Freio nos preços dos combustíveis prejudica produção de etanol
O etanol, que você usa puro no seu automóvel flex, ou que vem misturado na gasolina, vive uma crise existencial. Desde 2008, nenhuma grande usina para a produção de etanol foi construída e 41 unidades de produção estão paradas no Brasil. Com o preço no mesmo patamar da gasolina, a venda do álcool nas bombas vem caindo.
A crise do combustível ecologicamente limpo e renovável vem preocupando empresários do setor, a Petrobras e o Governo Federal. A política de segurar os preços dos combustíveis, para conter a inflação, brecou as perspectivas de investimentos no etanol e retardou a exploração do petróleo do pré-sal. Uma combinação explosiva.
O industrial Carlos Gilberto Farias, diretor da Agrovale – a maior usina de produção de etanol da Bahia, com 70 milhões de litros e gerando quase 4.500 empregos diretos – disse que a sua empresa colocou o pé no freio, pelo menos por enquanto, na expectativa de ampliação e de novos investimentos por causa da grave crise do setor.
Em que pé está o novo desafio da Agrovale, de produzir de cana-de-açúcar para etanol no Projeto Salitre. Como anda o empreendimento?
Em Juazeiro/BA, produzimos 2,2 milhões de toneladas de cana irrigada, 70 milhões de litros de álcool e geramos 4.260 empregos diretos. No Salitre, no norte da Bahia, estamos em fase de plantio. São vários quilômetros de canais de irrigação, estações de bombeamento de água e infra-estrutura básica de produção. São perímetros de irrigação incluídos no Projeto Piloto de Investimentos (PPI) e no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do governo da Presidenta Dilma. Um projeto dessa dimensão, no estágio em que se encontra, demandará investimentos de R$ 800 milhões. Como a esperança empresarial do mesmo grupo que iniciou a implantação da Agrovale há 41 anos continua vigorosa, vamos aguardar que a crise passe. O etanol tem que se transformar em commoditie para o mundo e que fique clara a sua inclusão na matriz energética nacional. Como está hoje, é muito difícil.
E os investimentos realizados em Juazeiro, onde a Agrovale gera 4.260 mil empregos diretos. Há um plano de expansão?
A Agrovale é a única usina a fabricar açúcar e álcool no semi-árido nordestino. Estamos implantados no Projeto Tourão, em Juazeiro/BA, que é a maior área de cana irrigada do mundo – 21 mil ha. Investimos R$ 91 milhões para ampliar a área irrigada de 16,5 mil para os atuais 21 mil hectares. Inauguramos uma nova destilaria, ampliando a capacidade de produção de 400 mil para 700 mil litros/dia de etanol. Foi uma das pioneiras no processo de automação na região e conta com quase todo seu parque industrial automatizado, utilizando tecnologia de comunicação via rede. Por enquanto, repito, estamos avaliando o cenário, mas confesso que estamos com o pé no freio.
Mas a sua empresa venceu bem os desafios da automação, que é muito complicada na cultura da cana-de-açúcar?
Chegamos a um nível de excelência. Somos responsáveis pela produção de 82% do açúcar e 80% do álcool do estado, com 100% de cana-de-açúcar irrigada. Para se ter uma ideia da nossa produtividade, enquanto a Agrovale chegou a 120t/ha, o Centro-Oeste obteve uma produtividade de 77,6 t/ha, o Centro-Sul de 69t/ha, o Sudeste de 82,5 t/ha e o próprio nordeste que, na média, atingiu 65t/ha.
Tecnologia é a palavra-chave para vencer os desafios de um clima adverso, como é o semi-ário baiano?
Sem nenhuma dúvida. A técnica de irrigação que utilizamos em Juazeiro/BA é a mesma usada no deserto de Gobi, em Israel, através do gotejamento subterrâneo. Essa tecnologia é a mais moderna do mundo, consome 50% do volume de água da irrigação por sulco, além de elevar a produtividade agrícola em 30%. Isso fez com que a empresa chegasse a 120 toneladas por hectare e ampliasse o ciclo de plantação de sete para 12 cortes anuais com um só plantio. Mas tudo isso custa muito caro, exige grandes somas de investimentos.
Na condição de diretor da Agrovale, maior produtora de açúcar e etanol da Bahia, consultado por grandes empresas na área sucroenergética como, por exemplo, a Odebrecht, e membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República, o Sr. avalia o panorama do etanol no Brasil como difícil neste momento?
Muito difícil. A oferta de etanol encontra-se estagnada em razão da ausência de investimentos do setor sucroenergético em capacidade produtiva nova e em produção agrícola de cana-de-açúcar. O crescimento da venda de automóveis vem se mantendo acima de 11% ao ano desde 2008, enquanto a produção de etanol no país ficou praticamente estagnada no mesmo período: 27,1 bilhões de litros em 2008 contra 27,9 bilhões de litros em 2011. Ou seja, um crescimento de apenas 1,5% ao ano.
