse. O escritor também apoiaria a multidão que decidiu levar suas reivindicações para as ruas do país nas últimas semanas, na opinião do neto.
“Acho que ele concordaria que está tudo errado, que as coisas precisam mudar. Apoiaria o povo nas ruas, o povo que reclama da corrupção, da violência excessiva e da saúde precaríssima. Mas também estaria com todas as dúvidas que todo mundo tem sobre para onde isso vai”, opinou Ricardo.
Para ele, a obra que conta a história de uma família de retirantes enfrentando a seca no sertão brasileiro seria escrita exatamente como há 75 anos: “Se ele fosse escrever ‘Vidas Secas’ hoje, escreveria o mesmo livro. Continua tudo igualzinho, com os mesmos problemas. Fabiano e Sinhá Vitória ainda estão lá”.
Graciliano na Flip
As homenagens ao autor começam na conferência de abertura da Flip, nesta quarta-feira, com Milton Hatoum. Conhecedor da obra do autor alagoano, Hatoum combinará relatos pessoais de seu encontro com os livros de Graciliano com a discussão sobre a importância de seu trabalho para a cultura brasileira, da literatura à política.
Na Tenda dos Autores, outros dois debates têm Graciliano como tema. Na sexta-feira, às 10h, a mesa “Graciliano Ramos: ficha política” reúne o biógrafo do escritor, Dênis de Moraes, o sociólogo Sergio Miceli e o brasilianista americano Randal Johnson para discutir o envolvimento do escritor com a conjuntura brasileira de sua época. A partir das 11h de domingo, a mesa “Graciliano Ramos: políticas da escrita” terá os professores Wander Melo Miranda, Lourival Holanda e Erwin Torralbo Gimenez para explorar os elementos usados por Graciliano em seus livros para construir as relações entre linguagem, escrita e crítica social.
O escritor alagoano ainda será tema de um debate sobre suas adaptações para o cinema e de uma mesa na Flipinha, além de uma exposição e outros eventos paralelos. (UOL)