E qual o cenário para os próximos anos?
Eu diria que não muito animador. Em 2015, estima-se a nossa demanda interna por etanol será de um pouco mais de 40 bilhões de litros, enquanto a produção deverá ser de 28 bilhões – um déficit de 12 bilhões. Portanto, o cenário é um tanto quanto sombrio.
E quais os fatores que determinaram essa situação?
São diversos, como o clima, a mecanização da lavoura – as perdas são muito grandes na fase de implantação – e o saldo da crise financeira internacional de 2009. As empresas aceleraram as vendas de etanol durante a safra, o que deprimiu fortemente os preços. Os produtores de etanol do Brasil tiveram nove anos sem correção do preço, arcando com o custo Brasil porque o Governo Federal segurou os valores da gasolina e de derivados para conter a inflação. Com isto, todos os empresários e investidores mundiais deixaram de investir exatamente pela pouca rentabilidade do setor.
E há esperanças para o setor?
Esperança, já diz o dito popular, é a última que morre. Somos otimistas, além do mais trabalhamos com um combustível avançado, que é provado que reduz a emissão de dióxido de carbono (CO2). O etanol de cana-de-açúcar reduz a emissão de CO2 em 61% quando comparado à gasolina. Então, é um combustível limpo e futurista.
E a produção de etanol na Bahia pode ser incrementada rapidamente?
Temos cinco usinas sucroenergéticas (Unial, Santa Maria, Santa Cruz, Ibiralcool e Agrovale), que juntas produziram na safra 2012/13, cerca de 3,78 milhões de toneladas de cana, 114,4 mil toneladas de açúcar e 220 milhões de litros de etanol, o que representa tão somente 20% do consumo do Estado. Há estudos que falam na utilização de 30 mil ha de terra às margens do Rio São Francisco para plantar a cana irrigada e produzir 260 milhões de litros de álcool combustível e gerar 96 MW de energia com a queima do bagaço. Há grandes projetos no município de São Desidério/BA, onde a Multigrain investe R$ 570 milhões no plantio de 30 mil ha de cana irrigada com água do rio Guará. Já a coreana Celltrion projeta investir R$ 500 milhões no plantio de 27 mil ha de cana em Barra/BA, para plantio de cana e produção de 1,3 milhões de litros de etanol/ano. Mas para tudo isso sair do papel, o cenário tem que mudar pra melhor.
O Governo do Estado tem contribuído para o aumento da produção de etanol?
O governo baiano criou uma política de incentivos fiscais para a produção de etanol no Estado, com percentuais de abatimento da carga tributária entre 4,5% e 18% sobre o ICMS, conforme o tipo de álcool produzido, sua destinação e a localização da empresa. E isso tem estimulado a criação desses projetos que mencionei anteriormente.
Saindo um pouco da seara da cana-de-açúcar e do etanol, o Sr. pretende mesmo se candidatar à presidência da Federação das Indústrias do Estado da Bahia?
Sim, sou candidato. Na eleição anterior, retirei a minha candidatura para que a FIEB ficasse unida em torno do atual presidente, José de Freitas Mascarenhas, eleito em abril de 2010 e que já presidiu a entidade por 10 anos, entre 1992 e 2002. E quero ressaltar que Mascarenhas o fez com muita seriedade e competência. Mas precisamos oxigenar a principal entidade de classe da Bahia, cuidando não só dos interesses dos grandes grupos, mas, principalmente, dos médios e pequenos industriais, que estão instalados, em sua maioria, no interior da Bahia. Desta vez vou até o fim, porque não sou candidato de mim mesmo, mas da maioria das lideranças empresariais baianas que querem a mudança, que também acreditam que a Bahia não é só litoral.
E o fato de ser um industrial do interior, de Juazeiro/BA, o credencia a usar a bandeira da interiorização da FIEB?
Sou alagoano, mas estou na Bahia, na Agrovale, em Juazeiro/BA, há 40 anos. Então, meu sucesso empresarial, minha família, enfim minha vida, eu construí na Bahia. Sou tão juazeirense como as carrancas do Velho Chico. E como empresário baiano, que vive no interior da Bahia, sei das dificuldades que passa uma empresa instalada no interior, longe dos círculos do poder da capital. Se é difícil para uma empresa com o porte da nossa, imagine para os médios e pequenos empresários. A interiorização e a desconcentração industrial têm que ser feitas no Brasil. O Estado da Bahia não tem mais capacidade financeira para enfrentar uma guerra fiscal, concedendo isenções tributárias. Desenvolver o interior e as regiões mais pobres do Brasil é um dever do Governo Federal e deve ser o fruto de uma política clara de desenvolvimento regional.
Algumas pessoas ainda lembram o fato do Sr. ser irmão de PC Farias para descredenciá-lo dessa pretensão de presidir a FIEB, embora o Sr. seja atualmente vice-presidente dela? Como o Sr. encara isso?
Como um ato de desespero e como uma maldade. Meu irmão, que inclusive já não mais vive entre nós, está no meu coração, porque o sentimento de fraternidade é imperecível. Os erros que porventura cometeu, ele já pagou. Agora, eu sou outra pessoa, com outra personalidade, com outro comportamento. Tenho 40 anos de serviços prestados à Bahia e aos baianos como verdadeiro industrial, como empresário que sabe das dificuldades de se manter de pé, no dia a dia, uma empresa. Sobre o meu comportamento, a minha honestidade, indaguem a um dos meus 4.260 companheiros de trabalho da Agrovale. Ou, aos presidentes dos sindicatos industriais, ou ainda aos governadores Paulo Souto, César Borges e Jaques Wagner. E não foi à toa que recebi, em 1982, o título de Cidadão Baiano, concedido por unanimidade pela Assembleia Legislativa, que também me outorgou a Comenda Deputado Luís Eduardo Magalhães. Recebi também a Comenda do Grande Mérito Industrial da FIEB/CNI e a Medalha Norberto Odebrecht, outorgada pelo Rotary Club da Bahia. E uma pergunta que não quer calar: se a minha história é pública e me permitiu chegar à vice-presidência da FIEB, por que não posso aspirar presidi-la?
Tribuna – Tecnologia é a palavra-chave para vencer os desafios de um clima adverso como é o semiário baiano?
Carlos Gilberto – Sem nenhuma dúvida. A técnica de irrigação que utilizamos em Juazeiro/BA é a mesma usada no deserto de Gobi, em Israel, através do gotejamento subterrâneo. Essa tecnologia é a mais moderna do mundo, consome 50% do volume de água da irrigação por sulco, além de elevar a produtividade agrícola em 30%. Isso fez com que a empresa chegasse a 120 toneladas por hectare e ampliasse o ciclo de plantação de sete para 12 cortes anuais com um só plantio. Mas tudo isso custa muito caro, exige grandes somas de investimentos.
Tribuna – Na condição de diretor da Agrovale, maior produtora de açúcar e etanol da Bahia, consultado por grandes empresas na área sucroenergética como, por exemplo, a Odebrecht, e membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República, o Sr. avalia o panorama do etanol no Brasil como difícil neste momento?
Carlos Gilberto – Muito difícil. A oferta de etanol encontra-se estagnada em razão da ausência de investimentos do setor sucroenergético em capacidade produtiva nova e em produção agrícola de cana de açúcar. O crescimento da venda de automóveis vem se mantendo acima de 11% ao ano desde 2008, enquanto a produção de etanol no país ficou praticamente estagnada no mesmo período: 27,1 bilhões de litros em 2008 contra 27,9 bilhões de litros em 2011. Ou seja, um crescimento de apenas 1,5% ao ano.
Tribuna – E qual o cenário para os próximos anos?
Carlos Gilberto – Eu diria que não muito animador. Em 2015, estima-se que a nossa demanda interna por etanol será de um pouco mais de 40 bilhões de litros, enquanto a produção deverá ser de 28 bilhões – um déficit de 12 bilhões. Portanto, o cenário é um tanto quanto sombrio.
Tribuna – E quais os fatores que determinaram essa situação?
Carlos Gilberto – São diversos, como o clima, a mecanização da lavoura – as perdas são muito grandes na fase de implantação – e o saldo da crise financeira internacional de 2009. As empresas aceleraram as vendas de etanol durante a safra, o que deprimiu fortemente os preços. Os produtores de etanol do Brasil tiveram nove anos sem correção do preço, arcando com o custo Brasil porque o Governo Federal segurou os valores da gasolina e de derivados para conter a inflação. Com isto, todos os empresários e investidores mundiais deixaram de investir exatamente pela pouca rentabilidade do setor.
Tribuna- E há esperanças para o setor?
Carlos Gilberto – Esperança, já diz o dito popular, é a última que morre. Somos otimistas, além do mais trabalhamos com um combustível avançado, que é provado que reduz a emissão de dióxido de carbono (CO2). O etanol de cana de açúcar reduz a emissão de CO2 em 61% quando comparado à gasolina. Então, é um combustível limpo e futurista.
Tribuna – E a produção de etanol na Bahia pode ser incrementada rapidamente?
Carlos Gilberto – Temos cinco usinas sucroenergéticas (Unial, Santa Maria, Santa Cruz, Ibiralcool e Agrovale), que juntas produziram na safra 2012/13 cerca de 3,78 milhões de toneladas de cana, 114,4 mil toneladas de açúcar e 220 milhões de litros de etanol, o que representa tão somente 20% do consumo do Estado. Há estudos que falam na utilização de 30 mil ha de terra às margens do Rio São Francisco para plantar a cana irrigada e produzir 260 milhões de litros de álcool combustível e gerar 96 MW de energia com a queima do bagaço. Há grandes projetos no município de São Desidério/BA, onde a Multigrain investe R$ 570 milhões no plantio de 30 mil ha de cana irrigada com água do rio Guará. Já a coreana Celltrion projeta investir R$ 500 milhões no plantio de 27 mil ha de cana em Barra/BA, para plantio de cana e produção de 1,3 milhão de litros de etanol/ano. Mas para tudo isso sair do papel, o cenário tem que mudar pra melhor.
Tribuna – O Governo do Estado tem contribuído para o aumento da produção de etanol?
Carlos Gilberto – O governo baiano criou uma política de incentivos fiscais para a produção de etanol no Estado, com percentuais de abatimento da carga tributária entre 4,5% e 18% sobre o ICMS, conforme o tipo de álcool produzido, sua destinação e a localização da empresa. E isso tem estimulado a criação desses projetos que mencionei anteriormente.
Tribuna- Saindo um pouco da seara da cana de açúcar e do etanol, o Sr. pretende mesmo se candidatar à presidência da Federação das Indústrias do Estado da Bahia?
Carlos Gilberto – Sim, sou candidato. Na eleição anterior, retirei a minha candidatura para que a FIEB ficasse unida em torno do atual presidente, José de Freitas Mascarenhas, eleito em abril de 2010 e que já presidiu a entidade por 10 anos, entre 1992 e 2002. E quero ressaltar que Mascarenhas o fez com muita seriedade e competência. Mas precisamos oxigenar a principal entidade de classe da Bahia, cuidando não só dos interesses dos grandes grupos, mas, principalmente, dos médios e pequenos industriais, que estão instalados, em sua maioria, no interior da Bahia. Desta vez vou até o fim, porque não sou candidato de mim mesmo, mas da maioria das lideranças empresariais baianas que querem a mudança, que também acreditam que a Bahia não é só litoral.
Tribuna – E o fato de ser um industrial do interior, de Juazeiro/BA, o credencia a usar a bandeira da interiorização da FIEB?
Carlos Gilberto – Sou alagoano, mas estou na Bahia, na Agrovale, em Juazeiro/BA, há 40 anos. Então, meu sucesso empresarial, minha família, enfim, minha vida, eu construí na Bahia. Sou tão juazeirense como as carrancas do Velho Chico. E como empresário baiano, que vive no interior da Bahia, sei das dificuldades que passa uma empresa instalada no interior, longe dos círculos do poder da capital. Se é difícil para uma empresa com o porte da nossa, imagine para os médios e pequenos empresários. A interiorização e a desconcentração industrial têm que ser feitas no Brasil. O Estado da Bahia não tem mais capacidade financeira para enfrentar uma guerra fiscal, concedendo isenções tributárias. Desenvolver o interior e as regiões mais pobres do Brasil é um dever do Governo Federal e deve ser o fruto de uma política clara de desenvolvimento regional.
Tribuna – Algumas pessoas ainda lembram o fato de o Sr. ser irmão de PC Farias para descredenciá-lo dessa pretensão de presidir a FIEB, embora o Sr. seja atualmente vice-presidente dela? Como o Sr. encara isso?
Carlos Gilberto – Como um ato de desespero e como uma maldade. Meu irmão, que inclusive já não mais vive entre nós, está no meu coração, porque o sentimento de fraternidade é imperecível. Os erros que porventura cometeu, ele já pagou. Agora, eu sou outra pessoa, com outra personalidade, com outro comportamento. Tenho 40 anos de serviços prestados à Bahia e aos baianos como verdadeiro industrial, como empresário que sabe das dificuldades de se manter de pé, no dia a dia, uma empresa. Sobre o meu comportamento, a minha honestidade, indaguem a um dos meus 4.260 companheiros de trabalho da Agrovale. Ou aos presidentes dos sindicatos industriais, ou ainda aos governadores Paulo Souto, César Borges e Jaques Wagner. E não foi à toa que recebi, em 1982, o título de Cidadão Baiano, concedido por unanimidade pela Assembleia Legislativa, que também me outorgou a Comenda Deputado Luís Eduardo Magalhães. Recebi também a Comenda do Grande Mérito Industrial da FIEB/CNI e a Medalha Norberto Odebrecht, outorgada pelo Rotary Club da Bahia. E uma pergunta que não quer calar: se a minha história é pública e me permitiu chegar à vice-presidência da FIEB, por que não posso aspirar presidi-la?